terça-feira, 21 de março de 2017

A história que deu origem a história - “Um anjo na boleia”

A HISTÓRIA QUE DEU ORIGEM A HISTÓRIA, 
 “UM ANJO NA BOLEIA”

                                                                                                        José Timotheo

       Esta história é uma obra de ficção, mas a sua base é real. Entretanto só tenho certeza da ficção, pois a realidade pode ter sido inventada. Eu sei que é uma maluquice, mas vou explicar.
      Eu estava numa fila de banco, numa agência minúscula - nessa época ainda não tinha internet - para pagar uma montoeira de contas. Eram filas quilométricas, que davam voltas no quarteirão. Imagina um banco, depois de uma greve, que talvez tenha durado trinta e cinco dias. Imagina. Imaginou? Terrível, não?  Só não consegui focar no ano que passei por esse sufoco. Mas por sorte, foi ali, numa dessas filas, que escutei uma história que foi a inspiração para a criação deste texto: - “UM ANJO NA BOLEIA”.
      Além de longa a fila, ela não andava. Devia ter umas vinte pessoas na minha frente.  Só se via gente com as mãos cheias de contas para pagar. Atrás de mim havia duas pessoas conversando. Pareciam velhos conhecidos. Um começou a contar que tinha sido convidado por um amigo, para acompanhá-lo com um veículo da funerária, para fazer o traslado de um corpo. A pessoa tinha ido passear no Ceará, para visitar alguns irmãos, e acabou morrendo por lá. Mas a família do Rio de Janeiro queria que ela fosse sepultada aqui. E lá foi ele com o amigo num rabecão, buscar o defunto. Viagem longa e desgastante. Chegaram à cidade, cujo nome eu não lembro,  e foram ao IML.  Procuraram o corpo e lá não estava. Disseram que não tinha dado entrada ali ninguém com aquele nome. Depois informaram que o corpo deveria estar em algum hospital da cidade. Como havia poucos, não foi difícil encontrar o local em que houve o óbito. Só que já não estava mais lá. Um dos irmãos do falecido removeu-o para uma capela do cemitério da cidade. Então foram até o campo santo e encontraram-no repousando numa capela, à espera do sepultamento. Estava sozinho. Ninguém velava por ele. Um coveiro disse que há dois dias não aparecia uma viva alma. Disse também que um carro de uma funerária, segundo ele, desconhecida, deixou o defunto ali e sumiu. Quatro rapazes, que pareciam halterofilistas, carregaram o caixão e depositaram-no em cima da mesa.  Acabaram sendo os únicos visitantes para o finado. O amigo, motorista, tinha um retrato do defunto, só que como o caixão estava lacrado, ficou impossibilitado de fazer a identificação. Mas tinham que confirmar se era mesmo a pessoa que teriam de levar para o Estado do Rio. Então perguntaram ao coveiro, mas ele disse que não tinha visto o corpo. E nem sabia de quem se tratava. Porém viu quando colocaram um papel no quadro da parede, com o nome do dito cujo. Leram e confirmaram. Pelo menos, pelo nome escrito no papel, batia com o que estava na documentação.  Antes de sair, o coveiro comentou que nunca tinha visto um defunto que não fedia, depois de mais de quarenta e oito horas de ter batido as botas. Os dois esperaram o coveiro sair e foram até o caixão e cheiraram. Constataram que realmente não tinha mau cheiro.  Ficaram com vontade de arrancar o lacre que envolvia o caixão, mas desistiram porque seria uma violação.

              O motorista pediu para o amigo ficar olhando pelo defunto, enquanto ele ia procurar o tal irmão e com ele dar entrada na papelada para poder remover o corpo para o Rio de Janeiro. Só que o amigo voltou no dia seguinte e sozinho. E ele quase se borrou de medo ao ficar ali do lado do defunto, com sede e fome, até o dia raiar. Nunca pensou na vida que poderia dormir do lado de uma pessoa morta, mas dormiu.  Foi o medo que sucumbiu ao sono. Mas, águas passadas, o importante é que tinha conseguido liberar o corpo para o traslado. E esse tal irmão abandonou o defunto e nem sequer apareceu para dar o seu último adeus. 
                Os dois tentaram tirar o caixão, mas o peso era descomunal. Não moveram um centímetro sequer. Foi um esforço em vão. O motorista então saiu à procura do coveiro. Não demorou muito e lá voltou ele com seis pessoas, além do coveiro. Com muito esforço conseguiram colocar o caixão em cima de um carrinho. Depois o levaram até ao rabecão. Até aí, tudo bem. Mas mal saíram com o veículo, os amortecedores não resistiram ao peso. E a suspensão também ficou comprometida. Acabou o carro ficando impossibilitado de se mover. A carroceria arriou e ficou em cima dos pneus. Com a ajuda de um dos ajudantes, o motorista foi até a uma oficina mecânica, que ficava nas imediações do cemitério. O mecânico examinou o veículo e disse que o carro tinha que ser rebocado e levado para a oficina.  E assim foi feito. Só que lá chegando tinham que tirar o caixão do carro. Aí foi outra pedreira. A oficina não tinha gente suficiente disponível, aí tiveram que sair procurando quem pudesse ajudar. Conseguiram. Depois de analisado o estrago no carro o mecânico comunicou o custo e o tempo. O preço não foi o problema. Mas o tempo foi complicado: uma semana ou mais. O amigo disse que não podia ficar ali todos esses dias. Tentaram convencer o mecânico, mas ele justificou a demora por falta de peças. As peças vinham da capital. Ali não iam ser encontradas. - O que fazer? – perguntou o motorista do carro fúnebre para o mecânico. O mecânico sugeriu que comunicasse a seguradora o ocorrido e levasse o carro para a capital ou para o Rio de Janeiro. E assim foi feito. O reboque chegou e guinchou o carro. Só que não ia poder colocar o caixão dentro do veículo. Então o motorista do reboque sugeriu que arranjassem um caminhão. Deu um telefonema para uma transportadora e, por coincidência, tinha uma carreta com carga para o Rio de Janeiro. Duas horas depois apareceu o transporte. Os dois ficaram aliviados. Principalmente o motorista do carro fúnebre, que não ia precisar dirigir. Era muito chão até o Rio. Ia chegar um bagaço. Acabou até sorrindo de alívio. Mas o problema ainda não estava solucionado: tinha que colocar o caixão dentro do caminhão. Com certeza ia ser uma empreitada pra lá de complicada. A altura da carreta não ajudava em nada. O mecânico da oficina, então, teve uma ideia. Mas pra botá-la em pratica ia precisar do carro reboque. Todo mundo achou a ideia boa. Só ia depender do motorista do reboque aceitá-la. Por sorte, não colocou empecilho nenhum, concordando em usar o guincho para erguer a urna mortuária. E assim foi feito. Só que o caixão, quando estava quase dentro da carroceria, despencou e se espatifou no chão. Ficaram todos surpresos, com o que ficou espalhado pelo chão da oficina.  
        Vamos deixar a conclusão dessa história, para a história de “Um Anjo na Boleia”.
                                      ...Semana que vem começa...
  

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