terça-feira, 20 de junho de 2023

A Minha Casa Não é Essa - Parte 58

 


 Continuando...

            Téo, depois de confirmar se John estava bem preso, mandou que o magricela ficasse atrás e então começou a puxar o companheiro. Com cautela, preocupado com o estado do amigo, foi passo sobre passo até chegar onde tinham descido. Jogou a corda no chão, passou pelos garotos e ficou mirando o túnel que estava à sua frente: este, com certeza, não podiam seguir, pois sairiam onde estavam os bandidos ou guerrilheiros. Depois olhou para o outro, que era uma incógnita. – Onde vai dar esse? – perguntou-se. Tirou o capacete e coçou a cabeça, num gesto de pura preocupação. Mohammed que não perdia um movimento sequer de Téo pensou em perguntar alguma coisa, mas acabou desistindo. Sabia que corria risco de receber uma resposta não muito boa. Bateu no ombro de Rachid e sentou-se. Mas a sua cara de preocupação era visível. Ficar ali, sem se mexer, era deveras arriscado. Conhecia bem aqueles bandidos e sentia a presença deles mais perto. Instintivamente olhou para o tubo que desceram e um pressentimento ruim acometeu-o. E um arrepio veio em seguida com o pensamento que podiam ser soterrados ali. Mal tinha pensado, uma bomba explodiu quase em cima da tampa que tinham descido. Com o impacto, o sargento foi lançado de encontro à parede de aço, ou outro material que desconheciam, indo em seguida estatela-se no fundo da tubulação, onde bateu com a cabeça, deixando-o temporariamente desnorteado. O magricela foi arremessado para cima do soldado John, que recebeu o impacto do corpo do amigo, mas não emitiu qualquer som. Já os meninos, como estavam sentados não foram arremessados contra a parede da tubulação, mas sofreram o desconforto causado pela a explosão, como se o míssil estivesse estourando dentro das suas cabeças. Isso fez com ficassem alguns minutos sem se darem conta de onde estavam.

          Téo foi se levantando ainda meio atordoado, mas aparentemente tinha conseguido sair ileso. Pegou o seu capacete que tinha caído próximo. Depois colocou a palma da mão na orelha direita e contraiu o cenho. Em seguida botou o capacete entre as pernas e colocou a outra mão na orelha esquerda. Ele estava com a sensação de que uma cigarra entrara no seu ouvido e soltava o seu canto estridente. O zumbido parecia que ia leva-lo a loucura. Ficou ainda alguns minutos ali parado, com as mãos tapando os ouvidos, esperando que aquele barulho cedesse um pouco.

           O soldado Peter, do jeito que caiu em cima de John ali ficou. Cobria a cabeça como estivesse se protegendo de um bombardeio. Não se deu conta, nem por um segundo, que tinha caído por cima do amigo. O seu desconforto auditivo era parecido com o dos outros, mas não tentava se erguer.

            Os meninos, com todos os problemas causados pela explosão, foram os primeiros a se erguer. Mohammed, sempre pronto a ajudar quem quer que fosse, viu que o sargento estava curvado, foi ao seu encontro. A sua superação frente à adversidade impressionava a qualquer um. Parecia que as dificuldades que enfrentara na vida, só fez dele uma pessoa mais forte. Raramente qualquer tempestade o colocava por terra. Os amigos diziam que ele era feito de ferro. Mas respondia, entre risos: ferro enferruja!

               Caminhou até o sargento, com as mãos também nos ouvidos, e perguntou:

              - Sargento, tudo bem?

              Téo levantou a cabeça e respondeu meio azedo:

              - O que é que você acha? Está tudo bem?

              - Claro que não. O que o senhor está sentindo, eu também estou sentindo. O meu amigo também. E o seu amigo, acredito que também esteja.

              O sargento percebeu que tinha feito uma grosseria com o menino. As palavras simplesmente saíram, não conseguindo controla-las. Procurava sempre se policiar para não acontecer esses rompantes, mas dessa vez não conseguiu vigiar o suficiente os seus maus instintos. Mesmo achando que estava sempre atento, às vezes escorregava na sua vigilância. Buscava diariamente uma voz do passado, que ecoava na sua mente, a qual dissera para que antes de falar qualquer coisa, que não fosse boa, enchesse a boca d’água. Normalmente estava atento, mas de vez em quando, não vigiando o suficiente, acabava magoando alguém e a si próprio. Orai e vigiai era a sua meta diária. Não era um religioso que abraçasse uma religião a ou b. Aprendera com o pai e a mãe a respeitar a todas as religiões que trilhassem o caminho do bem. Mas Jesus era o seu ponto de partida e chegada. Procurava ficar atento a todos os seus ensinamentos, mas sabia que numa guerra não era fácil andar com a bíblia debaixo do braço e os ensinamentos prontos para serem seguidos. O ódio se destacava como o maior dos mandamentos. Os ensinamentos de Jesus, Buda, Maomé, Moisés e outros, ficavam esquecidos na explosão de um míssil, de uma granada, no tiro de um fuzil, na dor de um amigo morto. Nesses momentos a ira sepultava a docilidade. Não tinha espaço para a tolerância, para o amor, para nada de bom. Enquanto Téo estava perdido em meio aos pensamentos com a cabeça abaixada, talvez envergonhado, voltou à realidade quando sentiu a mão de Mohammed no seu braço. Levantou a cabeça e deixou fluir um leve sorriso. Em seguida falou, meio sem jeito:

               - Puxa. Desculpa. É... Fiquei meio atordoado.

               Mohammed sorriu e bateu de leve no braço do sargento. Ao se virar, para voltar para o lado do amigo, se deparou com alguma coisa que o chamou a atenção, no fundo do outro túnel. Olhou para Téo e comentou:

               - Sargento, olha que coisa esquisita lá no fundo do túnel. É uma fumaça suspeita.

               Téo olhou e ficou intrigado. Não quis ir averiguar o que seria. Falou para os meninos se dirigirem para o outro túnel. Chamou por Peter, que ainda estava deitando por cima do corpo de John.

               - Peter! Peter! Levanta daí cara! Vamos sair daqui o mais rápido possível! Você se jogou em cima de John?

               - Não sargento! Eu caí! A explosão me jogou em cima dele!

               - Mas você continua amassando ele! John já não está nada, nada bem e você ainda fica com o seu peso todo em cima dele! Levanta logo! Não vamos examina-lo agora, só quando estivermos salvos! Ok? Vamos! Vamos! Vamos puxá-lo!

..........Continua na Semana que vem!

 

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