terça-feira, 16 de março de 2021

Nos Escaninhos do Coração - Parte 17

 


Continua...

           Era isso ou ficar ali esperando pelo socorro, que, com certeza, não chegaria nunca. Ou ainda morrer. E morrer ele não queria de jeito nenhum. De repente os seus pensamentos foram interrompidos por um ruído. Alguma coisa se esfregava entre as folhagens. Ouvia, mas não conseguia ver nada, devido a posição que estava. Era um incômodo só. Ainda era dia, mas o local estava escuro. Como descobrir o que se arrastava no meio daquela folhagem? Podia ser qualquer coisa. Essa qualquer coisa, pensou, podia ser uma onça. Esqueceu-se até da dor no braço e nas costelas, porque podia sentir uma dor maior, como uma abocanhada de uma onça pintada. A princípio, depois de ver a altura que estava do chão, sentiu um alívio, mas depois se deu conta que tinha a copa de uma árvore, há poucos metros da sua cabeça. Se fosse uma onça, ela chegaria fácil, fácil até ele. Naquela hora, um tremor sacudiu todo o seu corpo. Fechou os olhos como se isso fosse protegê-lo do ataque do suposto felino. Mas como num passe de mágica, a mata mergulhou novamente no silêncio. Respirou, aliviado. Depois pensou: - Deve ter sido Deus.

               André, após o sufoco, voltou a raciocinar. Tinha que botar em prática a estratégia que idealizara. Queria chegar até a saliência da pedra e ali se segurar.

              - Eu vou conseguir – falou baixinho - pois ainda continuo balançando, sem precisar fazer nada.

               Era a mão invisível ajudando-o a se balançar.  Só que tinha perdido a noção dessa ajuda. Fruto da ansiedade, então querendo dar mais velocidade ao corpo, impulsionou-o com o braço quebrado. Aí sentiu uma dor tão forte, que quase desmaiou. Não apagou, mas perdeu completamente a noção de onde estava.

          O tempo foi passando, entretanto a dor não era proporcional ao tempo. De vez em quando um calafrio percorria o seu corpo. Começou a bater o queixo de tanto frio. Percebeu que estava com febre e febre alta.  Começou a tremer e falar coisas desconexas, até perder completamente a consciência.

          O dia partiu. A noite chegou e foi a mais silenciosa que já se viu.  Nada se movia ao redor. Nenhum sonzinho.  Tudo levava a crer que por ali já não existia mais vida. E esse quadro foi até os primeiros raios de sol invadir a madrugada sem pedir licença, e assim foi tomando conta do novo dia. Pegou em cheio o rosto de André, que apresentava uma face torcida, ainda carregada de dor e muito pálida.

          O sol mostrou-se por completo. Refletia sua luz com bastante intensidade na montanha. E já estava há mais de uma hora castigando o corpo sofrido de André. Se não fosse por uma respiração leve, acreditar-se-ia que aquele corpo fora abandonado pela vida. Mas a vida surpreende a todo momento. E não é que mais uma vez aconteceu? De repente André abriu os olhos, ainda de cabeça para baixo, balançou-a, e depois passou os dedos da mão esquerda nos olhos. Nesse momento não tinha nem um pinguinho de vento. Era uma calmaria só. Esfregou a barriga e fez uma careta. Ele estava com fome e sede. Desde o dia anterior não bebia água e nem comia nada. Se continuasse assim, tinha certeza, ia morrer. Principalmente a falta de água causaria o óbito rapidamente.

         Antes de tentar qualquer coisa fez uma varredura com o olhar pelas proximidades. Nada viu. Estava desanimado. Mas quem sabe chegasse alguma alma salvadora? Não. Não devia contar com a esperança. Isso era pura ilusão. A única pessoa que ele poderia contar seria consigo mesmo.  Tinha que se mexer. O único objetivo possível seria chegar até onde viu a saliência na pedra. Ali estava a saída. Como não tinha vento, forçaria o balanço. E assim fez. Deu um empurrão, com a mão esquerda, para fora. Só que não pensou, que ao empurrar o corpo para fora, ele voltaria. Aí não deu outra: foi uma porrada na parede rochosa, daquelas! Como conseguiu engolir o grito, não saberia dizer. Foi uma dor tão intensa que quase apagou novamente. Fechou os olhos para tentar relaxar. De repente sentiu a mesma coisa que sentira antes: um sopro no braço quebrado e nas costelas. Depois circulou por todo o seu corpo e parou na cabeça. E em seguida desapareceu. A sensação é que tinham derramado analgésico por todo o seu corpo. O alívio foi instantâneo. Abriu os olhos meio que assustado. Olhou para ver se tinha alguém pendurado do seu lado. Mas não tinha ninguém. Estava se sentindo confortável, mesmo de cabeça para baixo.

          A imagem de Luiza voltou bem viva à sua cabeça. O tempo estava passando e ainda não tinha feito nada para salvá-la. Lembrou-se do estado febril que o acometera no dia anterior. E que tinha sido a última coisa que se recordava. Naquele momento estava envolvido no silêncio novamente. Então achou melhor gritar pela amiga. E gritou o mais alto que pode. Mas o silêncio foi o que teve como resposta. Uma tristeza tão profunda o envolveu. Sem perceber começou a chorar. E um pensamento bem pessimista invadiu a sua cabeça:

          - Meu Deus! Será que Luiza morreu?  Não posso aceitar essa rasteira do destino! Ela não faria isso comigo!

          Ele confiava tanto nela, que não aceitava a hipótese dela morrer sem ele. Foi o que sempre pensou. Se ela morresse, ele morreria junto.

        Queria botar o seu pensamento em ordem. Descontrolar-se não lhe ajudaria em nada. E tentou colocar na sua cabeça que ela não partiria para o outro lado da vida, sem saber do grande amor que lhe devotava.  

 

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