Continuando...
Balançou novamente a cabeça, mas demorou um pouco para responder.
- Sim e não. Dói mesmo quando penso na guerra. Aí me dá enjoo, calafrio... tudo o que você pensar eu sinto. Principalmente a dor na perna.
- Sabe sargento... – fez uma pausa não muito longa e brotou uma expressão que denotava um estado reflexivo - Estou pensando, analisando o seu estado e concluí que a sua dor é invenção da sua cabeça. Trocando em miúdos, é só medo!
- Que medo, Mohammed! Você sabe que não tenho medo nenhum. Sou um soldado dos Estados Unidos da América!
- E daí? Todo mundo pode ter medo em algum momento. Só que tem limite para esse medo. E o senhor – já está há muito tempo fora da guerra, não é? – Está para lá da hora de acabar com esse medo.
- Mas você ainda insiste em dizer que estou com medo, Mohammed?
- Claro! É a mais pura verdade! O senhor nem imagina o que passei no meio daqueles bandidos. O senhor foi para casa e eu continuei lá. Eu e Rachid. Coitado do meu amigo, ele passou uns maus bocados e continua passando, essa é a verdade. Sabe marcaram ele com a doença da cabeça. Dizem que ele é doido. Coitado. Aí toma remédio várias vezes no dia. Não sei porque ainda não mataram ele. Acho que Murt cuida dele. Esse outro amigo já faz parte do grupo.
- Se esse tal de Murt é seu amigo, porque não livrou a sua cara? Prepararam você para ser homem bomba e ele não fez nada?
- Disse que não conseguiu que me liberassem. Ainda falou que não seria tão ruim assim, já que era uma honra sacrificar a vida por Alá. E que muita gente ia me invejar por eu ir ao encontro das virgens prometidas, que estariam lá a minha espera.
- Que amigo. Você acredita nesse negócio de virgens?
- Não. Mas não posso falar. Sempre fingi que acreditava.
Téo levantou-se mais uma vez, parecia tenso, e foi novamente até a janela. Mal chegou, com um gesto de mão chamou Mohammed, que foi rapidamente ao seu encontro.
- O que foi sargento?
- Olha lá. A polícia chegou. Ué! Pegou o corpo e está colocando dentro de um saco! Mohammed, não são da polícia.
- Sargento olha só para o policial que está do outro lado do carro. Aquela cara eu já vi em algum lugar. Ele agora está olhando na nossa direção.
- É mesmo, Mohammed. Ele está de olho na gente.
- Já sei sargento. Sei quem é ele. É afegão. Não sei o seu nome verdadeiro, mas usa o nome de Ivan. Escutei uma vez ele conversando com alguns amigos, a respeito desse nome que usava. Sabe o que ele disse? Era Ivan o terrível. E realmente ele é terrível. A sua maldade não tem limites. Sargento nosso tempo aqui acabou. Temos que sair daqui o mais rápido possível.
- Tem a minha mãe.
- Não tem nenhuma casa que possa deixa-la?
- A minha irmã mora aqui perto.
- O senhor tem alguma arma?
- Tenho. Vou pega-la. Fica olhando discretamente para ver os passos desse Ivan.
- Pode deixar. Mas pode ficar tranquilo que, pelo o que o conheço, e como foi visto, ele não vai agir hoje. Só espero que ele não tenha me visto.
- Vou levar a minha mãe até a casa da minha irmã. Vou sair pelo lado onde eles não têm ângulo para me ver.
- O que o senhor vai dizer para a sua mãe?
- Ainda não sei. Mas acho melhor dizer a verdade. Vai ficar assustada, mas vai aceitar. Ela é corajosa. A minha irmã que é capaz de se borrar toda.
Téo, antes de ir ao encontro da mãe, pegou uma arma e entregou a Mohammed. Depois foi até a cozinha para encontrá-la. Beijou-a e calmamente contou tudo que estava acontecendo. Dona Anízia empalideceu na hora, mas com o desenrolar da conversa conseguiu dominar as emoções. Esperou o filho terminar de falar e apenas pediu que ele esperasse um pouco enquanto ia ao seu quarto pegar algumas roupas.
A porta não fez nenhum barulho ao ser aberta. Normalmente fazia sempre um leve rangido, mas dessa vez, parecendo que estava tensa igual a quem a abriu, ficou em silêncio. Dona Anízia arrumou uma pequena bolsa e antes de sair, se ajoelhou na direção de Meca e fez a sua oração a Alá. Depois saiu do quarto no mesmo silêncio que tinha entrado. Fechou a porta atrás de si sem batê-la.
Saíram em silêncio por uma porta lateral e ganharam a rua. Caminharam por dois quarteirões até a casa da filha de dona Anízia. Téo sabia que não podia contar com a irmã, mas dessa vez, já sabia de antemão, seria à força. Nunca conseguiu entender a aversão que sentia por ela e ela por ele. Mas ele sempre procurou nunca bater de frente, para não entristecer os país.
Do Anízia fez questão de apertar a campainha. Depois de muitas vezes que tinha estado ali, essa foi a primeira vez que quem atendeu foi Ângela. Mostrou uma cara de surpresa, mas, sem nada falar, apenas escancarou a porta e deu passagem para os dois.
A mãe estava mais à vontade e foi direto para uma poltrona de um lugar próxima da janela. Téo ficou em pé, mas a irmã, que continuava muda, apontou para uma cadeira ao lado da poltrona, depois puxou outra cadeira e sentou-se de frente para os dois.
......Continua Semana que vem!
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