terça-feira, 13 de junho de 2023

A Minha Casa Não é Essa - Parte 57

 


 Continuando...

           Quando foi resgatado dos escombros, e que também não se lembra por quem, se recorda apenas que alguém falou que aquilo era obra dos ianques. Toda a região fora bombardeada, por horas seguidas, por mísseis de grande poder de destruição.

            Foi no hospital que conheceu Mohammed. Foi uma amizade construída no dia a dia. E agora era como se fossem irmãos. No início ele se aproximou por pena, mas com o tempo isso foi sendo substituído por admiração. Mesmo sabendo que Mohammed não sabia quem era isso não modificou em nada a amizade entre ambos. A amnésia dele foi total e continua até hoje, já a sua foi apenas parcial, pois conseguiu lembrar-se do seu nome, dos nomes dos pais e o da sua irmã. Só não conseguiu lembrar-se dos soldados que invadiram a sua casa e por quem tinha sido resgatado dos escombros.

             Rachid olhou para os americanos e se arrependeu de tê-los salvos. Mas sabia que o que tinha feito só foi mesmo para salvar Mohammed. Na realidade não teria outro jeito de manter o amigo vivo e, com esse pensamento, conseguiu sossegar o espírito. Chegou até a suspirar fundo. Levantou-se e foi até a dispensa improvisada que mantinha no segundo esconderijo, pegou alguns enlatados e jogou na mochila. Depois encostou-se na parede e esperou que terminassem de colocar o soldado John em cima dos skates. Mas de repente bateu na cabeça e foi na direção de onde mantinham um pequeno depósito com garrafas de água mineral. – Aquele sim tinha sido um grande achado! – pensou Rachid. Em seguida os seus olhos brilharam e dos lábios escapou um sorriso de satisfação. Isso por ter sido ele o garimpeiro de tão importante achado. Pegou algumas garrafas de água mineral, que não deveriam desfalcar o estoque, e colocou-as dentro da mochila.

          - Rachid! Rachid! Vamos! – gritou o amigo Mohammed.

          Ele não respondeu ao chamado, mas foi em direção ao túnel. Ou ao tubo salvador, segundo segredou-lhe o amigo. Então, para que Mohammed não o chamasse novamente, acelerou os passos. Lá chegando já encontrou o soldado John em cima dos skates, apagado do mesmo jeito que tinha chegado ali. Balançou a cabeça, demonstrando que não acreditava que ele pudesse sair daquela situação com vida. Entrou e passou pelo soldado que estava deitado, postando-se ao lado do amigo Mohammed. Depois se aproximou da sua orelha e falou:

           - Mohammed, esse gringo não vai muito longe.

           - Por quê?

           - Esse ronco dele não é normal. Acho melhor largar ele por aqui mesmo.

           - Porque isso Rachid? Como deixar ele por aqui?

           - Mas ele já é um peso morto. E só vai colocar a gente em perigo.

            Nisso o sargento que ia fechar a pequena porta, foi chamado à atenção pela conversa dos meninos e com isso acabou esquecendo-se de trancá-la. Se virou e, num tom de voz alta, chamou a atenção dos meninos:

            - Ei! O que é que estão cochichando aí? Tem que falar para todos ouvirem!   

            - Nada não sargento, - respondeu Mohammed – ele só está querendo saber onde vai dar esse túnel. Mas eu já respondi: nós também não sabemos onde vamos sair desse tubo.

            - O que é que esse ianque falou? Não gosto deles, Mohammed. Quando olho esses soldados americanos, vejo um assassino. Um assassino da minha família.

            - Rachid, você não tem certeza disso. De repente foram os americanos que salvaram você.

             - Mas não acredito mesmo! Quando um afegão ia matar a minha família?

             - Algum bandido. Algum grupo dissidente. Alguns guerrilheiros. Pode ter estrangeiros, mas a maioria, com certeza, são afegãos.

             - Mas é diferente. Os ianques são invasores.

             Nisso o sargento ao se aproximar, interrompe a conversa dos dois, demonstrando que não estava gostando nada, nada daquele papo ao pé do ouvido. Ainda mais numa língua que não entendia.

             - O que é que está havendo? Por que tanto cochicho? O que é que estão tramando? Eu não falei que qualquer conversa tem que ser na altura que todos entendam?

             - Calma sargento. Puxa! Para quê tanta pergunta? Só estamos conversando, sargento. Coisa sem importância. E além do mais, ele não entende o idioma de vocês. Só eu consigo falar com ele.

             - Coisa sem importância? Eu não estou gostando do olhar desse garoto pra mim. Alguma coisa me diz que ele está tramando alguma coisa. Vou ficar de olho em vocês. Vão ficar na minha mira.

             - Por que isso? O senhor está vendo fantasma. Ele só está preocupado e tenso. O que ele estava falando, é que não se sente bem dentro desse túnel. Ele tem muito medo de ficar em lugar fechado. É só isso. Mais nada. O senhor não se esqueceu que foi ele quem salvou a gente. Ou se esqueceu?

              O sargento conseguiu descontrair o cenho, acertou o capacete, esboçou um sorriso meio sem graça e disse:

            - De jeito nenhum. Nós somos muito gratos a ele.

            Rachid que não estava entendendo o que o sargento falava, perguntou a Mohammed:

             - O que ele falou?

             - Agradeceu por você nos ter salvado. – respondeu rapidamente Mohammed.

             O menino olhou para o sargento e balançou a cabeça, agradecendo as palavras, mas o seu olhar, que manteve escondido, queria é destruir Téo. O seu ódio pelos americanos era muito. Depois virou o rosto e, batendo no ombro do amigo, foi se afastando do sargento.  Parou um pouco à frente e esperou que terminassem de amarrar o soldado nos skates.

.....Continua Semana que vem!

 

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