terça-feira, 14 de maio de 2024

Uma Luz e Nada Mais - Parte 3

 


 Continuando...

            Antes de ela tomar o caminho da porta, pedi que me desamarrasse. Eu quero me levantar, falei. Ela disse que não podia, que ia depender dos médicos. Que lugar é esse? Perguntei nervoso. Não me respondeu e saiu rapidamente. Percebi, então, que os meus pensamentos começavam a tomar forma. Me senti contente. Já formava frases. As minhas ideias coordenavam-se melhor agora. Acho que a minha normalidade voltava. Pensei em Deus, naquele momento de tensão. Isso já foi um grande sinal na minha lucidez. Eu sei que ainda faltavam algumas coisas, como lembrar do meu nome. Se tinha família. Mulher e filhos. Pai e mãe. Nada. Esse nada, me deixou tenso. Será que eu não existia? Não, eu existia, senão não estaria questionando a minha existência. Mas... seria eu um androide? Androide! Como fui me lembrar disso? Um ser artificial. Será que não existo? Fui montado igual a um brinquedo imitando um ser humano? Um robô! Isso! Um robô! – falei um pouco alto, mas não tinha ninguém para me ouvir mesmo. É muito deprimente você acordar vinte anos depois, - continuo conversando comigo - de alguma coisa que ainda não sabia, e achar que é um robô. Puxa vida! Agora vou ficar em silêncio. Falando para ninguém e para os meus ouvidos, é meio deprimente. Me sinto meio ridículo. Olho fixamente a parede na minha frente. Só isso que me resta?

          Passados alguns minutos, finalmente me encontrei mais calmo. É hora de voltar a pensar. Então, depois de pensar algumas coisas, sem chegar a conclusão alguma, vi o obvio: arranjar um jeito para forçar mais a mente. Mas eu sabia que, naquele momento, era procurar agulha num palheiro. Entretanto me recolher e aceitar as minhas limitações naquele momento, seria desistir da minha vida. Era mergulhar na procura de respostas ou voltar a dormir por mais vinte anos. Isso não. Ia me procurar dentro da minha cabeça. Aí dei um tempo para pensar. Veio a pergunta:  onde e como fazer isso? A minha cabeça ainda estava com espaços vazios. Se você não sabe a sua identidade, você não existe, simples assim!  De repente uma coisa brotou lá dentro: quem me deu esse nome, que me chamam agora? Nome estranho: Dyllon. Por quê? De onde tiraram isso? Sou brasileiro, é o mais provável que assim o seja. Acordei e o pouco que falei foi em português. Já é uma prova. Aí a linda mulher me diz que o meu nome é esse. Parece estrangeiro. Estranho. Nesse momento brotaram vários nomes: João, José, Joaquim, Marcos... O mais óbvio é que seja um desses nomes.  Dyllon seria uma sigla? Por que veio isso na minha cabeça? Depois eu pergunto a ela. Ou aos médicos.

            Uma lufada de ar bateu no meu rosto.  As poucas árvores próximas de mim se curvaram, quase encostando no chão. As que não resistiram, se quebraram. Eu quase fui lançado de cara no chão, como algumas delas.  Que vento estranho é esse? - me perguntei assustado. Não sabia onde estava. E a poeira era tanta, que não me deixava ver o que estava ao meu redor. Parecia que a poeira já tomava conta, também, da minha cabeça. Mas não me dei por vencido e procurei enfrentar aquele estranho vento.

            Tenho o hábito de diariamente, antes de sair de casa, saber como será o dia. Consultei o serviço de meteorologia e tenho certeza que não estava previsto ventos fortes. Mas para onde estava indo? Ou voltando? Estava confuso. Que pensamentos são esses? O que quer me dizer?  De repente estava dentro de uma cúpula de vidro. O vento já não me tocava. Caminhava por dentro do vento e da poeira sem sofrer qualquer pressão. Andava livremente. De repente tudo sumiu. O sol estava quase em cima da minha cabeça. Sentia apenas, apesar do sol, uma brisa fresca roçando a minha pele.

            Andava, mas sem identificar o lugar. A região me parecia estranha. Nunca tinha visto nada igual, nem em filmes. Um lindo riacho escorregava pela lateral da estrada, com muitas árvores enterrada em suas margens, com um colorido deslumbrante. Esse tipo de vegetação se espalhava por toda redondeza. Eu nunca tinha visto nada igual, realmente.  Todas estavam floridas, cada uma de uma cor. Até os arbustos mais rasteiros se cobriam de flores de vários matizes. E as pessoas? Não tinha viva alma. Que lugar era aquele? 

.......Continua Semana que vem!

 

sexta-feira, 10 de maio de 2024

Pensamento de Poeta - SOS Deus

 



SOS DEUS

- José Timotheo =

A água corre

Nas Terras do Rio Grande do Sul

São rios

De lágrimas

Mas como rompem pontes

Derrubam esperanças

Não podem vir do céu

Parecem nascer da ira

Da desesperança

A água corre

E corre cada vez mais

Lágrimas de sangue

Transbordam rios

E corações

Braços cruzados

Assistem um filme

Catástrofe?

Cidades e mais cidades

Morrem afogadas

Por cima dos rios

Corre puro barro

Mas por baixo

O sangue dá cor

À tragédia

SOS DEUS!

                                           ... e paro aqui


terça-feira, 7 de maio de 2024

Uma Luz e Nada Mais - Parte 2

 


Continua...

            Fui despertado com um toque de mão no meu braço. Abri os olhos e lá estava o anjo me olhando. Sorriu e deu bom dia. Então era dia. Na hora não arrisquei responder, apenas retribuí o sorriso. Ela perguntou como eu estava passando. Sinceramente não sabia o que fazer. Não podia falar, balançar as mãos, ou a cabeça dizendo que estava bem. Como eu estava bem? Para princípio de conversa a minha cabeça estava vazia. Oca mesmo. O espaço no meu cérebro só estava ocupado por um portão branco, largo e alto. Como podia pensar em responder que a minha vida era um mar de rosas! Apenas sorrir de novo, era o que eu podia fazer.

          Enquanto pensava no que fazer, olhava aquele rosto lindo. Depois alguém levantou um pouquinho a minha cabeça. Deve ter sido o anjo que levantou a cama. Agora via melhor a minha frente. Consegui ver os meus pés. De repente veio de novo o pensamento que tinha morrido. Se tinha passado para o outro lado, até que o meu anjo da guarda era bonito. Anjo não, anja! Bota bonita nisso! Sorri de novo. Ela sorriu de volta e disse que eu estava melhorando a olhos vistos. Depois mediu a minha pressão e disse, continuando a sorrir, que estava ótima. De repente fechou o cenho e falou baixinho, mas consegui ouvir, que ninguém acreditava que fosse voltar à vida. Agora ela tirou a minha dúvida: estava vivo. Para ninguém acreditar que eu ia viver, era porque tinha ocorrido alguma coisa muito grave comigo. O que será que aconteceu? Me sentia bem. Não percebi nenhum sinal de dor. Aparentemente não tinha nenhum machucado. Pode ter sido um ataque cardíaco. Um infarto. Um AVC. Isso! Um AVC! Tentei logo mexer com as mãos. Mesmo presas pelo pulso, consegui fechá-las e abri-las. Mexi, limitadamente, também com os pés, porque estavam amarrados na altura dos tornozelos. Acho que não foi AVC. O que será que aconteceu? Posso ter contraído uma cirrose hepática, já que gostava de bebericar um pouco.

            Enquanto conjecturava, a santa, deusa, anjo - sei lá! -, foi se afastando. Sumiu como num passe de mágica. Numa vontade de tê-la por perto, num esforço sobre-humano eu disse: ei. Saiu baixinho, mas consegui emitir um som compreensível. Sorri emocionado. Era uma esperança que podia falar. Se ela voltasse, não podia perder a oportunidade. Comecei a treinar. Ei! Ei! A cada vez, eu conseguia um som mais alto. Parecia que as minhas cordas vocais estavam desenferrujando. Se é que a garganta enferruja. Tenho que perguntar sobre isso. Por que essa palavra veio na minha cabeça? Lembrei que qualquer coisa de ferro enferruja. Mas as cordas vocais são de ferro? Acho que não. Mas eu tinha um gosto metálico na boca.

            Treinei com outras palavras. Veio na minha cabeça a palavra sim. Repeti várias vezes. Já falava claramente. E foram outras e mais outras. Para minha surpresa formei frases. Pode acreditar. Veio brotando tudo. Sem me dar conta, já estava podendo manter uma conversação. Nem eu acredito. Lembrei de repente que antes da deusa sair, acho que estava distraído, ela colocou alguma coisa na minha boca e me deu água. Como não tinha percebido isso!

          Hoje acho que não dormi. Ou de ontem para hoje? Não sei muito bem. Só sei que estava acordado quando ela chegou. Escutei uma porta se abrindo. E silenciosamente ela se encostou na minha cama. Concluí que era uma cama de hospital. Ou uma maca. Agora não vem ao caso. O que importa mesmo era que a deusa tinha voltado. E antes que falasse alguma coisa, eu sorri e dei um bom dia. Era sorriu surpresa. Me perguntou como eu sabia que era dia. Agora respondi demonstrando felicidade. Ou apenas alegria. Era um bem-estar, isso era. Disse pausadamente que deduzi pela sua chegada. Isso com um sorriso largo, mostrando até os meus dentes. Ela se conteve para não dar uma gargalhada estridente. Apertou com suavidade o meu braço e disse que ia falar com os médicos sobre a minha recuperação. Se virou para sair, mas eu pedi que ficasse. Ela voltou, mas disse que era o trabalho dela deixar os médicos informados sobre qualquer alteração no meu quadro. Disse que não ia demorar. Tentei prendê-la do meu lado, mas foi em vão.

                Antes de chegar até a porta, voltou. Olhou-me com um olhar curioso. Perguntou qual era o meu nome. Achei a pergunta estranha. Ela não saber o meu nome? Respondi após alguns segundos em silêncio que não sabia. Voltei a pergunta que me fizera. Balançou a cabeça negando. Também não sabia. Estranho eles não terem o meu nome. Disse que o nome que me chamavam não era real. Me mostrou uma tabuleta onde estava escrito: paciente Dyllon, enfermaria 2, leito um. Entrada: 25/03/2000. Fiquei curioso com tudo aquilo. Perguntei que dia do mês estávamos. Quase morri de susto, quando ela disse: 25/03/2020. Não queria acreditar naquilo. Balbuciei: isso é verdade? Ela balançou a cabeça confirmando, com um semblante um pouco fechado. Aquele sorriso de antes, tinha ido embora. 

......Continua Semana que vem!