Nisso já tinha parado vários
funcionários no hall de entrada do hospital. O médico observou um movimento
atrás de si e percebeu que as pessoas faziam comentários entre dentes, olhando
na sua direção. Virou a cabeça e mirou um por um, fazendo com que as pessoas se
dispersassem. Depois retornou para a posição que estava anteriormente, deu um
sorriso amarelo para a recepcionista e indagou:
- O que é isso? Que está acontecendo
alguma coisa, está! Por que essas pessoas estavam de cochicho atrás de mim?
Preciso de uma explicação!
Angélica não respondeu, mas saiu
detrás do balcão e pediu para que o médico a acompanhasse. Levou-o até o
consultório do Dr. Justus, médico responsável pelo setor de pediatria. Esse,
quando o viu, fez um ar de espanto, mas comentou sorrindo:
- Menino! Aonde você arranjou essa
roupa alinhada? Está parecendo outra pessoa! Assombração! Você está elegante!
O Dr. Anton olhou o Dr. Justus e falou
com azedume:
- O que é que está havendo aqui? Que
brincadeira é essa? Estão querendo fazer troça com a minha cara? Agora é o
senhor que me chama de assombração! É muita brincadeira para o meu primeiro dia!
É um trote?
A princípio um silêncio constrangedor
se instalou no recinto. Só os olhos tentavam dizer alguma coisa. O Dr. Justus
parecia que estava entalado. A recepcionista tentava disfarçar, mas acabou
saindo de fininho, deixando os dois sozinhos. Nisso a enfermeira Elga que ia
chegando, quase se choca com ela. E ao entrar no consultório, levou o maior
susto. Ficou parada olhando
para o Dr. Anton, que não se conteve e falou bruscamente:
- A senhora também? Acha que sou outra
pessoa, não é? Eu mereço uma explicação! O que é isso? Meu primeiro dia... e
começando mal!
O Dr. Justus custou a sair do estado
que se encontrava. Pigarreou e passou a mão na testa, deu um sorriso sem graça
para a enfermeira, mas finalmente convidou o colega para se sentar. Ofereceu a
sua cadeira, com o intuito de, de alguma forma, acalmar o Dr. Anton, que
recusou, mas sentou-se numa outra cadeira, que normalmente é destinada aos
pacientes ou visitantes. Já a enfermeira Elga, ainda espantada com a semelhança
do Dr. Anton com Assombração, acomodou-se numa cadeira do outro lado da sala,
sem, no entanto, desgrudar os olhos dos médicos. O mal estar estava instalado.
O Dr. Justus, que ainda continuava em pé, depois de alguns minutos sem saber o
que fazer, optou por sentar-se, mas sentou-se de lado na cadeira. Estava
realmente se sentindo muito embaraçado. Era uma situação que nunca tinha
passado. Algo constrangedor. Cruzou as pernas e fingiu amarrar o cadarço do
sapato. Em seguida girou na cadeira e ficou de frente para o Dr. Anton. Olhou para o colega, que estava de
cabeça baixa e repentinamente esticou o braço e se apresentou:
- Meu nome é Justus. Sou médico
oncologista.
Dr. Anton levantou a cabeça e
encontrou o braço esticado do colega. Em sinal de educação, mesmo estando
chateado, apertou-lhe a mão com vigor, e também se apresentou:
- Prazer. Anton. Sou também
oncologista. Trabalhei na
capital, no setor de pediatria.
Antes de falar alguma coisa a mais, o
Dr. Justus engoliu em seco e falou timidamente:
- Então... É... Então é o senhor que
veio substituir o Dr. Carlos Antunes?
Dessa vez ele respondeu prontamente:
- Sim. Mas com a recepção que tive,
acho que não vou ser aceito. Tenho quase certeza. Um conceituado hospital, que
é esse, não contrataria uma alma de outro mundo, não é?
A enfermeira Elga não conseguiu
conter-se e soltou uma estridente gargalhada, que deve ter sido ouvida por todo
o hospital. O Dr. Justus tentou ao máximo prender o riso, já estava ficando
corado, mas acabou entrando no clima da enfermeira e desandou a rir. Dr. Anton,
a princípio fez uma cara de desagrado, entretanto, vendo que os dois não
paravam de rir, foi aos poucos se descontraindo e acabou aderindo ao riso
frouxo, mas procurou ser mais comedido. Aquilo serviu para que os três pudessem
finalmente conversar amigavelmente.
O ambiente foi aos poucos ficando mais
leve. A enfermeira Elga levantou-se, já conseguindo controlar a explosão de riso,
respirou fundo, mas não conseguiu afastar completamente o sorriso, que teimava
em ficar nos seus carnudos lábios. Ajeitou o uniforme e gentilmente ofereceu
café para os médicos. Eles aceitaram e ela foi pegá-lo na cafeteira elétrica,
num espaço improvisado em cozinha, escondido atrás de um biombo. Depois de
servidos, é que finalmente a conversa pode rolar descontraída. Com a
curiosidade estampada nas faces, o Dr. Anton quis logo saber o porquê de se
dirigirem a ele naqueles termos. Dr. Justus se desculpou e procurou esclarecer
o mal entendido.
Continua semana (ano) que vem...rs.rs.rs.
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