quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Nos Escaninhos do Coração - Parte 6

 


 Continuando...

          A montanha localizava-se numa região quase desabitada. A única habitação próxima, um casebre de pau a pique, distava quase um quilômetro. Logo qualquer acidente, com certeza, era risco de vida. E esse risco, infelizmente, era o que Luiza gostava. André nunca soube do por que dela gostar tanto de viver no limiar da morte. Ele também dizia que gostava de viver perigosamente, com a adrenalina o mais alto possível, mas na verdade, falava só para agradá-la. O que queria mesmo da vida, era estar junto dela em qualquer lugar que fosse. Sem ela, a vida não tinha graça.

          André, nos momentos em que o enjoo dava uma trégua, continuava à procura de uma forma de sair daquela situação terrível. De vez em quando olhava para baixo, tentando encontrar uma saída. Observou que as árvores próximas da montanha já estavam sendo quase arrancadas pela fúria do vento. Parecia que não iriam resistir por muito tempo aquele castigo. Ante o quadro que aparentava devastador, ele não tinha mais certeza se o melhor seria descer ou permanecer onde estava. No meio da dúvida, ouviu Luiza chama-lo:

           - André! André! Temos que continuar a subir!  - Ele ouviu e respondeu com uma pergunta.

          - Luiza, você está bem? Bem mesmo? Eu pensei que você estivesse desacordada. Levei o maior susto. Eu tinha perdido você de vista. Mas agora estou te vendo. Vamos descer.  

          - Eu estou bem! Só bati levemente com a cabeça na pedra! Mas estou bem! Se preocupa não! Levou susto à toa! André, estive pensando e cheguei à conclusão que devemos subir. Olha só como estamos mais próximos do topo. Descer, não vai me dar nenhum prazer.

         - Prazer? Prazer de quê? Você ainda não entendeu que estamos correndo risco de vida?

         - Que risco de vida? A coisa vai mudar. Vamos subir, porque realmente estamos mais próximos do topo. Vamos vencer esse paredão. Vamos! Esse vento vai parar! A gente não veio pra esse lugar pra beber a emoção? Então, vamos curtir!

        - Curtir? Luiza, nós estamos um tempão e não conseguimos sair do lugar. Como é que com toda essa tormenta vamos conseguir?  Estamos mais perto do chão, do que do topo dessa montanha.

        - Sei lá André! Tá bom! Tá bom! Eu só quero sair daqui! Mas tem que ter emoção! Pra ter emoção, só subindo, não é?

          André não entendeu essa variação de comportamento. Há minutos atrás estava pálida, agora queria tentar subir. Subir como? Estavam parados ali sem conseguir avançar um centímetro sequer. Sabia que a dificuldade só ia aumentar a cada minuto. Não tinha esperança alguma dessa situação melhorar. Mas sabia que não podia contrariá-la, então concordou mais uma vez com a sua decisão.

          - Tudo bem. Vamos em frente. E seja o que Deus quiser. Vamos subir.

          - Já vem você colocando Deus nas nossas decisões. Deixa Deus lá no céu.

          Antes de continuar a escalada, André deu mais uma olhadela para baixo e tentou calcular por alto o quanto já tinham subido. Pensou um pouco e fez outra avaliação, agora em torno de 150 metros, o que na realidade estava muito longe de ser a verdade. Se fosse medir, não tinha passado dos trinta metros. Depois tentou mirar o topo daquele pedregulho. Olhou e se arrepiou. Parecia maior do que tinha visto lá de baixo. Para assustar, uma grande parte estava encoberta pela neblina. Então dava a impressão de que era maior realmente do que se tinha apresentado.  A sensação era de que não tinha fim.

          Nas suas aventuras pelas montanhas do estado, sempre se achou parte de uma dupla. Era ele e Luiza. Só que nunca conseguiu entender porque ela nunca queria ficar perto. Eram escaladas individuais. Ela ficava sempre afastada. Ele gostaria de abrir o caminho para que ela passasse. Mas ela queria abrir o seu próprio caminho. Sabia que se naquele momento ela estivesse ao seu lado, seria muito mais fácil para os dois saírem daquela enrascada. Enquanto pensava olhava a amiga tentando se movimentar em direção ao topo. Só se mexia, mas continuava no mesmo lugar. Não conseguira prender mais nenhum grampo.  

          A intensidade do vento aumentava nervosamente. Nesse momento já estava assustador. Uma rajada sacudiu Luiza e lançou-a há alguns metros de encontro a montanha. Para André ela havia se machucado. Entretanto, milagrosamente, ela conseguiu se segurar numa saliência da pedra. Olhou para o amigo e sorriu. Depois apontou com o indicador da mão esquerda o alto da montanha. Ali tentou colocar mais um grampo, para continuar a subir. André vendo Luiza se movimentar voltou a tentar novamente a escalada.  Só que não conseguia sair do lugar. Estava visivelmente abatido. – O que fazer? – pensou demonstrando que estava decepcionado com o seu fraco desempenho. Então virou o corpo e encostou às costas no paredão molhado e ficou procurando uma saída para aquele impasse. Como estava se sentindo incomodado com a água que descia pelas suas costas, colocou a sola dos pés na rocha e empurrou o corpo para frente. Com isso o vento lançou-o um pouco à esquerda. Então colocando mais força nas pernas jogou o seu corpo bem mais à frente. Quando estava balançando no ar, o vento que aumentava de intensidade, lançou-o bem mais à esquerda. O que aconteceu com Luiza, coincidentemente, aconteceu com ele. Enquanto girava conseguiu se segurar numa fissura da pedra e uma das mãos entrou numa pequena fenda. Conseguiu se segurar, mas à custa de muita dor. Engoliu o grito com medo que pudesse assustar Luiza.  

............Continua semana que vem!

 

 

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