terça-feira, 29 de setembro de 2015

UM NÁUFRAGO EM ALGUM LUGAR DA BAÍA - Parte 1

Vamos juntos começar mais uma aventura...


UM NÁUFRAGO EM ALGUM LUGAR DA BAÍA

                                                     - JoséTimotheo -


          Eu fui um náufrago, mas não um náufrago qualquer.  Não sou parecido com nenhum desses que a história já contou. Não fiquei trinta anos desaparecido. Nem meses. Nem dias.  Na verdade até hoje, não sei direito se realmente sumi. A minha memória ficou com um tremendo buraco. Foi um dia? Dois? Quantos? É um mistério para mim e meus amigos. Até hoje ninguém tem certeza de nada. Cada um tem uma versão diferente. Falam de uma ventania. Isso até que me lembro. E é uma unanimidade. Parece que fui jogado no mar. Uns dizem que sim, enquanto outros discordam.  Acho que me encontraram, no dia seguinte, no cais. Uns falam que não foi assim. Que fui encontrado numa ilhota, algumas horas depois de ter caído na água, e que tinha sido resgatado por um casal de pescadores. Mas o comandante garante que não sai do barco. Realmente ninguém sabe explicar o que aconteceu. É um mistério. Mas vou contar o que acho que aconteceu. Ou não aconteceu?
         A primavera corria a toda, quase alcançando o verão. Uns amigos resolveram fazer uma pescaria. Alugaram uma traineira, mas em cima da hora um desistiu. Sobrou uma vaga. Convidaram-me e lá fui eu. Sei que fui como tapa buraco, mas aceitei sem o menor constrangimento. O importante é que fui lembrado. Eles sabiam que nunca fui pescador. Sou daqueles que joga a linha na água e reza para que algum peixe belisque a isca. Se não pegar nada, tá bom também. Algumas vezes consegui até fisgar algum, mas a maioria foi saco plástico. Pelo menos estou ajudando o meio ambiente, limpando a Baia de Guanabara. Se conseguisse limpar a cabeça de algumas pessoas, seria melhor. Mas um saco a menos, é sempre bom.
          Encontrei o grupo num clube náutico, no Bairro de Jurujuba. Éramos todos amigos de longa data. Enquanto alguns arrumavam a embarcação, peguei um jornal do comandante e desfolhei algumas páginas até encontrar as informações necessárias para aquele dia, na coluna sobre o tempo. Mas antes que começasse a ler alguma coisa, alguém gritou da outra extremidade do barco:
- Não precisa ler! Hoje o dia vai ser excelente! Só depois das cinco (17 horas) é que poderá ventar um pouco! Está preocupado com chuva? Pode ficar tranquilo que temos noventa por cento de chance, de não acontecer! Tá bom pra você? Pra mim está ótimo! Ah! Ah! Ah!
        Não dei ouvido para o comentário e continuei procurando as informações que precisava. E não tirei os olhos do jornal até encontrar o que eu queria. Estava lá: - Pode ventar um pouco. E tem uma chance mínima de chover, mas pode acontecer. Mas só a partir das dezessete hora. – Não sei por que isso me preocupou, mesmo sabendo que tínhamos até às cinco da tarde para ficarmos despreocupados. E era de simples solução: voltar antes das cinco. E isso ficou combinado. Mas mesmo assim estava desconfortável. Alguma coisa estava me deixando intranquilo. Lembrei-me até de algumas pescarias que participei e saímos antes das cinco da tarde. Preocupar-me então por quê? Mas assim mesmo li e reli várias vezes o que estava escrito sobre o tempo naquele dia e do dia seguinte. Queria saber principalmente de onde vinha o vento. Estava escrito norte. Se fosse sudoeste, descia na hora. Mesmo dizendo que vinha depois das cinco, não acreditaria. O sudoeste me assusta. Se viesse antes? O vento vai se ligar em horário?
          Todo mundo sentiu a minha apreensão. Alguém me perguntou o porquê da minha preocupação.
          -Tá com medo de quê? Relaxa! A pescaria vai ser ótima!
          Mesmo sem muita convicção, respondi que estava tudo bem. Mas sei que não convenci a ninguém e muito menos a mim.

     O barco saiu se arrastando, no seu toc, toc, toc característico. Era um bom barco. Não andava rápido, mas sempre chegava ao seu destino e voltava com segurança. O nosso pesqueiro preferido ficava nas ilhas Cagarras, fora da Baía de Guanabara. E até lá chegar, levávamos mais de uma hora. Isso quando não parávamos no caminho, arriscando alguma pescaria incerta. De repente conseguindo se dá bem por ali, não precisaríamos perder tanto tempo. Nesse dia o comandante avisou que iríamos arriscar próximo ao “Pão de Açúcar”. Foi informado que tinha chegado um cardume de peixe vermelho, por ali. – Quem sabe não precisamos sair da Baía! – disse ele. Aceleramos os preparativos. Rapidamente os molinetes já estavam arrumados. O camarão e a sardinha congelados já estavam espalhados em cima de uma tábua, só esperando para serem fisgados nos anzóis. Avistamos um congestionamento de barcos. Alguém gritou ansioso. – É ali! É ali! – Com muito custo encontramos um espaço para encostarmos o barco, próximo de uma laje: uma pedra chata e comprida. Os barqueiros tinham que ter muita habilidade para não bater com o fundo do barco. A maior parte da pedra ficava submersa. Acima da linha d’água, devia ficar a vista, com a maré baixa, aproximadamente um metro de altura. E era o que nos apresentava nesse momento, com a maré começando a encher. Fiquei emocionado só em ver a fartura de pescado. Enquanto colocávamos as iscas nos anzóis, observei que os pescadores quando recolhiam a linha, era raro não vir de três a quatro peixes fisgados. Todosos barcos, sem exceção, já estavam abarrotados de peixes. Jogamos os nossos anzóis n’água. Nenhuma beliscada nos primeiros cinco minutos. Os outros continuavam a retirar peixes do mar. Na primeira meia hora, nada. Aos quarenta minuto alguém gritou que tinha fisgado alguma coisa. E começou a puxar a linha. Estávamos todos atentos. O esforço era grande. – Será que é um peixão? – falou alguém quase sussurrando. Acho que estava com medo de assustar o peixe. Esperamos. Finalmente saiu da água: um bagre, que não tinha mais de dez centímetros. As caras de decepção se abraçaram mudas. Voltamos a prestar a atenção nas nossas linhas. O silêncio tomou conta do nosso barco. Enquanto a alegria girava nas outras embarcações, a tristeza misturada com a decepção embalava a nossa pescaria. Ficamos por ali aproximadamente duas horas. Além de pegarmos apenas o único bagre, perdemos alguns anzóis que ficaram presos nas pedras. Esqueci de informar corretamente que pescamos alguma coisa além do bagre. E que soltamos ele. Recolhemos sacolas de plásticos, algumas garrafas pet, uma caixa de papelão... Isso mesmo, papelão! Que papelão...

                                               Continua semana que vem...

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