quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

A Minha Casa Não é Essa - Parte 40

 


Continuando...

            No fundo somos todos preconceituosos, Mohammed. Discriminamos uma pessoa pela roupa que veste, discriminamos pelo modo de falar, discriminamos por tudo. Na verdade, estamos julgando, mostrando o defeito dos outros, para esconder os nossos próprios aleijões.

          - É sargento, a guerra é sempre culpa do outro. Não é mesmo? Então sargento, o senhor é muçulmano ou judeu?

          Téo, antes de responder, passou os olhos ao redor, sem saber o que procurava, - talvez tenha dado um mergulho no passado - fixou-os sério no menino, e depois deixou escapar um sorriso morno. Mohammed não entendeu a reação do sargento, entretanto não quis fazer qualquer comentário e esperou pela reação à sua pergunta. O silêncio estava entre os dois. O sargento voltou a ficar sério, passou a mão na cabeça do garoto e quebrou o silêncio.

           - Quando eu penso nisso, antes que eu fale alguma coisa, o riso vem na frente. É uma coisa louca e sábia ao mesmo tempo. Uma coisa estranha, essa é verdade.

           Eu sempre soube que o meu pai é uma pessoa de outro mundo. Um ser equilibradíssimo, defensor das igualdades entre as raças. - Ninguém é melhor do que ninguém. – diz ele. Sempre procura proteger o meio ambiente. Uma visão de religião e religiosidade impressionante. Minha mãe também não fica atrás, não. É uma mulher que está à frente do seu tempo. Eu disse algumas vezes para ela, que se ela estivesse em qualquer país muçulmano, com certeza iria ficar trancada em algum calabouço, para não influenciar as outras mulheres. Minha mãe nunca usou aquelas vestimentas das mulheres árabes, ela continua usando roupas que as mulheres brasileiras usam. Que escândalo, não é?

           - Por aqui, com o pouco que conheço, ela seria morta. – respondeu, quase sussurrando, Mohammed.

            - Também acho. – continuou Téo - A tolerância para com as mulheres, em muitos países, tende a zero. Infelizmente a mulher ainda é tratada com muito descaso e desumanidade. São poucos os países no planeta que tratam a mulher com o respeito que elas merecem. Acho que é medo dos machistas. Eles sabem que as mulheres são capazes em qualquer área que tiverem acesso. Eles se borram de medo.  E eu fui criado, graças a Deus, nesse ambiente liberal que meu pai e minha mãe implantaram lá em casa. Bebo ali, uma educação sadia.

             Quando eu perguntei ao meu pai qual a religião que deveria seguir, ele me disse qual a que eu não deveria seguir. Ou melhor: quais.

            - Quais? Quais, sargento?

            - Não desconfiou. Ele me disse para não ser judeu e nem muçulmano. Aí eu fiquei encucado. Então perguntei:

            - Pai, a religião judaica e a muçulmana não servem?

            Ele me respondeu:

            - Muito pelo contrário, são duas excelentes religiões. Todos os ensinamentos contidos na Torá e Alcorão, seguidos ao pé da letra, é o caminho sem tropeços para ir-se até Jeová ou Alá, que quer dizer a mesma coisa. É Deus para os cristãos. O caminho está na nossa frente, é segui-lo. Não são apenas os Judeus e os Muçulmanos os únicos privilegiados, não. Os seguidores do Budismo, Hinduísmo e outras religiões também têm o seu caminho para se chegar ao Pai de todos nós. Ninguém tem privilégios. Nenhuma raça é melhor ou pior do que a outra. Somos filhos do mesmo Pai. E o pai não faz diferença entre seus filhos, não é? O filho, pelo livre arbítrio, é que procura a sua estrada, só que às vezes prefere atalhos que nunca chegam ao caminho do bem. Ele roda, roda, mas o pai não o abandona.

             Aí eu fiquei encucado do porquê de não poder ser Judeu ou Muçulmano. Tinha que saber.

             Mohammed já estava cheio de curiosidade.

           - Sargento, se o senhor seu pai é um Judeu e a senhora sua mãe uma Muçulmana, porque não pôde escolher uma das duas? Por que procurar outra religião?

         - É Mohammed, aí é que está o x da questão. Existe muito preconceito religioso no mundo. A sua religião é sempre a melhor. Só que ainda tem um agravante: dentro de cada religião ainda tem grupos dissidentes, que interpretam diferentemente o Alcorão, ou a Torá, ou a Bíblia, etc aí dá a maior confusão. Às vezes têm confrontos armados, gerando mortes em nome de Deus, Jeová, Alá e outros nomes para o nosso Pai que está nos céus.

         - Até aqui o que não falta é briga. – interrompeu Mohammed - Ninguém se entende. E o seu pai falou mais?

         - Com esse negócio – continuou o sargento - de ter que escolher outra religião que não fosse a deles, eu quis saber o motivo. Então ele me disse que era para eu aprender a ser tolerante com qualquer pessoa, entender e aceitar as escolhas dos outros, não menosprezar o caminho escolhido pelo seu semelhante, não julgar as decisões que tenham tomado, mesmo não concordando, procurar sempre apaziguar os ânimos, não botando, como dizem meus primos brasileiros, lenha na fogueira. Realmente respeitar o seu semelhante integralmente. Foi mais ou menos isso que ele disse. 

........Continua Semana que vem!

 

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