A
viagem de volta transcorreu num silêncio total. Os quatros pescadores não
paravam de olhar aquela quantidade imensa de peixes e continuavam sem acreditar
no que aconteceu. Chegaram e atracaram a embarcação. Tinha alguns pescadores
conversando, mas não perceberam a chegada do barco. Viraram as costas e foram
embora para as suas casas. João colocou a mão no ombro de Marins e agradeceu
pelo que ele tinha feito em seu favor. Marins tocou a mão de João e sorriu
dizendo que não tinha feito nada. Que ele sim é que tinha que agradecer. O
mestre acompanhou João pisar no cais, mas quando virou para falar com os amigos
e voltou, João já tinha sumido. Foi para o cais e tentou achar o garoto, mas
João já não podia mais ser visto. Pedro já tinha encoberto João completamente.
Marins ficou parado olhando sem entender nada. Resolveu voltar para o barco.
Mas quando pisou no convés ficou surpreso, ao ver que não tinha mais peixe
nenhum. Gritou para um dos amigos:
-
Tinho! Cadê os peixes que nós pegamos?
-
Que peixe? Nós hoje não conseguimos nem pro café!
-
Eu pensei que... O que foi que eu pensei? Acho que foi essa pescaria merda de
hoje que está me deixando meio confuso. Foi uma droga, né Dede?
-
João, João, o seu café vai esfriar.
-
Oi tia, acho que cochilei.
João
olhou em volta e observou que a cantina estava vazia. Consultou o relógio e viu
que tinha perdido as aulas. Pegou o café, mas não bebeu. Colocou-o novamente em
cima da mesa. Coçou a cabeça algumas vezes. Não estava entendendo o que estava
acontecendo. Estava com gosto de café na boca, mas a xícara estava
completamente cheia. Pensou com seus botões:
-
Tem alguma coisa estranha acontecendo. Ainda estou com gosto de café na boca.
Parece que acabei de beber nesse minuto, mas a xícara está cheia. Será que pedi
outra? Não pode ser. A tia Élia disse que o café estava esfriando. Mas ele está
bem quente. Posso ter bebido na sala do professor.
Nisso,
o professor Vander entra na cantina e se aproxima de João, como sempre fazia:
ficava em pé, em frente de João e esperava o tempo que fosse, até que ele
falasse alguma coisa. Dessa vez João não demorou a falar.
-
Oi professor, tudo bem?
-
Tudo bem. E com você?
-
Mais ou menos. Professor, eu não tomei uma xícara de café com o senhor e seus
amigos?
-
Café? Amigos? Não estou entendendo. Como você não apareceu na minha sala, eu
vim aqui ver o que tinha acontecido.
-Eu
não fui? O senhor queria conversar comigo sobre o meu estudo?
-
Então, é sobre isso que eu vou aproveitar para falar. Eu analisei o seu trabalho
e cheguei à conclusão de que ele está incompleto.
-
O senhor acabou de falar que estava me esperando na sua sala... Então eu estive
lá antes?
-
Não é bem assim. Vá até a minha sala que eu explico. João, o seu estudo é o que
já existe. Vá lá. Estou te esperando.
O
professor saiu e João ficou olhando-o intrigado se retirar sem muita pressa,
até sumir, ao passar pelas caixas de refrigerantes. Nesse pequeno percurso,
João cruzou com os olhos de Pedro, que estava atrás do balcão. João ia falar
alguma coisa, mas a voz de Pedro ecoou dentro da sua cabeça:
-
O que você criou, não vai cair nas mãos do mal. Guarde a sua criação para um
futuro onde a energia atômica será usada somente para fins pacíficos.
Quando
João acabou de escutar o que Pedro dizia, olhou para o amigo, que piscou um
olho para ele. João fechou os olhos e respirou fundo. Quando abriu novamente,
Pedro já não estava mais lá. Rapidamente foi até o balcão e perguntou à dona da
cantina pelo amigo. Mas ela respondeu que não tinha visto ninguém ali, a não
ser o professor Vander.
O
livro vermelho ainda estava sobre a mesa. João olhou-o por alguns segundos até
pegá-lo. Ficou com ele fechado em suas mãos até que resolveu abri-lo. E abriu
na primeira página. De cara o nome do autor saltou aos seus olhos. Em letras
negras estava escrito: Karl Marx. Aquilo causou-lhe um grande mal estar.
Respirou fundo. Depois soltou o ar bem devagar. Repetiu isso algumas
vezes. Levantou-se e colocou o livro no
canto da mesa. Se arrependeu imediatamente e pegou-o de volta. Abriu novamente,
mas na página seguinte. Lá estava escrito:-“ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS.”
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