terça-feira, 13 de setembro de 2016

Pequena História - A Garça

 
      
 A GARÇA    

    - José Timotheo - 

          Ao longe, na solidão da tarde, veste branca, uma garça se mantinha ereta sobre uma poça d´água. Desafiava, embora com humildade, a inteligência humana? Não sei! Não  sei! Nem sei, mesmo, se ela era a última da sua espécie... Só sei que, naquela "última gota d'água", ela me parecia a última esperança. O engraçado, sem ter graça, é que dos seus olhos, do seu jeito, não havia nem um pingo de ódio, sequer! Muito pelo contrário, porém tristes, apelavam para o homem preservar, não as garças, mas a própria raça humana.
          Percorri a minha saudade por toda aquela poça. Vi que muitas garças desfilavam pela alegria! Perguntei, então, à ave solitária, porque não chorava.
          - Não haverá lágrima no mundo que alivie a minha tristeza! - respondeu ela.
           Voltei à minha saudade e vi bandos e mais bandos de infinitas garças. Perguntei porque não odiava a minha gente. Ela me respondeu, reticenciosa:
          - Odiar? Eu não seria esperança! Eu não estaria lutando...
          Fiquei algum tempo mudo. Olhava para aquela ave pernalta a se equilibrar em uma só perna. Não sei se era devido ao tamanho da poça... mas de quando em vez, trocava de perna. Nossos olhares se tocavam, até mesmo quando não estávamos nos olhando. Uma sentimento de culpa lambeu-me a alma. Rasquei o mutismo. Arrisquei mais uma pergunta. Quis saber por que continuava ali parada, desafiando o homem.
         - Não desafio o homem. Só estou aqui para lembrar ao homem das suas misérias. - respondeu-me com um fio de pesar.
         Um choro mudo explodiu em meu peito. Uma lágrima marcada de culpa escapou dos meus olhos e foi tentar se afogar na poça d'água. Foi aí que eu vi que não era água. A última gota, era uma poça de lágrimas. 
Obs.: Texto publicado no livro "Escritores do  Brasil", organizado por Aparício Fernandes, em 1983.

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