terça-feira, 9 de dezembro de 2014

História Verídica - Conde Suldoroski - Parte 1


CONDE SULDOROSKI

- José Timotheo -


          O sol já estava cansado de esquentar aquela manhã. O termômetro devia estar chegando à casa dos 39° e ainda os ponteiros de um relógio de parede, ensebado de gordura, suavam para se aproximar das 13 horas. Naquela altura a piscina não conseguia abrigar nem mais uma alma viva. Eu e meus amigos – éramos três – já estávamos de molho, desde as 11 horas, tentando aliviar o corpo e, de uma forma ou de outra, ficarmos perto de algumas meninas. Mas tem sempre alguém para tentar acabar com a paz. E esse alguém apareceu. Era um cara, com pinta de dono da festa, acompanhado de duas meninas. Começou a reclamar, olhando pra gente, e solicitou, com a maior cara de pau, que alguém saísse para ele e as suas acompanhantes entrassem. Parecia que o cidadão sabia que éramos convidados. O pedido tinha endereço certo: nós. Só faltou pular dentro d’água e jogar a gente pra fora. Mas que culpa nós tínhamos da piscina ser pequena? E diziam que era olímpica...Mas antes que pudéssemos passar algum tipo de vergonha, saímos voluntariamente. Era a segunda vez que íamos ao clube. E queríamos voltar quantas vezes mais conseguíssemos convites. Não podíamos queimar o filme. O mais sensato era engolir o sapo. O cara ficou satisfeito. E ainda sorriu pra gente. Mas nós o xingamos silenciosamente e fomos para a nossa mesa,  torcendo para não ser confiscada. Fomos contrariados. Mas não tínhamos outra saída. Éramos convidados, quase penetras. Sentamos e ficamos na nossa. Não comentamos do ocorrido. O importante era que outras mesas próximas estavam cheias de meninas. Isso era o que realmente importava. Ficamos de butuca em cima. Mas parecíamos três caras invisíveis. Três adolescentes duros: essa era a verdade! Entretanto, não podíamos perder a pose. Trocando em miúdos: tínhamos que pedir alguma coisa. O garçom não tirava o olho de cima de nós. Disfarçadamente, cada um contou o seu parco dinheirinho e chegou-se a conclusão que podíamos esbanjar. Chamamos o garçom – o cara abriu o maior sorriso! -, pedimos um prato de batatas fritas – era o mais barato – e uma cerveja. O cara deve ter ganhado alguma aposta, feita com algum outro garçom. Com a rapidez que ele nos atendeu, só podia ter sido isso, ou as batatas eram sobras. No mínimo o outro disse – se não me engano, eram três – que dali da nossa mesa não sairia nem um copo de água da bica. Mas o importante é que ele foi solícito. O pedido foi feito e meia hora depois já estava na nossa mesa. Antes de comer fizemos um trato: uma batatinha pra cada um a cada meia hora. A cerveja também tinha que ser racionada. Tínhamos que beber bem devagarzinho. O negócio era impressionar. Até pose nós fizemos, mas as meninas nem arriscaram uma olhadela pra gente. Adolescente da minha época sofria!
             O bate papo corria solto. Um dos amigos era um exímio contador de piadas. Ficamos ali rindo um bocado. Pelo menos desopilamos o fígado. E a batata e a cerveja continuavam controladas. A batata já estava murcha e a cerveja, um purgante. Mas não perdíamos a pose. Em hipótese alguma podíamos fazer cara feia. Tínhamos que saborear entre sorrisos. De repente um dos amigos, o contador de piadas, parou.  
             -“Não acredito! Não acredito!” – disse ele com uma entonação tal, que fez a gente esticar o nosso olhar na direção que ele esticava o dele.   
             -“Olha só! Olha só! Aquele ali é o maior 171 que conheço!” – falou ele, apontando discretamente para um cara que chegava acompanhado de outro cara de terno. Vinha cheio de pose. Vestia alguma coisa toda colorida, com um brasão em cima do coração, que lembrava muito um agasalho para se proteger de um frio rigoroso, tipo de Moscou. Muito espalhafatoso o cara. Mesmo chegando daquele jeito, ninguém deu pela sua presença. Ia me esquecendo de um par de óculos preto que cobria quase todo o seu rosto. O meu amigo custou a se recuperar do susto e voltar a falar da figura. Esperou o cara arranjar uma mesa para aportar. De repente veio um funcionário do clube e levou-o até uma bem localizada, que já estava com uma placa indicando que estava reservada. E, estrategicamente, no meio da mulherada. O cara parou próximo à mesa, enquanto o seu acompanhante, secretário ou coisa parecida, puxou a cadeira e esperou que ele se acertasse e empurrou para debaixo da sua bunda.
             O meu amigo continuava só observando o cara. A minha curiosidade estava quase berrando. Eu queria saber quem era a figura. Peguei o amigo pelo braço e perguntei seco.
             -“E aí! Quem é o cara?”
             Sem desgrudar os olhos da figura enigmática, me respondeu quase soletrando cada palavra e entre dentes.
             -“Conde Suldoroski. Assim ele se “auto” batizou. O nome verdadeiro mesmo é Agripino.”
             -“Conde Sul... da onde?”
             -“Suldoroski! – repetiu ele lentamente.                                                
             -“É conde da onde? Não leva a mal não, mas o cara é feio pra daná!”

            -“Ele tem uma lábia danada! O que tem de feio tem de malandro! Não adianta me perguntar de onde ele tirou esse nome, que eu não saberei responder. Eu nem sei se esse nome existe! Agora vamos observar pra ver qual vai ser a dele.”
........................Continua semana que vem....

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