terça-feira, 4 de dezembro de 2018

A História de Helô - Parte 9

Continua...

       Helô olhou para a irmã e não aguentando a sua cara engraçada, caiu na gargalhada. A irmã Gertrudes também não resistiu e deixou o seu riso solto ecoar pelo jardim. Ficaram tentando parar de rir, mas custaram a conseguir. A irmã Gertrudes, percebendo que tinham chamado muito a atenção, com muito esforço, conseguiu engolir o riso. A preocupação falou mais alto. Não queria ser chamada a atenção. Então, quando finalmente serenaram os ânimos, ela pegou a mão de Helô e convidou-a a passear pela alameda. Depois de contornar todo o jardim, sentou-se num banco e puxou a menina para sentar-se ao seu lado, abraçou-a e depois falou próximo a sua orelha:
          - Minha menina, preste bem atenção no que vou te falar. Não comentes com ninguém o que acabas de me contar. Daqui a pouco todos ficam sabendo e... e cai no ouvido da madre. Aí vai ser um interrogatório daqueles! Deus nos acuda! Tu não queres isso, certo?
          - Claro que não! Irmã, fala você! Não me chama de tu, não!
         - Fazes-me rir! Está bem: você me faz rir! Está melhor?
         - Agora sim!
         - Então aproveita que você está bem e vai estudar um pouco de música. A irmã Das Dores me disse que anda muito dispersa! Você não falou que vai ser cantora? Então tem que estudar muito! Gostou? Falei você!
         - Gostei. Está bem, vou estudar mais!
         A irmã Gertrudes deu um beijo na bochecha de Helô, levantou-se e saiu em direção ao alojamento das crianças maiores, para fazer a sua inspeção diária. Mas mal aproximou-se da porta, foi interceptada pela irmã Dolores que trazia um recado da madre superiora, dizendo que a esperava no seu escritório.  A irmã que já tinha as bochechas rosadas ficou com elas mais vermelhas. Arregalou os olhos, demonstrando que estava amedrontada. E não era para menos, porque sabia de antemão que qualquer chamamento da madre era sinal de encrenca. Tentou recompor-se e foi em direção à sala da madre. No caminho vasculhou sua memória para tentar descobrir a causa do chamamento. A princípio não achou mas depois se lembrou de Helô. Só podia ser essa a causa. Na mesma hora veio a imagem da amiga Amélia na sua cabeça. - Só pode ser isso. – pensou. Porém não recuou e continuou o seu caminho. Chegou à frente da porta, bateu levemente e esperou. Rapidamente a porta foi aberta pela irmã Celeste, a fiel escudeira da madre, que lhe deu passagem. Em seguida saiu, fechando a porta atrás de si, deixando as duas sozinhas.
            A irmã Gertrudes já estava dentro da sala, frente a frente com a madre. Arrumou o hábito e postou-se feito uma estátua. Não sabia o que fazer ali parada. A respiração já estava bem ofegante e as bochechas ficaram logo avermelhadas além do normal, mostrando bem o que se passava no seu interior. 
          A madre do jeito que estava ficou: cabeça baixa, fazendo suas anotações diárias. Parecia que não tinha mais ninguém ali no ambiente. Deixou a irmã Gertrudes ali parada por mais de cinco minutos. De repente levantou a cabeça e apontou uma cadeira. A irmã Gertrudes sentou-se e manteve-se calada. Não ousou perguntar nada. Sabia que algumas irmãs foram chamadas até a sala da madre e saíram de lá sem proferir uma palavra sequer. A pessoa entrou muda e saiu calada. Podia acontecer com ela. Ficou na sua. Mas isso era um fato que fugia à sua compreensão. Lembrou-se mais uma vez de Amélia. - Isso não acontecia com ela. – pensou.  Todas as vezes que era chamada, a coisa ficava preta para o seu lado e isso era do conhecimento de todos, mas ninguém ousava questionar.
          A madre terminou de fazer as suas anotações, fechou o livro, tirou o óculo e disse:
          - Irmã, o que é que está havendo com a menina Heloisa? Tenho sido informada que a menina anda meio cabisbaixa, arredia e parecendo triste. Soube que ela esteve com você por mais de uma hora. Posso saber o que houve?  Pode responder.
          A irmã ficou tentando encontrar algum argumento para justificar o tempo que passou com Helô. Sabia que tinha que dividir o seu tempo com todas as crianças. Essa era a falta que tinha cometido, com certeza. Tinha que justificar de qualquer jeito, todavia não queria dizer a verdade mas, por outro lado, não podia mentir. Estava num beco sem saída. O seu silêncio fez com que a madre falasse mais rispidamente:
         - Irmã! Irmã! Não venha com mentiras! Sabe muito bem que não perdoo a falta de verdade! E a irmã sabe muito bem o preço a pagar! Não sabe? Se não sabe, vai saber agora!
          - Não irmã! Eu sei da punição! É...
         - É o quê?
         - Vou contar madre! Vou contar! Não é nada demais!  A menina me contou um fato, mas me pediu pra não contar pra ninguém. Ela tem vergonha se alguém souber.
         - Souber de quê? Fala logo!
         - Eu dei a palavra...
          - E eu quero saber de palavra? É alguma coisa grave? Ela está doente?
         - Não madre. Ela está bem de saúde. Não é nada demais.
         - Se não é nada demais, então fala. E mesmo que fosse alguma coisa muito grave, você tinha que falar de qualquer jeito. Você está cansada de saber que Helô é uma das poucas crianças que me preocupa. Desembucha. Fala logo, criatura! Fala!  
           Com o silêncio da irmã Gertrudes, a madre gritou e deu um soco na mesa. Com toda essa violência, após o susto, resolveu falar.

         - Madre, ela nem sabe direito. Acha que estava dormindo. Na verdade não sabe o que aconteceu. Pode ter sido um sonho.
          - Fala logo criatura! Deixa de enrolação!
          - Vou falar. Madre, ela me disse que ouviu alguém falar com ela. Escutou direitinho alguém falando no seu ouvido. É só isso. E ela está muito preocupada. Na verdade, está com muito medo.
         - Só isso mesmo? Quer que eu a chame para confirmar?
         - Não madre. Acho que não. Foi só isso mesmo. Juro por Nosso Senhor Jesus Cristo. Mas se a senhora acha que deva chamar a menina. Ué, pode chamar!
 
................Continua semana que vem!

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