Toni, sem saber como, num
repente, pega no volante e vira para a esquerda. Quim grita com ele:
- O que é isso, Toni? Ficou maluco?
Ei...
Mas não conseguiu nem terminar o que
pretendia falar, pois num piscar de olhos o caminhão foi tirando tinta da
carreta, que estava tombada na pista. Os dois, entre assustados e surpresos,
gritam:
- Meu Deus! Meu Deus, essa foi por um
triz!
Toni, tremendo mais do que vara
verde e com os olhos esbugalhados, fala para o irmão:
- Nossa mãe! Meu Jesus! O que foi isso,
Quim?
- Toni! Toni! O que você fez foi
maluquice! Mas se você não tivesse feito, acho que agora a gente estaria frito!
Mortinho da silva!
- Mas mano, eu nem sei direito o que
eu fiz. Nem sei se fui eu mesmo. Juro por Deus!
- Mas... Masfoi muito bom, mesmo! Ah!
Ah! Ah! Olha só: estamos vivinhos!
O caminhão já tinha passado
completamente pela carreta. Quim volta com ele para o lado direito da pista,
anda mais alguns metros e vai parando lentamente, no acostamento. O riso que
aparentemente era de alegria, na verdade era de puro nervosismo. Dai para o
choro, foi um pulo. O irmão apenas olhava para ele, sem nada falar. Estava
também engasgado. A emoção foi muita. Até a menina esperou que ele se
acalmasse, antes de comentar alguma coisa. Quando percebeu que a calma já
estava próxima, disse:
- Bom motorista, hein! Mas se tivesse
me escutado, não passariam por esse susto!
Quim não falou nada, mas olhou para
a menina e fuzilou-a com um olhar de poucos amigos. Entretanto ela deu um
sorriso leve e continuou dizendo:
- Não disse que ia ajudar vocês nessa
viagem? Está aí, mais uma vez eu tirei vocês de uma enrascada! Eu falei e
repito: podem confiar em mim.
Viu como conheço essa estrada? Viajei muito com meu pai!
Conheço tudo por aqui! Sei onde está o perigo!
- É! Viu Toni? Ela sabe tudo! Tem olho
de raiosx! Como é que você viu que tinha uma carreta tombada, depois de uma
curva?
- Intuição. Só isso. Intuição apenas.
- É Quim. Esquisito, né? Intuição? Eu
nunca vi intuição assim, não! Vai lá menina, explica isso aí pra gente! Vamos
lá! Pode começar a explicar! Isso está parecendo ilusionismo! Você é chegada à
mágica?
- É isso aí, Toni! Vai explicando
menina! Ou melhor: vai se explicando!
- Não tem nada, não! Explicar o quê?
Vocês estão impressionados à toa! Vamos é embora! É o melhor que a gente faz!
Já perdemos muito tempo aqui parados! Pé na tábua, Quim!
- Toni, já que ela não quer se
explicar, vamos continuar parados.
- Pra quê?
- Preciso ir ao banheiro! Depois de
tantas emoções e de muitos mistérios, o bicho começou a pegar! As tripas já
estão dando nó!
- Mas que banheiro? Só tem esse matagal
aí pelo acostamento! Vai logo senão você vai sujar tudo por aqui! Não vai dar
tempo, até a gente encontrar algum posto aí pela frente, não! Nessa estrada
deserta, só mesmo indo no mato! Vai logo!
Quim desce correndo e se embrenha
pelo mato. A vegetação seca e alta acabou por escondê-lo completamente. Nem precisou ir muito longe, o seu banheiro
improvisado estava ali mesmo, a poucos metros do acostamento.
O tempo para quem está de fora
parece longo, mas para quem está numa situação de aperto, desse jeito, o tempo
não anda. E Toni já estava achando que o irmão demorava muito. Impaciente,
gritou:
- Quim! Quim! Você está demorando
muito! Vê se acaba logo! Não podemos perder esse tempo todo, não!
- Ué! Estou com muita dor de barriga!
Parece que as tripas estão dando nó, mesmo! Sai por cima e por baixo! A coisa
tá preta!
A menina acaba rindo e faz com que
Toni brinque com o irmão.
- Diz que ele borrou a calça.
- Sabe de uma coisa, Quim?
- Não! O que é?
- Essa demora é porque você borrou a
calça!
- Que borrei a calça coisa nenhuma!
Fica de sacanagem aí não! O negócio é sério! Quando eu penso que já acabou, as
cólicas voltam! A coisa tá preta, Toni! Não tá fácil, não!
- Pô Quim, você está ai há mais de
meia hora! Anda logo, mano!
- Eu quero! Eu quero! Mas tá difícil!
Aguenta mais um pouco!
Nisso a menina dá uma leve
cotovelada em Toni e, quando ele olha, ela fala:
- Avisa a ele que temos que ir embora.
Os problemas estão chegando. Temos que andar rápido. Eu não posso fazer tudo
sozinha, não! Tenho que ter ajuda dos dois! Senão a gente não vai conseguir
chegar a lugar nenhum!
-
Quim, vem logo!
- Calma! Calma! Já estou chegando!
Nossa mãe! Como suei frio! Nunca tive uma dor de barriga assim, tão braba! E
vomitei também! Era por cima e por baixo! Foi àquela comida de carregação,
daquela espelunca! Êta comidinha ruim! Mas agora estou melhorando! Vamos andar!
Vamos andar!
Toni olha para o irmão, vê o estado
lastimável dele e fala:
- Xi! Quim! Você está mais amarelo do
que aquela tangerina que eu comprei! Você não está em condições de dirigir,
não! Deixa comigo! Nossa! A sua cara não tá nada, nada boa! Também quer traçar
tudo que aparece na frente! Gororoba ruim pra danar! Vamos andando. Vou tirar a
diferença.
- Tá bom, mano! Tá bom! Pisa fundo!
Vamos nessa! Mas deixa ver se consigo um jeitinho pra acomodar o... Pra sentar
melhor. Não tá fácil, não. Ufa! Pode ir. Pode ir.
- Ok, Quim. Juro que
não zombarei da sua desgraça. Mas que o negócio aí deve tá brabo, isso
deve! E aí menina, menina, tá caladinha.
O que foi que houve?
- Desculpe informa-los: os caras já
estão bem pertinho. Perdemos muito tempo. Quim, essa sua caganeira veio na hora
errada.
- Agora a culpa é minha? Essas coisas
a gente não sabe quando vai acontecer! É assim: pega a gente de surpresa!
- É isso mesmo,
menina.Piriri é fogo. Não avisa nunca.Foi só um pequeno atraso. Nós já
despistamos os caras. Fica tranquila. A gente tira a diferença.
- Despistamos? É melhor andar mais!
Tem que correr muito mesmo, se quiser escapar deles!
- Deixa comigo! Eu sou o terror das
estradas! Vou tirar o caminhão do chão!
- Aí menina, Toni é o maior roda presa
que eu conheço! Tirar o carro do chão?
- Se segura aí! Você vai ver só Quim!
Vou apertar o acelerador, menina!
- Acho que não vai adiantar muito. Eles
estão bem perto.
- Já estou pisando fundo! Também andar
mais do que isso, é muito arriscado! Acho que estamos andando bem! Não vejo
ninguém seguindo a gente, menina! Ih! Não via! Quim tem um carro lá atrás! Será
que são eles? Nossa mãe! Vou encostar o acelerador no fundo!
- Toni, puxa o máximo que o caminhão
aguentar! Acelera! Acelera mais! Vamos fugir daqui! Esses bandidos devem estar
armados até os dentes!Estão vindo com tudo pra cima da gente! E se
atirarem? Estou muito novo pra morrer!
Continua semana que vem...
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