terça-feira, 18 de outubro de 2022

A Minha Casa Não é Essa - Parte 23

 


Continuando...

             - Vai pegar a arma por quê?

            Mohammed coçou o rosto, com uma expressão pensativa, procurando alguma justificativa, mas finalmente, como sempre fazia, falou com firmeza, deixando aflorar um leve sorriso:

            - Ah sargento! É só uma lembrança pela minha participação no confronto!

            - Que confronto? Você não guerreou!

            - Eu não dei nenhum tiro, mas salvei a vida de vocês dois! Se eu não tivesse visto que ele estava vivo, - apontando na direção do corpo - vocês agora estariam sendo preparados para serem comidos pelas minhocas!

            - E eu agradeço por isso, mas eu não posso te dar essa arma. Você tem que entender que quando você vende uma arma dessas, ou outra qualquer, ela vai ser usada de novo contra todos nós.

           - É mesmo. Eu não tinha pensado nisso.

           - Que não tinha pensado o quê, Mohammed! Você é o cara mais esperto e sonso que já conheci! Você não é um garoto como aparenta. A sua idade verdadeira está escondida atrás dessa cara juvenil.

           - Sou garoto sim. Eles me disseram que eu tenho dez, onze, doze... Ah! Sei lá, sargento!

           - Como você mente com tanta facilidade. É o maior cara de pau que eu já conheci.

           - Puxa sargento. É isso que o senhor pensa realmente de mim? Acho que somos até parceiros, depois desse dia de hoje.

           - Só rindo! Você não existe!

           - Sargento, agora falando sério: temos que sair daqui o mais rápido possível. O meu amigo Rachid andou escutando umas coisas aqui, outra ali. E chegou à conclusão que vocês não têm outra solução, a não ser se esconder.

           - Como nos esconder? Acabamos de acabar com um foco de terroristas!

           - Foco? Terroristas? Era só três milicianos. E tem mais: vocês mataram um chefe deles. Vão vir cheios de raiva para cima de vocês. Essa turma é vingativa. Vão querer pegar o senhor e seus soldados de qualquer jeito. Podem voltar até para os Estados Unidos, que eles vão mandar alguém para pegá-los. Vai começar a sair bandido de tudo que é caverna para procura-los!  Pode acreditar nisso, sargento.

           - Sem exagero, Mohammed. Eles são só soldados como nós.

           - Não é exagero. Tudo bem, não quer acreditar, azar o seu. E eles não são soldados. São bandidos.

           - Mas como é que eles vão saber que fomos nós que matamos um chefe deles?

          - Não sei, mas eles vão descobrir. Até eu tô encrencado. Só me livro se passar para o lado deles. Mas também não tenho saída com vida. Com certeza vão me recrutar para ser homem bomba. Ou morro ou morro.

          - Você é dramático! Já pensou em ser ator?

          - Eu já vivo num drama vinte e quatro horas por dia. Até que às vezes aparece uma comédia aí pelo caminho. Ah antes que me esqueça: o soldado tem que ter um atendimento rápido. O ferimento dele é grave. E outra coisa: a região aqui está descoberta de segurança pública, porque o vice-presidente sofreu um atentado longe daqui. E segundo falou Rachid, morreu muita gente.

          - Essa eu não sabia. Não sei por que não me avisaram. Mohammed, o seu vocabulário não é de criança. Estou impressionado. Você fala com desenvoltura para a sua idade. Você esconde tudo sobre a sua vida, mas eu vou descobrir.

          - Eu ficarei eternamente grato. Eu também quero saber quem eu sou. Não tenho nem um flash de quem eu era. Parece que eu nasci desse tamanho. Agora só vou comemorar meu aniversário a partir da hora que acordei. Vamos? Temos que sair o mais rápido possível. O senhor não vai pegar a arma?

          - Claro. Agora vamos andando.

          Os dois saíram dos escombros. Passaram por onde já tinha existido, pelo tipo de construção, uma linda e cara porta. Sem deixar de lado a cautela, continuaram a olhar para todos os lados, com medo de serem surpreendidos. Caminhavam sem pressa.

          A alguns metros dali, avistaram Peter prestando socorro ao soldado John, que estava sentado e apoiava às costas em um muro já bem castigado por marcas de tiros. E do outro lado da viela, aparecia uma parte do corpo de Rachid, que aparentemente observava os dois soldados. 

.............Continua Semana que vem!

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