terça-feira, 13 de junho de 2017

Um Anjo na Boleia - Parte 12

Continuando...
          - Não se preocupe. Não tem nada pra explicar, não! Você não tem um envelope para entregar pra família?
        - Tenho.
        - Então, é a única coisa que importa! Eles não precisam saber de corpo nenhum!
           Toni fica olhando para a menina, sem saber o que falar. Estava tentando encontrar palavras para continuar a conversa. Olha para o irmão, como querendo que ele falasse alguma coisa, mas Quim, parecendo que tinha percebido a intenção dele, dá uma sacudida na cabeça, negando, e diz:
          - Oh! Estou fora! Não tenho nada pra dizer! Não sabia de corpo nenhum! E tem mais: foi até melhor os caras terem levado o caixão! Você sabe que eu não fico muito a vontade perto de defunto!
          - Mas você é cagão, Quim! Eu sabia que não podia contar com você! Agora, menina, me diz uma coisa: como é que você sabia do envelope? Ninguém sabia! Acho que nem Quim sabia! Se eu comentei, elenem percebeu!
         - É! Não sei de envelope nenhum! Você não falou nada! Acho que falou de uma carta! Só isso!
         - Ah! Quim! Devo ter falado e você não registrou! Mas quero saber como você sabia, menina!
         - Isso não é importante agora, tá legal?  Vamos embora! Vamos subir no caminhão e pé na mula!
         - Mas...
         - Mas nada!
         - Mas nada? Olha aí Toni! Mas antes de qualquer coisa: o cagão é você. Ouviu bem, Toni? E agora, menina, me diz uma coisa: por que os caras deixaram a gente e se mandaram apressados? Pelo menos isso tem explicação, né?
        - Foi à sirene da polícia!
        - Que sirene?
        - Vocês não ouviram a sirene da polícia?
        - Eu não! E você Toni?
        - Eu também não! Quim, eu desconfio que estamos ficando surdos!
        - É! Pode ser! Surdinho! Surdinho! 
        - Vocês não ouviram, porque estavam com muito medo. O medo deixa as pessoas cegas, surdas e mudas.
       - Mas eu não estou nem cego, nem surdo e nem mudo. Falei de brincadeira que estava surdo. Só de brincadeira. Quim chega mais perto: você não acha que na distância que a gente estava dos caras, a gente não ia ouvir a sirene?
      - Eu acho. Muito estranho! Muito estranho!
        Enquanto os dois falavam quase sussurrando a menina deixava escapar um sorriso. Depois esticou o olhar por todo aquele matagal queimado pela seca, talvez procurando por algum verde. Mas o horizonte só mostrava desolação. Virou às costas e se encaminhou para o caminhão. Quando ia saindo, Quim, percebendo o seu afastamento, fala:
     - Menina. Menina Angélica. Sabe de uma coisa? Eu jurava de pés juntos, que você estava com aqueles pilantras. Na verdade, desde o inicio, achei sempre isso. Agora... Mas se você não estava com eles, como é que não fizeram nada com você? Explica isso?
       - Ah! Eles estavam tão preocupados com o caixão, que nem prestaram atenção em mim! Mas... O melhor agora é a gente ir embora! O que tem de barro pela frente, não está no gibi!
       - Aí Toni! Continua sem explicar nada direito! E ainda, fala uma gíria pra lá de antiga!  Menina! Menina!
       - Deixa de papo! Vamos embora! Vamos?
         Os dois acabam, entre resmungos e protestos, acompanhando a menina. Quando os dois entram, Angélica já está sentada no seu lugar de sempre. Toni pega a direção e comenta com o irmão:
       - Aí Quim! Ela é rápida! Menina ligeirinha! Você viu quando ela subiu?
       - Eu não, mano!
       - Vocês é que são muito molengos!            
       - Molengo, eu? Eu não sou! Toni! E você é?
       - Você sabe que não! Nós somos uma dupla que não dorme no ponto! É ou não é?
       - Claro mano!
       - Vamos deixar de papo furado? Vamos pra rodovia? Na primeira estrada de chão, à esquerda, a gente entra! Aí, estamos quase na minha casa!
      - Daqui a pouco? Daqui a pouco, mesmo? Não pode dizer a distância, não?
  - Claro! Está bem pertinho! Uns cinco quilômetros, só!
 - Assim fica mais fácil, né Toni? Ela é muito engraçada, você não acha? Menina, fala pra gente: entrando nessa tal estrada, você vai ficar aonde?
 - Vou ficar pertinho de onde vocês vão! Quando chegar, eu aviso!
        Toni liga a carreta, mas não sai do lugar. A menina olha para ele e demonstra impaciência. Mas antes que ela falasse alguma coisa, ele vai tentando justificar o fato de não ter colocado o veiculo em movimento, dizendo:
      - Já sei que vai reclamar. Mas tem um probleminha. Não podemos sair assim, sem mais nem menos. Voltamos pra estrada e de repente damos de cara com aquela dupla infernal! O que é que a gente faz? Acho melhor não arriscar. Vamos por essa estrada de chão, mesmo. Lá embaixo, a gente sai. Isso é mais seguro.
      - Precisa não! Eles já estão bem longe, com o seu tesouro! Não precisam se borrar de novo, não!
        A menina fala, vira para o lado e dá um sorriso. Toni dá um muxoxo e rebate a gozação:
      - Se borrar, uma ova! Aí, Quim! Tá chamando a gente de cagões! Pode isso?
     - Aí menina! Você está rindo de quê? Toni, ela tá sacaneando a gente!
     - Deixa! Acho que ela esqueceu que os bandidos estão com o corpo do meu amigo! Eu dei a minha palavra, que ia entregar o corpo aos familiares! E agora?  
        Longe dali, os bandidos conversam.
      - Tonhão, você não acha melhor a gente parar e abrir o caixão? Não deve ter mais perigo, não! Já conseguimos despistar a polícia, cara! Tá na hora da gente ver o nosso tesouro! Estou doido pra abrir logo esse caixão!
     - É. De repente você tem razão. Já estamos andando há bastante tempo e nem sinal de polícia, nenhuma. Tá legal. Vamos sair da estrada. Naquela estradinha ali, de chão batido, a gente entra. Parece um lugar bem deserto. E não deve ter ninguém pra bisbilhotar. Ah. E tem mais: aproveitamos e deixamos o corpo por aqui mesmo. Os urubus cuidam dele.
                  Continua semana que vem... 

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