Continuando...
Quim fazendo cara feia ajuda o irmão a retirar o morto do carro, deitando-o próximo a arma que o defunto portava. Em seguida arria o banco da frente e puxa o saco, com cuidado, para fora com cuidado até deitá-lo no asfalto. Depois, convida o irmão a abrir o saco e tirar a pessoa que está lá dentro. Toni, que parecia cheio de coragem, se esquiva com delicadeza:
- Puxa mano. Quem sou eu pra magoar a sua valentia. Não posso tirar isso de você. Vai lá, vai. Abre o saco você. Essa honra é sua.
- Cara de pau, hein! Além de vaselina também! Tudo de ruim sobra pra mim mesmo. Eu vou porque eu sei que você não tem coragem de ver defunto ou quase defunto. Vou quebrar essa pra você.
Toni bota a mão na frente da boca e deixar aflorar um sorriso nervoso, enquanto Quim vai tentando abrir o saco de pano colorido, sem firmeza nas mãos, parecendo feito de retalhos e que ele confundiu com roupa. Como o nó estava muito apertado, Quim deu uma paradinha. Mas parecia apenas um laço, que não percebeu. Tudo por conta do nervosismo. Depois, olhou para dentro do carro, de onde tinha tirado o saco, e viu mais uma arma, que parecia uma escopeta, encostada no banco. Pegou-a e passou para o irmão, comentando:
- Olha só Toni. Pra quê essas armas todas? Esses caras iam para alguma guerra?
- Esquisito, hein Quim. Mas vai em frente e deixa a curiosidade para depois. Abre logo esse saco, vai. Já estou ficando tenso.
- Deixa comigo, mano. – Tentando demonstrar uma segurança que, naquele momento, já não existia.
- Claro! Eu vou deixar com quem?
- Muito engraçadinho. Oh! Não fica com essa cara de riso não!
- E quem é que tá rindo? Uma situação dessas e eu vou rir? Vamos logo com isso, Quim.
O irmão aproxima as mãos, já bem trêmulas, até a corda que amarra a boca do saco, mas para antes de encostar os dedos no nó. Tinha que desamarrá-lo rapidamente para ter certeza do que continha no interior, mas titubeia. Dá uma olhadela para o irmão e respira profundamente, parecendo trazer de volta a coragem. Depois de alguns segundos respirando, retorna ao que ia fazer, agora com mais determinação. Pega uma das pontas da corda e depois, com a outra mão, segura a outra ponta. Não é um nó cego, é apenas um laço. Com isso, sem muito esforço, consegue desatá-lo. Com cuidado, mas ainda com um pouco de receio, pois não sabia o que poderia achar ali dentro, foi abrindo o saco calmamente. Olha para o interior, arregala os olhos e solta um grito de susto.
- Meu Deus, Toni! – ele engole a saliva e também o grito. E fica, por alguns segundos, olhando para o interior do saco, em silêncio - Eu suspeitava, - com a voz embargada - mas não queria acreditar. Tem realmente uma pessoa aqui dentro com um capuz na cabeça. – ele puxa o capuz - Ih! É uma mulher, Toni! É uma mulher! Deixa eu ver direito. Ela está respirando. Tá viva, mano. Graças a Deus. Olha só. Olha só. – Toni vira a cara para o lado - Você está com medo de olhar, mano? É realmente uma coisa para não se ver, mas você tem que olhar.
- Não. Não. Medo nada. É... – ele gagueja - Medo nada. Vou olhar. Puxa vida! Meu Deus! Quem fez uma coisa dessas? Mas ela ainda está viva?
- Tá mano. Tá respirando.
- Que bom, Quim. Leva o saco pra distante desse carro. Só por precaução.
- Mas tá pesado, Toni. Ajuda aqui. – o irmão não demonstra que vai tomar a decisão - Pô mano, tá tirando o seu da reta? Pega o saco comigo!
- Que... que... – gagueja – Que o quê! – e foi se afastando - Faz o que você puder. Não posso ver isso, Quim. Eu vou olhar lá do outro lado. Vou tentar abrir a outra porta.
- Tá bom, Toni. Respeito o seu medo. Mas acho que não vai conseguir nada não, do outro lado. O carro tá todo destruído. Não tem um pedaço sequer sem um amassado. Não adianta fugir
- Mas estou fugindo. Vou olhar assim mesmo o outro lado.
Toni dá a volta no carro e, mesmo com a porta emperrada, ele tenta abri-la, mas a tentativa é em vão. Nisso o irmão grita:
- Toni! Toni! A coitadinha está toda amarrada! Acho que está com o braço quebrado! Caraca, mano! Acho que ela está quebrada da cabeça aos pés! Não dá pra tirar ela daqui não. Parece até que o tamanho dela foi diminuído. Não sei se foi com o acidente ou se alguém fez isso. Coitada.
- Tenta. Vai com jeitinho. – falou com dor em cada letra – Não consigo ver isso não.
- Como vai com jeitinho? Coragem, Toni! Vem me ajudar! O que vai adiantar você fugir?
Continua Semana que vem!

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