terça-feira, 6 de junho de 2023

A Minha Casa Não é Essa - Parte 56

 


 Continuando...

         O sargento chegou perto de John e colocou a mão na sua testa. Então constatou, realmente, que o soldado não estava com febre. Pediu para que Peter pegasse a mochila e a arma dele. Em seguida começou a chamar pelo amigo, mas nada dele acordar. Isso o deixou preocupado: John era grande e pesado, para ser carregado por dentro do túnel. O que fazer?  - pensou com um ar apreensivo. Parece que Peter entendeu a preocupação do sargento.

        - Sargento. Acho que se John não acordar, só teremos uma opção: deixa-lo aqui mesmo. Desconfio que ele está em coma.

        - Será? Mas Peter...

        - Sargento, é assim ou vamos todos ser presas dos guerrilheiros. Na verdade, seremos todos mortos por eles. É melhor sacrificar um, do que levar todos para a morte.

       O silêncio depois das palavras do magricela foi constrangedor. Téo sentiu o coração se apertar, em seguida bater descompassado. Seus olhos se encontraram com os de Mohammed, que entendeu tudo que o sargento estava sentindo. Não sabia o porquê dessa conexão que vinha acontecendo entre eles. Parecia que tinha a mão de Deus nessa ligação. E automaticamente foi em seu socorro. Foi até um canto, onde tinha vários objetos achados nas garimpagens e, sem saber o que estava procurando, achou dois skates no meio daquelas quinquilharias. Pegou-os e levou-os até o sargento, que não entendeu o que ele queria dizer com aquele par de skates. Mohammed sorriu com discrição e disse:

          - Sargento, eu percebi que a situação não está tão confortável assim para o senhor. Eu escutei o que o soldado falou. Não, não foi bem escutar, foi sentir mesmo. Então, não me pergunte como, eu fui até aquele monte de coisas velhas e peguei esses skates.

          - E para quê vai servir isso agora? Não entendi.

          - Sargento, o soldado que está doente não é pesado? Então, damos um jeito de colocar esses skates debaixo dele e depois vamos puxando.

         - É. Pode ser que funcione.

         Téo foi por trás do armário, olhou a portinhola e verificou o espaço para ver se daria para passar com John, mas ficou na dúvida. O soldado não era pequeno e ainda por cima preso no skate, não ia ser fácil.

         Enquanto o sargento se afastava, o soldado Peter começou a chamar por John, insistentemente, mas ele continuou sem reagir. As suspeitas que tivera, parecia se confirmar. John estava em coma profundo.

         Téo ouviu o magricela tentar acordar John. Se aproximou, junto com Mohammed, e além de chamar por ele, ainda deu umas boas sacudidelas. Mas de nada adiantou, o amigo continuava apagado. Esticou um olhar desanimado para John e balançou a cabeça para Mohammed, que tentou injetar um pouco de otimismo nele.

          - Vamos sargento, ele só está dormindo. Ele vai ficar bem. Só temos é que sair desse lugar o mais rápido possível para que possa se reabilitar longe daqui.  Vamos colocar logo ele em cima dos skates.

         - Mas Mohammed, acho que não vai dar para passarmos com ele por trás do armário e entrar na tubulação. – retrucou Téo.

         Mohammed se levantou e foi até o armário e olhou o espaço que tinha por detrás dele. Depois o balançou e olhou-o por dentro. Observou que tinha alguns parafusos fixando o fundo. Coçava a testa, passava a mão na cabeça, ficando assim por alguns segundos.  Mas depois deu um tapa na perna, deixou escapar um sorriso, e voltou para junto dos militares.

          - Sargento, – falou com firmeza - temos duas opções: uma é levar o soldado até próximo do armário, tirá-lo de cima dos skates e puxá-lo até dentro do tubo. Depois colocamos ele novamente em cima dos skates. Essa é uma opção. A outra opção é soltar o armário. Vi que ele está parafusado em cima de uma base. É só tirá-lo. Aí, temos o caminho liberado para passar. É simples.

          Téo estava impressionado com o garoto, se é que ele realmente era garoto. Essa era uma dúvida que zanzava dentro da sua cabeça. Olhou dentro da cara dele, depois deu um tapa no seu ombro e foi olhar o armário. Voltou rápido e trazendo a sua decisão.

           - Peter, vamos colocar John em cima dos skates. Primeiro vamos amarrar um no outro.

          - Será que vai dar certo, sargento? – questionou, o magricela.

          - Claro soldado. A ideia de Mohammed é boa. Também não temos mais nenhuma alternativa, não acha? – Peter bateu de ombro – Então vamos acelerar, porque já estamos dando chance ao azar. Pega John aqui comigo.

          - Tudo bem, sargento.

         Colocaram o soldado em cima dos skates e foram empurrando-o até próximo da entrada do túnel. Depois o colocaram no chão e foram puxando-o até leva-lo para dentro da tubulação, para onde Mohammed já tinha levado os skates, a espera de John.

          Rachid apenas olhava o movimento. Não arredou uma palha sequer para ajudar. Trazia dentro do coração um ódio mortal pelos americanos. Botava a culpa neles por ter matado a sua família, mesmo não tendo certeza disso. Porque não podia acreditar que um afegão pudesse atirar na sua mãe e no seu pai. E até na sua irmã, que não passava de uma criança de 08 anos.

          A sua lembrança não ia muito longe. Vinha na cabeça o barulho de bombas caindo e destruindo tudo, e a sua casa virando um monte de entulhos. Outro flash que aparecia de vez em quando na sua mente era de soldados invadindo a sua casa. Mas não conseguia lembrar-se qual era o uniforme deles. Ele fora o único sobrevivente, perdendo toda a sua família. Para ele só podia ser americano.

.....Continua na Semana que vem!

 

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