terça-feira, 11 de julho de 2017

Um Anjo na Boleia - Parte 16

Continuando...
Enquanto dona Maria vai buscar a carta, a filha entra com uma bandeja, com duas xícaras de café. Quim pega o seu, comenta:
     - Nossa mãe! Toni olha só o cheirinho desse café! Sente só!
     - Além de cheiroso, está muito gostoso! Obrigado, menina!
       Nisso volta dona Maria com dois envelopes na mão. Segurando-os, como se tivesse transportando algo de muito valor. Antes de entregá-los, beija-os carinhosamente.
     - Aqui senhor. Pode ler. 
       Toni abre o mais antigo e ler em silêncio. No segundo, dá um sorriso e comenta:
      - Dona Maria, ele fala em Lourenço, sim! Diz aqui, que ele é um grande amigo. Uma pessoa de bom coração e caráter. Mas diz também, que não sabe se terá esse amigo por muito tempo. Achava que Lourenço não suportaria a enfermidade. Quim será que ele está morto, também?
      - Sei lá! Foi ele que te entregou o caixão?
      - Isso não. Foi na funerária.
      - Vocês trouxeram o corpo do meu marido?
      - Não, a gente achava que sim. Mas não trouxemos. Foi só o caixão vazio que veio com a gente. Mas eu pensei que o corpo estava lá dentro. Acho que agora estou entendendo o que aconteceu. O caixão foi só pra despistar. Quim será que foi um morto que armou isso tudo?
     - Não! Estou achando que foram dois: a menina e o pai! Mas como uma pessoa morta pode fazer isso? Que mistério, hein Toni!
     - Será, Quim? Se foram eles, usaram a gente! Como devem ter usado outras pessoas por lá, também! Mas é muito estranho, isso tudo! Nunca ouvi falar que algum morto tenha ajudado alguém!
     - Ué! Você que acredita em tudo, deve acreditar nisso também!
     - Mais ou menos! Até que na menina eu acredito! Depois dessa prova aqui! Esse retrato... a gente não se enganou! É ela mesma, não é?
    - É! Acho que é!
    - Seu Toni. Eu gostaria de ir até esse lugar. Queria ver aonde o meu marido está enterrado.
  - A senhora vai ter que ir mesmo! Não é Toni? A senhora está com a chave de algum cofre no banco. Tem que ver a conta que tem lá também. Oh! Mas a senhora não deve procurar ninguém na cidade, não! Resolve tudo no banco, primeiro! Aí depois a senhora vailá onde está enterrado o falecido! Procura saber, discretamente, se esse tal de Lourenço ainda está por lá! Isso se ainda estiver vivo!
    - O que é isso, Quim! Se ele estiver vivo?
    - Mas é claro! Pelo jeito que está escrito na carta, o cara já passou para o andar de cima, também!
    - É! Pode ser! Mas você tem que saber como falar! Vai falando assim na bucha, que o cara morreu? Tem que ter cuidado! Masvocê é assim mesmo, né? O que é que eu vou fazer?
      Enquanto o irmão faz umas caretas, Toni se dirige para dona Maria, antes que ele conteste a colocação que tinha feito.
    - Dona Maria, me diz uma coisa: quem vai ajudar à senhora resolver isso tudo?
      - Eu tenho um filho maior. Ele trabalha numa fazenda aqui perto. É menino bom! Tem o nome do pai. O patrão gosta muito dele. Ele sabe ler e escrever. Dirige os caminhão lá da fazenda. Os trator também! Seu moço, ele já estava até pensando em ir atrás do pai. Agora a gente vai.
Muito obrigado pelo que fizeram por nós. Pode deixá que a gente dá um jeito.
      - Dona Maria...
      - O que é que você vai falar, Quim?
      - Nada. Só uma coisa que pensei aqui. A senhora, antes de ir lá para o escafundeu de Judas, pode ir até uma agência do banco, aqui na cidade vizinha, e conferir o que tem na conta.
     - Pode?
     - Dona Maria, Quim está certo. A senhora tem o cartão e a senha. Com isso a senhora vai saber quanto o Zé deixou na conta, pra vocês. Oh! Mas cuidado! Não pode mostrar pra ninguém essa senha, não!
    - Pode deixar. Eu vou ter cuidado.
    - Toni, a gente já pode ir, né?
- Claro que não! Falta descarregar o caminhão! Esqueceu?
    - Puxa vida! Já pensou se a gente esquece? Pegar essa estrada novamente pra vir aqui trazer tudo? Vamos rápido, Toni!
     Em pouco tempo, com a ajuda de dona Maria e os filhos, eles conseguem colocar tudo dentro do casebre. Um tudo que na realidade, não era muita coisa. Mas deu para entupir a casa de Zé Betão. Com aquelas tralhas, como diz Quim, dona Maria não conseguiu esconder a alegria, que brotou de dentro da sua tristeza. Agradeceu, emocionada.
      - Muito obrigada por tudo. Não tenho como pagar tanta bondade.
      - O que é isso, dona Maria? Não precisa agradecer! Fizemos de coração! Não é Quim?
      - Claro! Isso mesmo! Mas... Dona Maria, desculpe, mas agora temos que ir andando! Hein Toni, podemos ir?
      - Ah, sim! Podemos ir! A senhora não precisa mais da gente, não?
      - Mas vocês já vão? Se quiserem ficar aqui, até amanhã, podem ficar! A casa é pobre, mas dá boa acolhida!
      - Muito obrigado! Mas acho melhor, a gente ir andando! Sabe dona Maria! Alguma coisa está me dizendo, que essa vida de aperto vai passar! A vida de vocês vai melhorar!
     - Deus queira que sim.
     - E ele há de querer! Não é Quim? Dona Maria a gente já vai andando. Fiquem com Deus.
      Quim já demonstrando impaciência, fala baixo no ouvido do irmão:
       - Vamos, Toni! Vamos nessa! Já cumprimos nossa missão! Já entregamos tudo que tínhamos pra entregar! Vamos picar a mula! Vamos aproveitar que ainda está claro! Dá pra gente andar um bocado, ainda!
       - Tá apressado! Vai parecer que estamos doidos pra sair daqui! Isso é falta de educação! Calma aí, Quim!Será que não dá pra gente deixar alguma grana pra eles? Eu acho que a dispensa deles, está vazia! Até eles se acertarem, né?
       - Vai lá, irmã Tereza! Vai lá!
       - Dona Maria, eu estava falando aqui com o meu irmão... A gente resolveu deixar algum dinheiro pra vocês. Vai dar pra...
      - Não precisa se preocupar, não. A gente dá um jeito. Um dia a mais, um dia a menos... Não vai fazer diferença, não!
      - A senhora não vai fazer essa desfeita, vai? É de coração! Eu e Quim queremos que a senhora aceite!
     - Como é que eu vou pagar a vocês? Já estou devendo tanto!

     - E quem disse que a senhora está devendo alguma coisa? Quem falou em pagar? É um presente, dona Maria! Se fosse ao contrário, eu tenho certeza que Zé Betão faria o mesmo! Está aqui. Fiquem com Deus e boa sorte. Nós já vamos. Se a senhora precisar da gente, é só telefonar. Está aqui o nosso telefone. É só ligar! Não precisa chorar. Vou acabar chorando também.
           Continua semana que vem...

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