terça-feira, 9 de janeiro de 2024

A Minha Casa Não é Essa - Parte 87

 


Continuando...

            Kurt achou mais fácil do que imaginava. O tempo que gastaram para removerem os corpos e colocarem dentro do veículo, não levou mais do que quinze minutos. Depois de tudo arrumado, colocou o carro para fora. Nesse momento a neblina já tinha tomado conta de toda a região. Nem mesmo a estrada à frente estava visível. Até a casa também estava dentro do nevoeiro. Tudo fora engolido pela fumaça branca e opaca. Kurt até comentou com a esposa:

           - Helga, minha querida, não me lembro de já ter visto uma neblina tão densa assim! E você?

          - Também não, querido. Acho que isso é obra de Deus. Não sei o porquê de Ele estar nos protegendo, mas acho que é a mão da providência sim.

         - Acho incrível você conseguir, nesses dias tão difíceis, ficar conectada a Deus, enquanto a maioria está tão presa ao materialismo. Até eu me acho tão distante Dele. Às vezes até duvido da sua existência. Fico me perguntando por que Ele consente que se cometa tanta barbaridade em nome de uma superioridade racial, que para mim não existe. Eu não posso nem pensar nisso perto dos nazistas. Estou eu aqui me colocando aparte, como se não fosse um deles.

           - Mas você não é um deles mesmo. Só não pode dizer. Esquece isso por hora, e vamos sair daqui. Não sei como, mas vamos ter que sair. Você já sabe o que vamos fazer com esses corpos?

          - Sei sim. Mas antes vou fechar a casa.

          Kurt entra rápido na casa, fecha a porta da cozinha e coloca a chave dentro de um vaso de louça, que está em cima da mesa. Corre até o carro que a esposa já está no volante e pede para que ela o siga o mais próximo possível, para que não se perca na neblina. Entra então no carro dos policiais e vai saindo bem devagar, para que a esposa não o perca de vista.

          Depois de cem metros trafegando pela estrada esburacada, finalmente a neblina começa a ficar menos densa. Logo a silhueta do carro da esposa passou a ser vista com nitidez. Ele então respira mais aliviado. E continua praticamente na mesma velocidade, não passando dos trinta quilômetros horários. Depois de andar bastante se aproximou do sítio mais próximo, que ficava depois da curva. Kurt então ligou a seta e dobrou a esquerda. Fez isso por precaução, para que a esposa não o perdesse. Passaram em frente à propriedade sem serem vistos. Naquele momento agradeceu a Deus por tê-los escondidos no meio da “nuvem”. Chegou até a esboçar um sorriso pelo pensamento.

           Depois da propriedade dos Herman, trafegaram por mais algum tempo, até que Kurt ligou a seta do carro para a direita e desceu para uma minúscula estrada, que dava para passar praticamente um carro. Nesse momento a neblina já estava menos densa e Helga conseguiu acompanhar o marido sem nenhum problema. Kurt parou em seguida, mais ou menos a cinquenta metros, debaixo de uma frondosa árvore, desceu e foi falar com a esposa.

          - Helga, vamos bem devagar. Olha só como a mata tomou conta de tudo. Parece que ninguém vem por aqui há muito tempo. Mas acredito que o caminho continue livre. Acho que são os galhos que ficaram baixos. Mas qualquer dificuldade eu desço e os corto.

          - Tudo bem, Kurt. Vai dá tudo certo, né querido? Por enquanto tudo conspira a nosso favor.

         - E vai continuar, minha querida. Está tudo saindo como planejado.

           Esse caminho escolhido por Kurt tinha como ponto final o rio. Local ideal para o que ele pretendia: se livrar do carro e dos ocupantes. Ali era o ponto mais fundo do rio e também o mais perigoso. Os poucos moradores da região evitavam essa parte do rio por ser um local ruim para a pesca e arriscado para quem fosse se banhar. Alguns aventureiros que taparam os ouvidos para os alertas, mergulharam naquelas águas e de lá não voltaram mais.  Diziam que ali tinha um sumidouro que sugava qualquer coisa que por ali passasse. 

          Kurt conhecia tudo ali como a palma da mão. Na juventude passava as férias naquela região, onde a família tivera muitas terras, mas que um pouco antes do início da guerra, devido à morte do pai, tiveram que vender a maior parte, ficando apenas aquela pequena propriedade, que coube a ele, onde morava o sobrinho.

          Nas suas andanças pela região, Kurt conheceu aquele lugar onde estava indo. Sabia do que falavam do lugar e sempre respeitou aquelas águas traiçoeiras. Ou tinha medo? Como não tinha certeza disso, o bom senso mandava não se arriscar, e era isso que fazia. Gostava tanto do lugar, que teve a curiosidade para saber a distância dali até a beira do rio. Então mediu: tinha precisamente 980 metros.

           O caminho era bem arborizado, dali até o final. Em alguns trechos o mato quase o fechava todo. Ele gostava muito daquele pedaço e, por curiosidade, gostaria de saber quem fizera, mas nunca conseguiu saber. A pessoa devia gostar muito dali, de repente nem era da região, já que ninguém do lugar se interessava por aquele pedaço de terra. Era um lugar amaldiçoado para os moradores. Mas Kurt nunca ligou para essa superstição. Ele pensava se ninguém tivesse feito aquele caminho, ele teria feito. Como não gostar daquele lugar? Não conseguia entender isso.  Duas pessoas mais antigas dali disseram que, há muitos anos atrás, tinham sumido umas pessoas ali. Elas entraram para caçar ou pescar, não sabia ao certo, e nunca mais foram vistas com vida.

           Kurt entrou no carro e continuou indo em frente. Ao se aproximar de onde a vegetação estava mais densa, pensou que o teto do carro fosse bater, mas apenas roçou. Dali para frente foi tranquilo, os ramos das árvores formaram um túnel, “ficou até bonito”, - pensou Kurt – que seguia por mais duzentos metros. Depois a vegetação foi raleando, até chegar à beira do rio. Ali continuava como há anos atrás, recordou-se. Parecia que tinha sido ontem que estivera ali.

.......Continua Semana que vem!

 

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