Ao apagar das luzes os
noivos caminharam para os pontos determinados. Caminhavam praticamente pelo
extinto. Iam escorregando pelo meio do povo. Batia em um.
Chocava-se com outro. Mas não podiam emitir nenhum
som. Era todo mundo mudo. Uma pisada aqui, outra ali, e o infeliz contemplado
com uma pisada, tinha que agüentar firme.
Todos a postos, a
cortina se abriu. Imediatamente as luzes do galpão se acenderam. A expectativa
estava no ar. Centenas e mais centenas de olhos grudavam no palco. Ninguém se
lembrava de olhar em volta para ver quem não estava mais ali. De repente uma
voz cortou o ar. Era o Sr. Zeca da Padaria, o outro membro da comissão.
- Sras., Srs.,
meninos, meninas... Vocês vão conhecer agora os noivos da nossa festa. Em
seguida vamos começar o nosso tradicional e único casamento da roça. O mais
original que existe. E com certeza vai ser um sucesso, como foram todos os
outros. Primeiramente vou anunciar o nome, ainda o fictício, da noiva e pedir
para que ela retire a capa e o capuz que a está cobrindo. Em seguida ela
anunciará o seu verdadeiro nome. Tudo explicado e lá foi ele: Abelhinha
solitária!
A menina subiu ao
palco. Retirou a capa que cobria todo o
seu corpo e em seguida o capuz, que escondia quase que totalmente o seu rosto.
Por baixo ela já estava vestida com a roupa de noiva. E bastante maquiada, que
não dava quase para ser reconhecida. Finalmente anunciou o seu nome.
- O meu nome é Maria.
A Abelhinha Solitária, inscrição nº322.
Quem já conhecia a
menina, aplaudia com bastante entusiasmo. Os outros apenas por educação. Isso
devido à frustração de não terem sidos contemplados. Mas mesmo assim foi uma
bela saudação.
Em seguida foi
anunciado o noivo.
- Dono da Esperança.
Lentamente um rapaz
foi subindo a escada que dava para se chegar ao palco. Pisava timidamente. Um
calafrio tomou conta do seu corpo. Teve vontade de voltar atrás e sair dali. A
noiva tinha subido quase que correndo. Mas ele vacilava. Se arrastava. Os pés
pareciam que pesavam toneladas.
Entretanto alguma coisa empurrava-o.
Algo dizia dentro dele para não desistir. Finalmente conseguiu pisar em
cima do palco. Ficou algum tempo em silêncio. Mas acabou falando. Se bem que quase balbuciando.
- Meu nome é Raimundo.
- O Sr. podia falar
mais alto? - pediu o Sr. Zeca. Ele foi e repetiu com mais vontade. – Meu nome e
Raimundo Donato! O Dono da Esperança. Nº12. - João foi o primeiro a reconhecer
o amigo. Gritou e aplaudiu ao mesmo tempo. Os irmãos seguiram-no com o mesmo
entusiasmo. O restante da platéia ficou em silêncio. Ninguém
reconhecia o moço. Foi preciso o Sr. Zeca pedir uma salva de palmas para o
noivo. Foi um aplauso caloroso, mas mecânico. Entretanto Mundinho nem percebeu
se aplaudiam somente com a mão ou se também com o coração. Naquela altura não
fazia muita diferença.
Começaram a armar o
casamento. Mundinho tomou o seu lugar. Mas parado feito estátua e com a cabeça
enterrada no chão. A noiva que havia descido subiu com o pai de brincadeira.
Lentamente foi se aproximando do noivo. O padre já estava a postos. Os
padrinhos também. O delegado marcava a sua presença, mas meio escondidinho,
esperava a sua hora de entrar em
cena. E assim todo o elenco já estava pronto. A noiva
continuou a sua caminhada em direção a Mundinho. Este finalmente, depois de um
toque do padre, levantou a cabeça. Quando os seus olhos se cruzaram com os da
noiva, o seu coração quase saiu pela boca. Da parte da noiva foi a mesma
emoção. Como imã um se chegou ao outro. Mundinho finalmente conseguiu balbuciar
alguma coisa - Das Graças! Meu amor! - E o mesmo aconteceu com a menina: -
Mundinho é você mesmo? Meu bom Deus, eu não acredito! Amor da minha vida! É
você?
Sem ninguém entender
o que estava acontecendo, presenciaram um abraço longo e um beijo que parecia
que não ia terminar nunca. A paixão explodia. Alguns já estavam até achando que
aquela cena fazia parte do texto. Nem os amigos de Mundinho e nem de Das Graças
sabiam o que estava se passando. Nunca houve em tempo algum um casamento da
roça com tanta veracidade. Foi preciso que os organizadores interrompessem o
colóquio amoroso. Depois das explicações ao pé do ouvido, foi dada continuidade
a festa. O casamento foi um sucesso. Dizem que foi o mais bonito de todos os
tempos. E os dois foram presenteados com os potros. Saíram do palco sem se
desgrudarem. A mãe de Das Graças já estava esperando pela filha. Ao confirmar
quem era o rapaz, com lágrimas nos olhos, se abraçou aos dois. Foi um chororô
só. Nisso chegou João e os irmãos, sem entender ainda o que estava acontecendo.
Quando foi lhe contada à história da vida dos dois, se emocionou também,
juntamente com os irmãos. Tentaram esconder as lágrimas, mas a emoção foi mais
forte. Ai a choradeira uniu a todos num único abraço. Quem estava de fora nada
entendeu. Mas não precisava. O importante era o reencontro daquelas duas almas.
Alguns anos de separação que eles arrastaram pareceram uma eternidade. A alegria tomou conta de todo o grupo. Só
precisavam mesmo era comemorar. Até o pau de sebo, comentado por João, ele nem
ousou subir. Mais nada interessava a ele. Só mesmo ficar com Das Graças. – Essa
era a graça da sua vida. - Riu quando pensou nesse trocadilho que pensara. A
sua cabeça fervilhava de planos. E o plano principal era casar com a sua amada.
Um casamento já havia feito, mesmo sendo de brincadeira para o público, mas pra
ele sentiu como se tivesse sido verdadeiro. Aproveitou o ambiente que estava
propício e pediu a mão de Das Graças para a sua mãe, Das Dores. Foi aceito. Ali
mesmo ficaram noivos. Mesmo sem alianças, no meio dos seus amigos e dos amigos
dela, o noivado foi verdadeiro e de fato.
Depois desse dia, não se
separaram mais. Meses depois, sem Mundinho comunicar ao pai, se casou com Das
Graças. Deixaria para comunicar ao chegar à fazenda. E a sogra iria com eles.
Já estava formado e era só assumir o trabalho na fazenda.
Voltou à casa de João
para pegar os potros, a sogra e se despedir dos amigos. O pai de João
convidou-o, caso o pai não aceitasse o seu casamento, a trabalhar na fazenda
dele. Um lugar estaria reservado para ele. E não seria só de empregado não! Com
certeza seria também como um filho. Convite apoiado por todos, já que eles
consideravam-no membro da família. A emoção foi muita. Num abraço gigantesco
envolvendo toda a família, as lágrimas lavaram o chão e a alma daquele grupo
irmanado na terra e no céu.
Mundinho, depois das
despedidas, pegou estrada rumo a sua casa, sem certeza se lá seria o seu
lar.
Fim
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