terça-feira, 7 de junho de 2022

A Minha Casa Não é Essa - Parte 04

 


Continuando...

          NA GUERRA

 

           O dia amanheceu cheio de poeira avermelhada. Um menino corria pela rua e olhava os vários corpos que jaziam estendidos, sem nenhum resto de vida, vitimados por um atentado, talvez de madrugada.

          - Stop! – gritou um soldado americano, enquanto apontava uma metralhadora na direção do menino, que parou instantaneamente.

          Olhos arregalados mirava o soldado que estava a apenas poucos metros à sua frente. O grandalhão, mesmo com o olhar apavorado do menino, preparou a sua arma para atirar, mas foi travado pelo colega, que pressentiu o que ia acontecer. Falou alguma coisa e colocou a mão em cima da arma, pressionando-a para baixo. Disse mais alguma coisa, próximo a sua orelha, e caminhou em direção ao menino, que ainda estava estatelado no meio de alguns cadáveres. Parou na sua frente e falou em inglês, perguntando o que ele estava fazendo ali no meio daqueles soldados mortos.

          O menino entendeu o que ele perguntara, não sentiu qualquer ameaça na sua voz, esboçando um sorriso, falou:

          - Puxa!

          O soldado sorriu também e falou em português:

          - Ué! Você falou em português! Mas você entendeu o que eu perguntei?

          - Sim.

           - Você é Afegão, não é?

           - Não. Sou brasileiro.

           - Eu também. Meio brasileiro. – Téo falou batendo levemente no peito.

           - Verdade? Puxa vida! Eu pensei que hoje fosse morrer!

           - Foi milagre. Nem sei como consegui que o amigo não atirasse em você. Não sei por que fiz isso, mas parece que estava adivinhando que você era da terra da minha mãe. Sou brasileiro, mas tenho a cidadania americana também.

          - Acho que nasci de novo.

          - O que é que você está fazendo aqui e pegando essas armas?

          O menino abaixou a cabeça e parecia que pensava em alguma coisa. Talvez uma desculpa. Depois levantou-a, parecendo que já tinha a resposta na ponta da língua. Mas a voz não saiu e os seus olhos encheram-se de lágrimas. O soldado parecia comovido com a cena, já o outro, que estivera prestes a atirar, gritou, em inglês, para ele, ainda com a arma apontado para o menino. Téo então levantou o braço direito pedindo para que ele esperasse. Depois de algum tempo virou-se e falou para o amigo:

          - Calma John. Calma. Descobri que o menino é brasileiro.

          - Verdade Téo? Mas porque ele está pegando essas armas?

          - Isso eu vou saber agora.

           - Resolve isso logo, porque temos que sair daqui. Vamos pegar essas armas e ir em frente.

          - Tudo bem, John.

          Téo, já que o menino continuava calado, preso a uma forte emoção, foi até ele e pegou-o pelo braço e retirou-o do meio dos soldados mortos. Depois fez novamente a pergunta, aí o menino, parecendo mais equilibrado, respondeu:

          - Estou recolhendo as armas que eu posso pegar para vendê-las.

          - Ué! Vendê-las?

             Nisso o grandalhão do John, que tinha se mantido afastado, gritou:

          - Téo, o que o menino está falando? Não estou entendo nada!

          - Você não está entendendo, porque ele está falando em português.

          - Ele não fala em inglês, não?

          - Vem até aqui e pergunta a ele!

           John levantou de novo o cano da metralhadora na direção do menino e se juntou a Téo, seguido de outros dois soldados. Sem deixar de apontar a arma, mirou-o de cima a baixo, falou entre dentes:

            - Aí menino, não gostei de você. Te acho estranho. Por um acaso fala a minha língua?

            O garoto encarou-o com altivez e respondeu:

            - Claro que falo. Não só o inglês e o português, como também três línguas faladas aqui: farsi, pashtu e dari.

           - Téo, o garoto é letrado! – falou com deboche - Quantos anos você tem?

           - Não sei bem. Depois do atentado, muita coisa fugiu da minha cabeça.

           - Que atentado? – Téo perguntou curioso. 

 

........Continua Semana que vem!

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