terça-feira, 28 de janeiro de 2025

Uma Luz e Nada Mais - Parte 40

 


Continuando...

            Sete em ponto, abriu a porta e colocou o rosto para fora, como fizera para receber o bilhete do rapaz. Parecia uma adolescente a espera do primeiro beijo. Sabia que tinha que esperar, mas a vontade era ir até a cabine dele e espera-lo na porta. Mas o bom senso dizia para que só saísse depois das sete e dez, ou ficar ali mesmo na porta, entreaberta, e só sair quando ele estivesse bem em frente.

              O tempo não queria sair do lugar. E ela se movia irrequieta. Parecia um cuco. Já perdera a conta de quantas vezes colocara a cabeça para fora. Foi até o banheiro e penteou mais uma vez os cabelos. Sabia que não podia deixa-los soltos, mas ia esquecer, pelo menos aquela vez, o que dizia o contrato. Não podia passar baton, mas o fez. Passou também um pouco de perfume. Essas coisinhas que estavam presas no contrato, preferiu esquecer temporariamente, pelo menos até as visitas normais ao amigo misterioso, da enfermaria 2, leito 1.   

                Voltou para a porta, mas antes de abri-la, se virou e mirou o relógio da mesinha de cabeceira. Viu a hora mas não acreditou: sete e sete. Estava quase na hora. Abriu a porta e deu outra olhada. Desta vez o rapaz já estava do lado de fora da sala de controle de segurança, pois saíra um pouquinho mais cedo, do que o esperado por ela. Ao avistá-lo, Natasha quase deu um pulo para fora do quarto, mas ele, parecendo adivinhar o seu movimento,   sinalizou para que o esperasse. Ela, com o coração aos pulos, se segurou nos portais e só deixou a cabeça aparecendo, obedecendo o sinal que ele fizera.     

               Até chegar onde Natasha o esperava, José Antônio quase não demorou, estava ansioso demais. Mas para ela, no entanto, pareceu uma eternidade, até ele chegar ali. O seu  nervosismo era visível, ao ponto de ele manda-la relaxar. E observou que no seu rosto apareciam gotículas de suor. Sorriu, com o intuito de descontraí-la, e, em seguida, descolou os seus braços que seguravam os portais, obstruindo a passagem, e desceu-os até a cintura. Aí o caminho ficou quase liberado para que ele entrasse, esperando só o convite dela, para que isso acontecesse. Ela estava tão sem ação, que nem pensou que estava sendo observada pelas câmeras, só virou de lado, abrindo uma brecha, para que ele entrasse no quarto, isso sem dizer uma palavra sequer. Na verdade, esqueceu completamente se existia ou não um sistema de monitoramento vigiando-a, a emoção era muito maior do que isso. Do jeito que estava, todo o risco valia a pena.  

               Natasha continuava na porta. O rapaz olhava pra ela, achando estranho aquele comportamento.

               - Ei, Natasha, olha eu aqui. – disse ele meio sem jeito.

               Ela parecia que saía de um transe. Sorriu com um jeito envergonhado. Na sua cabeça veio a imagem de Dyllon, rindo. Não entendeu aquele pensamento, naquele momento. Mas de repente ela sorriu. José Antônio pensou que fosse para ele e pegou-a pelo braço  e afastou-a da porta. Depois passou a chave na porta, trancando-a. Natasha, ainda com um sorriso nos lábios, entendeu o seu nervosismo e a sua falta de ação na chegada do rapaz. Aquilo era coisa de Dylon. Pensou ela.

               - Estou gostando do seu sorriso. – disse José Antônio.

               - Ah! Eu me achei tão estranha. Você não percebeu? Era o nervosismo. – querendo se justificar. – Vamos sentar? Precisamos conversar.

               - Temos muito o que falar. Esse tempo todo eu olhando-a de longe, foi torturante.

               - Você me paquerava à distância? – já sentados um de frente para o outro - Como eu nunca percebi?

               - Natasha, como é que você ia me ver? Só eu via você. O vidro daquela cabine, só dá pra ver de dentro para fora.

               - Esqueci. – disse Natasha com um ar de desapontamento - Zé Antônio. Posso te chamar assim? - Ele apenas balançou a cabeça dando o seu consentimento. - Então... – fez uma pausa – Não sei o que houve comigo. De repente fiquei nervosa, fiquei agitada, depois uma lerdeza se apossou de mim, que nem sei explicar. Acho que sei, mas isso fica para outra hora.

               - O que é, Natasha? – perguntou intrigado, Zé Antônio.

               - É... Nada não.

               - Como, nada não? – perguntou com uma ponta de desconfiaça o rapaz.

               Natasha não sabia o que responder. A única certeza era que não podia, por enquanto, dizer nada sobre Dyllon. Parecia que estava adivinhando o que José Antônio queria perguntar a ela.

               - O que tem naquela sala que você e os doutores entram todo dia? – a pergunta do rapaz soou como um interrogatório. O franzido na sua testa, deixou Natasha com um pé atrás.

              - Por que a pergunta? Acho que não devo responder. Não posso, pelo menos por enquanto.

              - Natasha, há muito tempo que acompanho você diariamente, nos meus plantões, nesse entra e sai dessa sala. São duas portas que isolam esse compartimento. Não sei se é uma sala ou um quarto... ou sei lá mais o que. Qual o mistério? 

 ....Continua Semana que vem!

sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

Pensamento de Poeta - Recomeçar

 


RECOMEÇAR

 - José Timotheo -

Torcer pela vida

Torcer, até enxuga-la

Quando não der mais

Enfaixá-la de esperança

Tecer mais sonhos

E ser novamente menino

                                                            fim

terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Uma Luz e Nada Mais - Parte 39

 


Continuando...

               - Como assim! Você disse que só tinha uma opção! E essa opção seria sair daqui comigo!

               - Dyllon, realmente eu pensei isso. Mas eu quero conversar com José Antônio primeiro. De repente ele foge com a gente.

               - Você acredita nisso? E se ele não quiser ir, você vai ficar?

               - Estou com esperança. Se ele estiver gostando de mim, quem sabe ele não topa fugirmos juntos. Agora, se não quiser participar da nossa fuga, aí vou com você, sem dúvida alguma.

               - Assim está bem, Natasha.  Você vai encontra-lo, então coloca tudo em pratos limpos. Pode falar da suspeita que temos da sua morte quando completar o seu contrato. E pede para saber da enfermeira que você substituiu. Segundo ouvi o médico, Dr. Ferguson, falando, que o seu nome é Carla. Pede para ele investigar. Pode também, como vai ficar um tempo bom em casa, saber sobre os paradeiros dos médicos, Drs. Jacobson e  Herbert.

                - É coisa à beça, Dyllon. Vamos torcer para que consiga. Olha só, Dyllan, estou falando uma coisa, se nem sei se ele vai aceitar.

                - Vai sim. Vou ajuda-lo a aceitar esse desafio. E depois vou ajuda-lo lá fora.

               - Mas como, Dyllon?

               - Ele só tem é que ficar sintonizado em você. Por seu intermédio, chego até ele.

               - Puxa. Que coisa de maluco. Dyllon, isso vai dar certo?

               - Vai sim, Natasha. Só se ele desistir depois que estiver lá fora. Mas acredito que por você, ele vai aceitar.

               - Vamos ver. Vamos ver, Dyllon.

               - Tem que pedir a ele, não esqueça, para que fique sintonizado em você. Não precisa ser vinte e quatro horas, aí é demais.

               - Dyllon, ele vai me encher de perguntas. Como vou explicar?

               - Qual o problema? Você fala do risco que está correndo. Ele vai ficar preocupado. Eu tenho certeza que ele não quer te perder. Ainda mais você incluindo-o dentro desse risco. Não tem nada para esconder. Não disse para colocar tudo em pratos limpos? Então, fala tudo.

                - Mas será que ele vai aceitar isso? Vai ser o nosso primeiro encontro. – fez uma pequena pausa - Então tá. Seja o que Deus quiser.   

                   - Ele não para de pensar em você. – fez uma expressão meio tristonha, mas ela não percebeu.

                O dia amanheceu do mesmo jeito que os outros dias. Ali embaixo da terra, era sempre a mesma coisa. Ninguém sabia se era noite ou dia, se não fosse pelo relógio. O sol, era um refletor que ficava aceso quase o dia todo. Só era desligado, às 20 horas. Quando era apagado, confirmava que do lado de fora havia um céu estrelado. Mas ficavam algumas luzes mais fracas acesas, para que as câmeras continuassem a vigiar o corredor, parecendo estrelas muito distantes. 

               O despertador tocou às seis horas. Natasha acordou com um susto tamanho, que o seu coração parecia que ia sair pela boca. Normalmente era com o som desse despertador que era despertada, diariamente. Mas assustada, do jeito que foi sacudida, ela não se lembrava. O corpo estava todo trêmulo. Juntou o barulho do despertador com um pesadelo, para causar aquele estrago no seu amanhecer. Mas procurou se recuperar, ainda na cama, para não levantar aborrecida, porque ia se encontrar com o rapaz do monitoramento, do sistema de segurança da base, José Antônio.

              Natasha correu para o banheiro, escovou os dentes, lavou o rosto e tomou uma ducha. Já estava outra pessoa. Chegou a cantarolar alguma canção desconhecida. Sorriu ao perceber isso. Será que virei compositora? Pensou ela. Ainda era cedo. Só ia tomar o café depois do encontro com o rapaz.

               De cinco em cinco minutos olhava o relógio. Tinha a impressão que só um ponteiro andava, o de segundos. Estava ficando ansiosa. Encheu um copo com água e tomou numa golada. Só que jogou com tanta força, que uma boa parte da água bateu no seu rosto. Imediatamente um sorriso brotou do nada. Aquele incidente acabou sendo providencial,  porque fez com que relaxasse um pouco. Esfregou o rosto e correu para o banheiro para enxuga-lo.

.....Continua Semana que vem!

 

quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

Pensamento de Poeta - Novo Mundo Velho

 


Novo Mundo Velho

José Timotheo -

 

Saí para ver o mundo

Mochila nas costas

Descompromissado abri o portão

Bastou-me invadir a calçada

E qual não foi a minha surpresa

Bem ali na minha frente

Em poucos passos, dois ou três  

O mundo estava todo ali

Na minha calçada, à minha espera

A dor estava esparramada

Pelos cacos da calçada

A fome e a desistência da vida

Estendiam as mãos

O desapego pela esperança

Corria pela sarjeta

O sonho se desmanchava na fumaça

De algum alucinógeno

Alguém fugindo do mundo

Tudo ali, tão pertinho

De um mundo tão grande

Sem fronteiras, mas demarcado

Por omissões

Vi que a calçada continuava curta

E estilhaçada

Minha velha conhecida - pensei

Mas, na verdade, era uma mera desconhecida

Mesmo depois de tanto pisá-la

Juro, nunca havia percebido que naquele espaço pequeno

Cabia todo o planeta

Olhava sem ver

Pensei: oramos desesperadamente

Mas não nos vigiamos

Pedimos para varrerem as calçadas

Jogarem água com desinfetante

Limparem o caminho para a nossa soberba

Omissão e descaso

E...

Nos embriagamos de ilusão

Deixamos um copo d’água transbordar

Enquanto alguém está sedento

Temos esperança para tudo

Abastança na vida, pedimos

Que não peguemos doença

Imploramos

Que a loteria dos sonhos

Dê a nossa numeração

E assim vai

Mas lá no final está: amor

E é o menos pedido

A paixão sobressai

O desejo transborda pelos leitos                                   

E em apenas segundos, ele vai embora

A paixão não fica

Ninguém lembra que o amor

É uma mão estendida

É um agradecimento

É uma retribuição

É um simples bom dia

É um como vai você

Simples assim

Olhava o mundo ali

Esparramado na minha frente

Não sei se chorei

Mas girei nos calcanhares

E fugi para refletir

Percebi, então, que tinha

Que mudar o meu roteiro

Agora, era entrar no avião

Da minha consciência

Arrumar meus sentimentos

E descansar a minha mochila

O mundo que preciso conhecer

Está aqui pertinho

                                                             fim