terça-feira, 21 de junho de 2022

A Minha Casa Não é Essa - Parte 06

 


Continua...

            Téo mirou o garoto, ficou pensativo, mas não respondeu à sua pergunta. Depois coçou a sua barba que estava por fazer, e do seu olhar brotou interrogações. Estava desconfiando dele, mas por outro lado sentia muita simpatia também. Não sabia de onde vinha esse gostar de uma pessoa que via pela primeira vez. A sensação era de que já o conhecesse há muito tempo. De repente a sua cara se iluminou e disse de supetão:

           - Ei menino. Estou aqui pensando numa coisa: como é que você tem acesso a esses bandidos e como estrangeiro nunca foi molestado por eles? Pelo o que eu sei, eles matam qualquer um, principalmente estrangeiros, que não apoiam a sua causa. Matam até gente do seu próprio povo, que são contrários a eles! Você consegue responder?

           - Esses bandidos não defendem causa nenhuma. Explicar, explicar eu não sei. Acho que é por eu não atrapalhar ninguém.  E eu falo a língua deles. Pensam que sou gente deles. No hospital eu aprendi a falar algumas línguas mais faladas no Afeganistão. Não sei como aprendi. Acordei entendendo e falando umas línguas estranhas. Mas parecia que eu sempre soubera. Depois de meses me deram alta, só que não sabia para onde ir. Aí encontrei alguns meninos, todos sem pai nem mãe, que viviam se virando para sobreviver. Aonde tinha escombros, lá estavam eles. E eu, como já cheguei falando a língua deles – até hoje eles pensam que sou igual a eles – fui aceito de imediato.

          - E como é que você chegou às armas?

          - Nós começamos a achar nas casas que tinham sido derrubadas por bombardeios. Aí fomos guardando. Tivemos que arranjar um esconderijo. Em um desses escombros encontramos um buraco. Um dos colegas mais corajosos entrou... – fez uma pequena pausa - e sumiu! Ninguém conseguia vê-lo. Começamos a ficar preocupados. Não podíamos gritar para não chamar atenção. A aflição era muita. E ninguém encontrava coragem para ir atrás dele. Já tinha passado quase meia hora, quando ele voltou. E voltou sorridente.

           - O que foi que ele achou? –  o grandalhão John, cheio de curiosidade, questionou-o.  

          O menino, antes de responder, sorriu. Tinha percebido o quanto era curioso o soldado John. Olhou-o bem na cara e disse, deixando em algumas frases um pouquinho de deboche:

          - Um lugar cheio de comida! Era tudo enlatado, mas era comida! Comida americana! Comida de vocês! Nos fartamos! E muita água – baixando o tom - em garrafas também. Encontramos o paraíso. Mas no meio daquilo tudo, ainda descobrimos dinheiro - dólar - e algumas armas. Essas armas, tudo revolveres, estavam numa caixa fechada. Ainda não tinha sido aberta. Então, depois de prepararmos a entrada direito – escondemos o máximo que pudemos – começamos a levar as armas que achávamos para lá. Mas aí surgiu um problema: o que é que a gente ia fazer com todas aquelas armas? A quantidade era muita. E o local já estava ficando apertado. Aí um dos garotos deu a ideia de vendermos. Ele já até sabia para quem.

          - E quem é essa pessoa? – Téo perguntou com firmeza.

           - É um parente dele ou quase parente, não sei direito. No início ele comprava tudo o que a gente achava. De armas que não funcionariam nunca, até uma infinidade de bugigangas. Passado um tempo, começou a selecionar todo o nosso achado. As armas muito danificadas, ele não quis mais, só ficando com as que, dizia, podia recuperar.  Alguém comentou que tínhamos armas novas, sem uso. Na hora ele disse que comprava tudo. Esfregou as mãos e abriu um sorriso de orelha a orelha. Dava até para ver a garganta. Sem rodeios perguntou logo onde estava tudo guardado:

           - Armas novas! Aonde é que vocês guardam? Isso me interessa muito! Posso ir lá! Compro tudo e pago muito bem! Dinheiro vivo!

          Quase que esse colega, que é parente ou só conhecido, entrega a nossa mina. Mas eu fui rápido e não deixei que desse o nosso esconderijo. Senti naquele momento que aquele senhor, até que não é muito velho, não era boa pessoa. Ele é perigoso, isso sim! Então, na hora, sugeri que o melhor era marcar em um lugar neutro, a partir daquele dia, para fazermos negócio. Percebi que ficou contrariado. Mas, não sei se foi por causa da minha firmeza, acabou aceitando, mesmo a contragosto. Sentiu que não tinha jeito mesmo. E assim começamos a negociar em campo neutro. E vendemos algumas dessas armas para ele. Ainda temos algumas guardadas. Só vamos vender em caso de emergência.

          - Por que? – perguntou curioso o sargento.

          - Diminuiu muito os nossos achados.  Eu vim para cá, porque um amigo escutou que tinha tido um atentado aqui na região. E que ainda os corpos e armas estavam espalhados pela rua. 

.......Continua semana que vem!

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