domingo, 13 de março de 2011

À PROCURA DA NÊGA - a esttória

A adolescência tentava se afastar de mim. Tentava. E tentava. Mas não dava adeus. Naquela altura da minha vida, para os meus pais,  a adolescência parecia mais um encosto. Nem exorcismo conseguia resolver. Eu fazia jogo duro. Eu resistia e não deixava ela ir embora. Eu era poeta, compositor, estudante de astronomia, repórter...Sonhador! Um grande sonhador! A paixão andava de braços dados comigo. Em cada esquina, uma simples troca de olhar e eu já me sentia apaixonado. Em qualquer rua da vida, um encontrão, lá estava eu morrendo de amores. Um desses encontrões, foi com uma mulata, como se dizia antigamente, de fechar o comércio. Nós nos chocamos e ela levou meu coração. Eu a perdi de vista. Fiquei completamente sem rumo. No dia seguinte, lá estava eu de prontidão no mesmo horário. Foi uma semana de ansiedade e decepção. A esperança já começava a se cansar. O sonho se abraçava ao sono. Ele fraquejava. Comecei a pensar numa nova paixão. Tinha que arranjar outro foco. Mulher é que não faltava. E como eu nunca fui preconceituoso, era só escolher. Podia vir até desbotada que eu ia cair dentro. Mas o destino quis que essa mulher fosse mulata. E ela voltou a aparecer no oitavo dia. E lá veio ela se equilibrando em cima de umas cadeiras maravilhosas. A espera pareceu uma eternidade, mas valeu a pena. O papo foi ligeiro e objetivo. E lá estava eu abraçado àquela criatura escultural. E beijei muito! Com poucos dias de namoro, já estava sentado na poltrona na casa dela. Conquistei a família. Garanti uma cadeira cativa. O lugar onde ela morava, era uma comunidade de gente simples, do outro lado da baia. Um morro na zona norte do Rio. Hoje para se entrar lá, ainda é complicado. Naquela época era só cumprimentar o pessoal. Dar um bom dia de coração. Uma boa tarde com muito respeito. Já estava com o passaporte garantido. Era gente simples e boa. E sem medo.
A minha paixão aumentava sem freio. A proporção não era a mesma em relação a ela. Eu sentia que esfriava, mas não queria acreditar. O nosso namoro...O nosso namoro? Depois de quatro meses, já ia para o quinto mês, eu acho que só eu namorava. Um dia alguém deixou um bilhete endereçado para mim. Era um bilhete curto, mas afiado do que navalha, que começava assim: "Cuidado com a sua cabocla! Fique de olho nela! Não deixe ela solta, não! Tá assim de gavião em cima dela! Abra o olho! Cuidado com a testa! Se bobear, o boi vai rugir!". Fiquei preocupado, mas como confiava na nêga, procurei não me encucar. Ela não ia me botar nenhuma galhada, não! Mas...Ai o bicho começou a pegar. No início era um bilhete por semana. Depois começou a ser dois, três...Ai veio o pior: ela começou a deixar uns bilhetinhos também. Tipo: " Vou trabalhar até mais tarde hoje" - "Estou na casa da minha prima, mas não demoro" - Só que esse "não demoro", levava uns dois dias. Mas eu não queria colocar minhoca na minha cabeça. Só que os nossos encontros foram  rareando. Entretanto a minha paixão cada vez aumentava mais. Em contra partida o meu ciúme foi crescendo mais do que a paixão. Eu já não tinha mais sossego. Eu era um poço de desconfiança. Os nossos encontros foram reduzidos a dois por mês. Nesses dois, era só briga. Eu chegava, discutia e ia embora.
Do asfalto até a casa da nêga, passei a carregar um fardo. Ouvia um mugido aqui, outro ali. A suspeita foi crescendo. Mas antes que tivesse certeza, tirei o time de campo. Fui me apaixonar em outras bandas. A dúvida pesa menos que a certeza. Mas o bom disso tudo, é que, muito tempo depois, acabou em samba.

2 comentários:

  1. Quero ouvir esse samba!! A estória é o máximo, agora falta ouvir! Uma super idéia. Amei.

    ResponderExcluir
  2. Também já procurei uma...e me perdi!!

    ResponderExcluir