quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Numa Eleição, em um País Democrata - Num País do Faz de Conta - Parte 1

NUMA ELEIÇÃO, EM UM PAÍS DEMOCRATA
 NUM PAÍS DO FAZ DE CONTA -

- José Timotheo -


Senhor Juiz, eu sou culpado. Pode me condenar.
Posso relatar o que aconteceu? Então eu vou contar o que houve. Eu me pré-julgo. Posso confessar que passou de mero esquecimento. E eu sei que o esquecimento merece pena máxima. Mas de antemão posso adiantar que não suportarei a punição. Prefiro a pena capital. Mas, continuando... As eleições se aproximavam. A preocupação batia à minha porta. E consciente da minha obrigação, como bom cidadão e cumpridor dos meus deveres, iniciei uma procura minuciosa de um candidato que atendesse aos anseios da população. Coloquei adesivos nos postes e até anunciei nas redes sociais pedindo ajuda para a escolha de um candidato ficha limpa para o referendo de 2016. Prometi até um valor em dinheiro, no “procura-se”.
Na véspera das eleições, levantei cedo. Até aquele momento ainda não tinha chegado nenhuma indicação para um voto que não agredisse a minha consciência. Senhor Juiz, vou confessar aqui para o Senhor e para todos os jurados, que esse problema de coluna que me faz quase beijar o chão vem do acúmulo de escolhas equivocadas de candidatos nesses anos todos que me debruço nas urnas. São muitos votos errados em cima dos ombros. Vou segredar para o Senhor: penso e  repenso e ainda não consegui encontrar um candidato certo. Minto,  encontrei apenas um. Mas esse não foi eleito. E não vou dizer o nome dele, tendo em vista que ele pode morrer de vergonha por ter sido candidato alguma vez na vida. Continuando... Mas tinha esperança de encontrar alguém que fosse digno do meu voto. O dia correu e eu não consegui nenhuma indicação. Resolvi pesquisar nome por nome. Quase queimei o meu computador. Encontrei de tudo nas fichas dos candidatos, menos a indicação de moral ilibada. Sinceramente não vi ninguém com honestidade suficiente para exercer um cargo público. Quase chorei. Pior que eu sentia que de cada fotografia recebia um riso de deboche. Parecia que via uma sacola no ombro de cada um. Imaginava-as, depois de quatro anos, bem gordas. E depois os via conversando nos bastidores sobre o povo.
-“ Ingênuos! Estou gastando milhões, mais do que eu vou receber em quatro anos de mandato, em troca de nada. Ingênuos! Quero essa grana toda, triplicada!”  Vou confessar que tive vontade de invadir a minha imaginação e falar umas verdades para eles. Mas desisti e resolvi fazer uma investigação mais profunda. Podia ter pulado algum candidato. Quem sabe alguém podia encontrá-lo para mim? Já pela manhã, no dia da eleição, levantei-me com a cabeça explodindo de dor. Tomei alguns comprimidos para aliviar a enxaqueca. Quando consegui controlar a dor, já tinha passado do horário de votação. Eu tinha esquecido! Sou um cidadão que sempre cumpre com os seus deveres cívicos. Somos um país democrático e, por conseguinte, somos obrigados a votar. Então eu não me perdoo por ter esquecido a minha obrigação. E por sermos um país de democracia plena, serei punido por não cumprir com os meus deveres. Logo estou aqui esperando pela minha condenação. Calei-me. O silêncio tomou conta do tribunal. O juiz impávido olhava para o teto. Não sei o que ele procurava lá. Acabei olhando também. Tinha um espelho no teto onde ele se via. Arrumava a toga, mexia nos cabelos... Estava elegante. Desisti de olhar para o alto, só me via com uma roupa de condenado. Voltei o meu olhar para o júri. Cada jurado entregava algum papel dobrado para um senhor. Pensei rapidamente: é a minha condenação. Depois lembrei-me que não tive ninguém para me defender. E para acusação, tinha sido eu mesmo. Eu não sei se naquele momento eu queria ser salvo, mesmo se pudesse. Minha preocupação era a pena máxima.
O juiz já estava com a sentença na mão. Bateu o martelo com força pedindo silêncio. Mas o único barulho era o martelo e a sentença. Abriu o envelope. Leu e sorriu. Os jurados aplaudiram. Com um gesto, parecendo que regia uma orquestra, ficaram todos em silêncio. Levantou-se e proferiu a minha pena. –“O senhor, por um ato de rebeldia, contra a nação brasileira, será punido com a pena máxima. Mas – depois de um Oh!!!, numa breve interrupção, voltou a falar. – como somos justos, daremos duas alternativas de cumprimento da pena. Primeira: o condenado fara serviço comunitário, numa comunidade da sua escolha, tentando trazer para o bom caminho a escória da sociedade que vive única e exclusivamente do tráfico de drogas. A outra, segunda: o condenado prestará serviço comunitário no senado federal. Cuidará única e exclusivamente da limpeza de todo o senado. Sendo essa escolha a mais tranquila, pois sendo lá um antro, digo o lugar das pessoas mais honestas desse país.”
            ...Continua semana que vem...

Nenhum comentário:

Postar um comentário