terça-feira, 23 de abril de 2019

A História de Helô - Parte 29



Continuando...

           Helô realmente parou de ouvir vozes, porém continuava medrosa. Tentou recuar, mas os pés pareciam pregados no chão, estava tremula. A entidade sabia que ela não estava bem. A emoção foi muito forte. Para uma criança, até que tinha suportado bem toda aquela pressão, mas ela tinha que prestar um socorro urgente e foi isso que fez. Rapidamente envolveu Helô no seu manto e, como num passe de mágica, ela recobrou logo o seu equilíbrio. A primeira demonstração de que estava tudo sob o seu controle foi um sorriso leve e descontraído. Depois, mentalmente, se desculpou:
          - Puxa, irmã, desculpe! O medo chegou de repente, não deu pra controlar. A senhora sabe que não tenho mais medo, não tenho medo de nada, mas se a senhora puder tapar os meus ouvidos, para que eu não escute nada, eu agradeço. Também não quero ver mais nada. Pode ser?
          A entidade sorriu um sorriso de compreensão e disse, passando a mão na sua cabeça:
          - Está bem, Helô, está bem, mas preste atenção: nós somos feitos de medos e isso é inevitável, mas o medo nos protege. Se não tivéssemos medo, não sobreviveríamos por muito tempo na crosta terrestre. Agora, escolha o seu medo. Puxa, Helô, você já veio aqui tantas vezes! Então, vamos focar no que viemos fazer? Diz-me uma coisa: você está ouvindo alguma coisa?
         - Não, irmã.
         - Está vendo alguma coisa?
         - Estou, lá naquele cantinho tem alguém. É uma pessoa... Não. Não sei, mas eu não quero ver mais ninguém, não!
         - Olha direitinho. Você só vai ver entidades que estão em missão de socorro. Tem muitas meninas que estão sofrendo, ainda presas aqui nesta sala.  Olha só. Pode olhar.
          - Está bem, mas só dessa vez.
          Helô levantou a cabeça lentamente e olhou novamente para o mesmo ponto que tinha olhando antes, mas dessa vez, para a sua surpresa, a visão estava bem mais clara. A nitidez com que conseguiu ver a entidade, que já se postava a sua frente, deixou-a impressionada. Parecia uma pessoa de carne e osso. Sem perceber, esticou a mão na sua direção. Imediatamente a entidade pousou a sua mão sobre a dela, que sentiu o suave contato. Isso deu-lhe um grande bem estar, inundando-lhe a alma de alegria. Instantaneamente aflorou um sorriso. Helô estava sentindo-se nas nuvens. Virou-se para a Madre Maria de Lourdes e disse, quase sussurrando:
          - Puxa, irmã, acho que é o momento mais feliz da minha vida! Posso ter só essas visões boas?
          - Helô, a vida não é só feita de coisas boas. O nosso planeta ainda tem muita dor. Não podemos ter o privilegio de só ter a beleza do nosso lado. Nesse estágio da Terra, a dor é que faz a gente ir para frente. Um dia aqui vai morar a paz, a felicidade plena... O sorriso vai estar em todos os lábios, mas por enquanto a lágrima de tristeza vai continuar sendo abundante.
          - É mesmo?
          - É, mas, como eu disse, um dia a tristeza vai embora, mas enquanto isso não acontece vamos trabalhar para que um dia aconteça. Continuaremos o trabalho de onde paramos. Aguarde-me um momento, Helô.
          - O que foi, irmã?
          - Não me demoro, já volto.
          - Mas, irmã, a senhora vai aonde? Eu vou ficar aqui sozinha? E nesse escuro?
          - Fica calma! Já está com medo de novo? Vou deixar você no claro. Você vai ter uma lâmpada para clareá-la.
         E como num passe de mágica, um foco de luz, aproximando-se de um tom azulado, iluminou o entorno de Helô. Em seguida a entidade afastou-se e a menina, acompanhando-a com o olhar, vê quando ela entra pela parede e some por completo. Ficou espantada com o fenômeno, mas parecendo não acreditar muito no que acabava de presenciar balançou a cabeça, em sinal de negação, e pensou:
          - Puxa! Parece coisa de filme!
          A irmã, após atravessar a parede, chegou num aposento bem comprido, ladeado de leitos. Para por uns instantes e olha cama por cama, somente duas estavam ocupadas.  Tinha dez camas, sendo cinco de cada lado, e entre elas ainda havia um berço.  A Madre olhava tudo tristemente. Era uma enfermaria precária. Os recursos eram mínimos. Se alguém tivesse alguma complicação, com certeza não resistiria, o óbito era certo. A Madre caminhou até um dos dois leitos ocupado por uma adolescente, que não passava dos dezesseis anos, observava o ar de felicidade com que essa menina olhava para o berço, onde um bebê do sexo feminino dormia tranquilamente. Numa cama ao lado, outra menina dormia profundamente. Pelo quadro, a entidade foi informada por uma socorrista que estava à cabeceira, ela estava sedada e há poucas horas tinha dado à luz a um menino, que fora barbaramente sacrificado.  Como ela sabia, só tinham direito à vida as meninas.
          A Madre Maria de Lourdes estava triste com aquele quadro. De onde estava, passou os olhos por cada pedacinho da enfermaria, percebeu que manchas escuras se espalhavam pelo ambiente dando um ar sinistro. Não era um lugar saudável, nem material e nem espiritualmente. As meninas e a criança só não eram atacadas porque uma luz azulada bloqueava a aproximação dessas entidades trevosas. Ela então, com a ajuda da entidade que protegia as duas meninas e a criança, caminhou em volta das camas e do berço, reforçando a proteção já existente. Depois, com um gesto de mãos, iluminou toda a enfermaria, envolvendo todas as manchas escuras que imediatamente foram retiradas do ambiente, sumindo como por encanto. Tudo reluzia. O brilho era intenso. Foi uma faxina geral.
          A irmã Julia, a entidade que zelava pelo bem estar daquela enfermaria, juntou as mãos, ergueu os olhos para o céu e numa prece muda agradeceu a Deus pelo socorro prestado àquelas irmãs que ali estavam. Depois sorriu para a Madre, deixando cair um fio de lágrimas pelo rosto.
--------------Continua semana que vem!



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