terça-feira, 19 de setembro de 2023

A Minha Casa Não é Essa - Parte 71

 


Continuando...

           Depois da explosão, o silêncio abocanhou aquele pedaço de país esquecido por Deus. O silêncio ali era coisa rara. Podia ser manhã ou noite, que algum tiro, um míssil ou uma granada explodia em algum lugar, parecia que o barulho    atravessava todo o Afeganistão. O sossego naquele país já tinha sido atingido por algum tiro e agonizava, há muito tempo, em alguma vala imunda.

          Kalled foi o primeiro a levantar a cabeça. A poeira ainda atrapalhava um pouco a visão, mas pacientemente com o seu binóculo para uso noturno, conseguiu fazer uma boa varredura naquela área destruída. Mas não encontrou o companheiro Amim. Como a poeira ainda estava no ar, concluiu que ele continuava escondido para se proteger. Então achou melhor ficar ali, até que retornasse e com boas notícias. O tempo passou, a poeira assentou-se e nada de Amim aparecer. Kalled acenou para os outros dois, que estavam a alguns metros distante, para que viessem até ele.

          - Balal, você vai por aquele lado. – apontando para o lado direito. – E você, Nazary, vai pela esquerda. Eu vou em frente, seguindo os passos de Amim. Andem mais ou menos cinquenta metros, depois fechem para o meio, onde devemos nos encontrar. Vamos! Vamos!

          Kalled esperou que os companheiros fossem para onde ele tinha indicado. Depois de perde-los de vista é que começou a sua caminhada. Cuidadoso como era tentava o máximo não ficar exposto para não ser pego de surpresa.

           Silenciosamente os outros dois também procuraram não ficar expostos a um ataque inimigo. Quase se arrastavam no chão, de tão arriados que estavam. Mas não estava sendo fácil se moverem por cima da grande quantidade de detritos e de poeira. Eram combatentes preparados para a adversidade, entretanto se mover por sobre pedras pontiagudas, lascas que se assemelhavam a navalhas, de tão afiadas, e o próprio inimigo, que podia estar escondido em qualquer lugar no meio daqueles escombros, era uma missão arriscadíssima. Só mesmo o ódio para leva-los a tão imprevisível missão. Botar a própria vida em risco, por pura vingança, por causa de três ianques, e sem saber se iriam encontra-los, era demais. E já tinham perdido dois amigos e ainda não sabiam que Amim, morrera vitimado pela sua própria bomba.

            O chefe caminhava cuidadosamente por cima daqueles escombros, mesmo carregando o ódio debaixo do braço. Ia até mais cauteloso do que os seus próprios subordinados, que mesmo não deixando os seus corpos a amostra, pensando que estavam protegidos de qualquer ataque inimigo, não percebiam que os seus passos causavam algum tipo de ruído, mesmo que imperceptível para ouvidos comuns, mas não para ouvidos apurados em guerras. Com isso seriam presas fáceis para os americanos.  Mas a sorte estava com eles, pois não tinham mais nenhum inimigo ao redor. Só que não sabiam disso

             Kalled depois de seguir apenas pela luz do luar tropeçou em algo, mesmo atento onde pisava. Parou e olhou fixamente para o chão, mas não conseguiu identificar o que era. Sabia que não era pedra e nem madeira. Era macio. Mesmo preocupado em ser localizado pelo o inimigo, acendeu a sua lanterna e direcionou a luz para onde pisava. Recuou ao perceber que era um homem, ou melhor, pedaços dele. Identificou que era sua gente, pelo resto de vestimenta que resistira a explosão. Não quis olhar mais detalhadamente, por que estava claro que aquele corpo era de Amim. Levantou as mãos coladas para o céu e falou alguma coisa ininteligível e foi adiante. Andou mais alguns metros e encontrou o buraco, que era a entrada do porão e que estava escancarado. Não quis iluminá-lo, antes que chegassem os seus comandados. Esperou então até que os dois ficassem ao seu redor.

              Balal foi chegando cauteloso. Parou a poucos metros de Kalled e ficou mirando-o. O chefe percebeu e fez um sinal para que se aproximasse. O outro menos precavido, se dirigiu logo para onde deveria estar o seu líder e o amigo. Encontrou-os lado a lado, em silêncio, olhando para dentro do buraco. Se postou ao lado de Kalled e mirou também o buraco negro. Como não estava conseguindo visualizar nem a escada, que supunha existir, olhou para o chefe e   perguntou:

           - Chefe, como vamos entrar nesse buraco? Olha só a escuridão!

           - Fala baixo, ô animal! Você quer que saibam da nossa presença?

           - Mas Kalled, eles já sabem que estamos aqui. Isso não é novidade para eles.

           - Eu sei. É claro que sabem da nossa presença. – falou o chefe entortando a cara – Se assim não o fosse, quem teria matado os nossos amigos?

           - Mas chefe...

           - Escuta uma coisa... – interrompeu a fala do amigo. E deu uma leve pausa. – Escuta Nazary. Eu quero que pensem que fomos embora. Vamos nos afastar e esperar. Ou se você quiser, joga uma granada aí dentro.

             - Então chefe, o que estamos esperando?

             - Você acha mesmo que eu vou deixar alguém fazer isso?

             - Mas...

             - Mas não tem nem mais nem menos. Se eu quisesse, já tinha jogado logo, quando aqui cheguei. Mas assim não ia ter graça nenhuma. Eu quero é mata-los com as minhas próprias mãos. Entendeu, Nazary?

             - Agora está tudo claro. Mas tem o garoto que está aí dentro, não é? O que eu soube é que não podemos mata-lo.

             Kalled mirou-o por alguns segundos, deixou escorregar um sorriso maldoso e respondeu:

             - Nazary, Nazary eu só espalhei isso, para que ninguém se adiantasse a mim. E além do mais o garoto que deu as informações, não está aí dentro.

             - Não?

             - É claro que não. Os que estão aí dentro, são dois e são só seus amigos, então podem ser eliminados.

             Antes que Nazary falasse mais alguma coisa, ele colocou um dedo em cima dos lábios e pediu silêncio. Em seguida encostou a sua boca na orelha dele e disse baixinho:

           - Vamos deixar passar um tempinho e depois falamos em tom alto, que já vamos embora. Eu aviso quando for o momento.

           Depois se chegou para Balal e fez a mesma coisa: falou baixinho no seu ouvido, a mesma coisa que tinha falado para o outro. Em seguida puxou os dois pelo braço e se afastou da entrada do porão. Em seguida apontou os pontos que os dois iriam ficar. Balal foi o primeiro a se encaminhar para o lugar indicado, ficando assim do lado direito da entrada. Nazary foi para à esquerda e como o amigo ficou afastado quase dois metros da entrada do porão. E o chefe ficou no centro.

.......Continua Semana que vem!

 

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