A norma do
milionário excêntrico era que todos, ao ser convidado, se despissem da posição
social. Isso - é claro! - para quem
tinha alguma posição. Mas quem não aceitasse a condição, não entrava na festa.
Os sem posição social, recebiam roupas novas e caras. E, além disso, ganhava
banho de loja, salão de cabeleireiro e mais uma porção de mimos. Mas isso
realmente era somente para aqueles que não tinham um tostão furado no bolso.
Depois da arrumação, juntos e misturados, ninguém sabia quem era quem.
PC já estava com um copo de scotch.
Ele não sabia como aquele copo tinha ido parar entre seus dedos. Estava
conversando com Lucinha e alguém o colocou na sua mão. Achou estranho, mas como
estava sempre com sede, virou quase tudo de uma só vez. Nesse momento um garçom
passava do seu lado. E só foi trocar de copo. Mas dessa vez deu apenas uma
bebericada. Não havia passado cinco minutos que tinha esvaziado a primeira
dose, ele colocou a mão na cabeça e falou para a amiga:
- Lucinha. Que coisa estranha. Estou
me sentindo tonto. A cabeça está ficando pesada. Estou parecendo que estou
acordando no dia seguinte.
- Como assim? Com uma dose só? Está
ficando fraco? Um pé de cana da sua classe, cair com uma dose apenas? Não estou
te conhecendo!
- Cair nunca! Jamais em tempo algum! Só
estou meio pianinho! Lucinha é o “figueredo” que está meio baleado. Com certeza
foi à cocada que comi ontem!
- Essa cocada deve ser do Paraguai. É
mais uma marca de uísque?
- Você está muito engraçadinha,
hoje! Vou procurar um banheiro e não
demoro. Vê se Marcão está anotando tudo.
PC termina de falar, vira às costas e
sai à procura de um banheiro. Enquanto isso Lucinha vai curtindo a música que
se espalha pela mansão. Ela não conhecia, mas mesmo assim ia se mexendo. Ainda
não tinha visto Marcão e nem o delegado. Olhou em volta, mas não encontrou
nenhuma cara conhecida. Pegou um copo de chope que um garçom lhe oferecia e
bebericou. Parecia que tinha apenas molhado os lábios. A espuma ficou agarrada
num canto da boca. Enxugou com um guardanapo que tinha pegado quando comeu um
canapé. Já estava ficando impaciente. O amigo estava demorando. Mas alguém
colocou a mão no seu ombro e quando virou, deu de cara com o delegado. Respirou
aliviada quando viu o namorado. Sorriu para ele e disse:
- Carlos, sumiu todo mundo! Já estou
aqui sozinha, faz tempo!
- PC foi embora?
- Não! Ele saiu para ir ao banheiro e
ainda não voltou! Estou ficando preocupada!
- Deve ter ido embora.
- Não! Acho que não! Ele não iria
embora sem me avisar! Mas já tem mais de meia hora que saiu procurando o
banheiro. Ele deve estar em qualquer canto por aí, não é? Aquele pilantra deve
ter achado algum rabo de saia!
- Concordo! PC só vive encrencado com
mulheres! Já deve estar enroscado com alguma por aí! Não vamos nos surpreender
se, pra semana, ele já estiver vivendo maritalmente com ela! Já casou quantas
vezes?
- Sei não! Cinco ou seis. Não tenho
certeza. Pode ser que seja sete. Já perdemos a conta. Galinhão!
Em meio a esse bate papo, um tremendo
barulho ecoa pelo palacete. Parecia uma explosão. O susto foi geral. A música
foi interrompida e uma voz feminina ecoou no salão, justificando o tal barulho:
- Senhora. Senhores. Podem ficar
tranquilos. Nada de grave aconteceu. Foi apenas um garçom desatento que
derrubou um armário abarrotado de louças. Podem voltar aos comes e bebes. A
música volta em seguida.
O sorriso foi substituindo o susto.
A descontração foi voltando. O delegado aproveitou e deu um beijo rápido em Lucinha. Ela sorriu,
mas disse:
- Carlos, nós temos que ter cuidado!
Não quero encrenca para o meu lado!
- Foi rápido. Nessa confusão toda,
ninguém percebeu. Se tiver algum espião por aqui, não deve ter visto nada.
- Espero. Estou com vontade de ir ao
banheiro. Não demoro.
- Vou ficar aqui. Estou te esperando.
Lucinha vai ao encontro de um
garçom e pergunta onde fica o toalete. Ele aponta na direção e diz que é no
andar superior. Ela vai subindo às escadas e na sua cabeça vem à figura do
amigo PC. E a pergunta rola:
- Onde será que se meteu esse
pilantra?
Chega ao andar de cima e vai
procurando pelo banheiro. Encontra uma placa indicativa. Para o lado direito, o
banheiro masculino. Em frente, o feminino. Já dentro do toalete, antes de
urinar, vai se olhar no espelho. Ao se mirar, ela grita de pavor, ao ver
refletido nele um par de olhos azuis. Em seguida uma gargalhada, parecendo que
saia do inferno, ecoou estridente. Lucinha, completamente apavorada, sai numa
tremenda carreira, em
gritos. Na escada é interceptada pelo delegado, que também
tinha resolvido ir até o banheiro. Ele vendo a expressão assustada dela,
pergunta:
- O que houve Lucinha?
Lucinha tremendo dos pés a cabeça,
mal consegue articular palavras. O delegado então insiste:
- O que houve Lucinha? O que é que te
aconteceu? Fala! Olha pra mim! Sou eu: Carlos! Está me reconhecendo? O que
houve, fala?
Lucinha com dificuldade, quase em
estado de choque, fazendo um esforço hercúleo, conta ao delegado o que
aconteceu. Ele larga a namorada ali mesmo e corre até ao banheiro feminino. Mas
nada encontra. Olha cada palmo do reservado e nada. Volta e encontra Lucinha sentada no degrau da
escada. Senta-se ao seu lado, coloca o braço no seu ombro fala calmamente, mas
reticencioso:
- Lucinha, eu olhei tudo, mas não
encontrei nada. Deve... Quem sabe... Deve ter sido criação da sua mente.
É... Você deve estar com os nervos à
flor da pele. Também não é pra menos, né?
O que tem acontecido nesses últimos meses, dá pra deixar qualquer um
maluco. Quem sabe...
Continua semana que vem...
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