sábado, 13 de abril de 2013

ALGUNS FATOS QUE ANTECEDERAM A ENTREVISTA COM GAL COSTA


Gal Costa ia fazer um show em Niterói. Se não me engano, no Clube Regatas Icaraí. Fui escalado pelo meu amigo jornalista Mário Dias para entrevistá-la. Seria um grande desafio para mim. Ainda era um foca. Imagine eu em frente daquele mostro sagrado da MPB! Recebi uma credencial e lá fui eu, entre emocionado e nervoso. Ou entre nervoso e apavorado.
Cheguei bem antes do início do show. Ela já estava no camarim. Fiquei rondando, mas não consegui contato. Ninguém aparecia. Circulei pelo clube e de vez em quando passava na porta do camarim e nada. Numa dessas circuladas, começou o show. E pensei desconsolado: perdi uma oportunidade e tanto de falar com ela...Me restou ficar pertinho do palco saboreando aquele show maravilhoso. Não sei quanto tempo fiquei ali na turma do gargarejo. Acabou o show e lá fui eu atrás dela, novamente. Cheguei primeiro do que ela na porta do camarim. Pensei que seria fácil. Só tinha eu da imprensa. Ela chegou e, pra minha tristeza, fizeram um corredor para ela passar. Naturalmente fui afastado pelos seguranças do clube. Ela entrou e fiquei a ver navios. Tentei falar com um cara que estava na porta, me identifiquei, mas ele não deu a mínima pro meu crachá. Disse, sem olhar na minha cara, que estaca destacado ali para não deixar ninguém entrar. Fiquei encostado numa parede bem próximo à porta. Nisso apareceu uma menina. Devia ter uns vinte, vinte e um anos. Uma linda menina. Veio ao meu encontro e pediu para acender o seu cigarro no meu. Começamos a trocar idéias. Me perguntou o que eu fazia ali sozinho. Ei contei o meu drama, disse que era repórter, que tinha pouco tempo na profissão e que estava esperando uma oportunidade para entrevistar Gal Costa. Falei que seria a primeira entrevista importante, mas que estava sendo um fracasso. Ela olhou pra mim e disse: “Espera um pouco, que já volto”. Girou nos calcanhares, passou pelo segurança e entrou no camarim. Não demorou muito, voltou com um sorriso nos lábios e um papel nas pontos dos dedos. Me entregou o papel e disse para eu ligar pra ela na terça feira seguinte.
Na tarde da segunda feira, estava na redação do jornal “A TRIBUNA” E “JORNAL DE ICARAÍ”, em Niterói, tentando me entender com uma velha máquina de escrever Olivetti. Mário chegou e foi cobrando a minha matéria. Estava meio envergonhado por ter falhado. Não precisei nem falar. Ele me sacaneou. Falou alguma coisa que não me recordo. E foi para a sua mesa. Preferi não falar que ia continuar tentando fazer a entrevista. No dia seguinte, liguei para a menina e ela disse que tinha agendado a minha entrevista com a Gal Costa. Nem acreditei. Fiquei mudo. Ela pensou que eu tivesse desligado. Depois do terceiro ou quarto alô é que eu consegui falar alguma coisa. Ela me passou o endereço e marcou para a semana seguinte. Meu coração quase saiu pela boca. Era muita emoção.
Na quarta feira cheguei mais cedo na redação. Mário ainda não estava. Comecei a esquematizar as perguntas que iria fazer. Quando ele chegou, eu já estava com quase tudo pronto. Levei até a mesa dele. Ele olhou, sorriu, falou e disse:
-“Conseguiu, em cara! Gostei. Não desistir é sempre um bom caminho. Deixa isso aqui comigo”.
Ele fez as devidas correções. Tirou algumas perguntas. Colocou outras. Deu uma enxugada geral. No dia seguinte me entregou um gravador.
No dia marcado, lá fui eu para o Vidigal, onde morava Gal Costa. Cheguei com duas horas de antecedência. Estava tenso. Já tinha fumado alguns cigarros. Fiquei parado em frente da porta olhando a campainha. Custei a pegar coragem. A menina que tinha marcado a entrevista foi quem abriu a porta. Sorriu e disse:
-“Chegou muito cedo cara! Ela não está, mas na hora marcada ela vai estar aqui”.
Me mandou entrar e aguardar. Me sentei numa poltrona e ali fiquei até ela voltar. Ela voltou com uma senhora. Era a mãe de Gal. Muito simpática e agradável. Olhou pra mim e disse: -“Menino, minha filha vai chegar na hora, você vai ver só! Fica sentadinho ai. Você quer um copo d’água? Fique à vontade.” – Ela sentou na outra poltrona e continuamos a conversar. Algum tempo depois ela saiu, acompanhada da lourinha. Fiquei um tempo sozinho. Depois voltou a menina com a empregada. Começou a arrumar a sala. Pulei de um lado para o outro para não atrapalhar. No final acabei ajudando a empregada a mudar as poltronas de lugar. A mãe de Gal voltou e deu ok na arrumação.
No horário marcado Gal Costa chegou. Tremi dos pés à cabeça. – “É de carne e osso.” – pensei. Automaticamente fiquei de pé. Falou com a mãe e com a amiga. Depois sorriu pra mim e me cumprimentou. Calado estava mudo continuava. Ela vendo a tensão estampada na minha cara, disse sorrindo: - “Vamos à entrevista?” – Tentei falar alguma coisa, mas apenas balancei a cabeça afirmativamente. Apertou a minha mão e apontou uma cadeira, mas não deixou nem por um instante apagar o sorriso. Sentei de um lado e ela do outro. Peguei a minha lista de perguntas, que estava toda amassada, dentro do bolso da minha calça jeans surrada, e coloquei do lado do gravador. Até aquele momento eu não tinha conseguido falar nada. Respirei fundo e tomei coragem. Perguntei a ela se podíamos começar. Ela confirmou. Quando ia iniciar a entrevista, aconteceu um desastre: o gravador, quando fui apertar o rec, escorregou e se espatifou no chão. Voaram pedaços para todos os lados. Fiquei completamente desbundado. Eu não sabia o que fazer. Mas acabei indo atrás dos pedaços. Fiquei de joelhos atrás dos pedaços, dei conta que ainda faltava a fita. Fui achá-la debaixo da poltrona. Parecia que estava pagando alguma promessa. Depois dessa trabalheira toda, não consegui fazer o troço funcionar. As três me olhavam entre assustadas e incrédulas. Mas eu senti que uma ponta de riso estava por trás daquelas expressões. Mas não era pra menos. Voltei à cadeira. Gal engoliu o riso. Acho que foi a gargalhada. Depois pacientemente, sorrindo pra mim, pediu o papel com a lista de perguntas e disse pra eu ficar calmo. Enquanto lia, eu tentava de novo fazer o gravador funcionar. Leu todas as perguntas e excluiu algumas, e eu não consegui fazer a “merda” do aparelho funcionar. Depois me perguntou se eu já estava preparado. Respirei fundo, joguei o que restava do gravador para um canto, e peguei meu bloco de anotações. Ela lia a pergunta e respondia vagarosamente. Fui escrevendo na integra o que ela ditava. No final deu uma olhada no que eu tinha escrito e deu ok. Saí de lá pisando nas nuvens. Quando a porta se fechou às minhas costas, ouvi uma risada. Era o riso que ela tinha engolido para não me deixar mais constrangido ainda. Depois as três riram juntas. E riram muito. Fiquei encostado à porta por algum tempo. Elas não conseguiam nem falar. Acabei rindo também. Fui embora e, até hoje, o sentimento que guardo é o carinho e o respeito dessa grande estrela por um novato, desconhecido, que precisava mostrar serviço pra conseguir o seu espaço...
- José Timotheo -

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