Continuando...
Depois da explosão, o silêncio abocanhou aquele pedaço de país esquecido
por Deus. O silêncio ali era coisa rara. Podia ser manhã ou noite, que algum
tiro, um míssil ou uma granada explodia em algum lugar, parecia que o
barulho atravessava todo o Afeganistão.
O sossego naquele país já tinha sido atingido por algum tiro e agonizava, há
muito tempo, em alguma vala imunda.
Kalled foi o primeiro a levantar a cabeça. A poeira ainda atrapalhava um
pouco a visão, mas pacientemente com o seu binóculo para uso noturno, conseguiu
fazer uma boa varredura naquela área destruída. Mas não encontrou o companheiro
Amim. Como a poeira ainda estava no ar, concluiu que ele continuava escondido
para se proteger. Então achou melhor ficar ali, até que retornasse e com boas
notícias. O tempo passou, a poeira assentou-se e nada de Amim aparecer. Kalled
acenou para os outros dois, que estavam a alguns metros distante, para que
viessem até ele.
- Balal,
você vai por aquele lado. – apontando para o lado direito. – E você, Nazary,
vai pela esquerda. Eu vou em frente, seguindo os passos de Amim. Andem mais ou
menos cinquenta metros, depois fechem para o meio, onde devemos nos encontrar.
Vamos! Vamos!
Kalled
esperou que os companheiros fossem para onde ele tinha indicado. Depois de
perde-los de vista é que começou a sua caminhada. Cuidadoso como era tentava o
máximo não ficar exposto para não ser pego de surpresa.
Silenciosamente os outros dois também procuraram não ficar expostos a um
ataque inimigo. Quase se arrastavam no chão, de tão arriados que estavam. Mas
não estava sendo fácil se moverem por cima da grande quantidade de detritos e de
poeira. Eram combatentes preparados para a adversidade, entretanto se mover por
sobre pedras pontiagudas, lascas que se assemelhavam a navalhas, de tão
afiadas, e o próprio inimigo, que podia estar escondido em qualquer lugar no
meio daqueles escombros, era uma missão arriscadíssima. Só mesmo o ódio para
leva-los a tão imprevisível missão. Botar a própria vida em risco, por pura
vingança, por causa de três ianques, e sem saber se iriam encontra-los, era
demais. E já tinham perdido dois amigos e ainda não sabiam que Amim, morrera
vitimado pela sua própria bomba.
O
chefe caminhava cuidadosamente por cima daqueles escombros, mesmo carregando o
ódio debaixo do braço. Ia até mais cauteloso do que os seus próprios subordinados,
que mesmo não deixando os seus corpos a amostra, pensando que estavam
protegidos de qualquer ataque inimigo, não percebiam que os seus passos
causavam algum tipo de ruído, mesmo que imperceptível para ouvidos comuns, mas não
para ouvidos apurados em guerras. Com isso seriam presas fáceis para os
americanos. Mas a sorte estava com eles,
pois não tinham mais nenhum inimigo ao redor. Só que não sabiam disso
Kalled depois de seguir apenas pela luz do luar tropeçou em algo, mesmo
atento onde pisava. Parou e olhou fixamente para o chão, mas não conseguiu
identificar o que era. Sabia que não era pedra e nem madeira. Era macio. Mesmo
preocupado em ser localizado pelo o inimigo, acendeu a sua lanterna e
direcionou a luz para onde pisava. Recuou ao perceber que era um homem, ou
melhor, pedaços dele. Identificou que era sua gente, pelo resto de vestimenta
que resistira a explosão. Não quis olhar mais detalhadamente, por que estava
claro que aquele corpo era de Amim. Levantou as mãos coladas para o céu e falou
alguma coisa ininteligível e foi adiante. Andou mais alguns metros e encontrou
o buraco, que era a entrada do porão e que estava escancarado. Não quis
iluminá-lo, antes que chegassem os seus comandados. Esperou então até que os dois
ficassem ao seu redor.
Balal foi chegando cauteloso. Parou a poucos
metros de Kalled e ficou mirando-o. O chefe percebeu e fez um sinal para que se
aproximasse. O outro menos precavido, se dirigiu logo para onde deveria estar o
seu líder e o amigo. Encontrou-os lado a lado, em silêncio, olhando para dentro
do buraco. Se postou ao lado de Kalled e mirou também o buraco negro. Como não
estava conseguindo visualizar nem a escada, que supunha existir, olhou para o
chefe e perguntou:
-
Chefe, como vamos entrar nesse buraco? Olha só a escuridão!
-
Fala baixo, ô animal! Você quer que saibam da nossa presença?
-
Mas Kalled, eles já sabem que estamos aqui. Isso não é novidade para eles.
-
Eu sei. É claro que sabem da nossa presença. – falou o chefe entortando a cara –
Se assim não o fosse, quem teria matado os nossos amigos?
-
Mas chefe...
-
Escuta uma coisa... – interrompeu a fala do amigo. E deu uma leve pausa. –
Escuta Nazary. Eu quero que pensem que fomos embora. Vamos nos afastar e
esperar. Ou se você quiser, joga uma granada aí dentro.
-
Então chefe, o que estamos esperando?
-
Você acha mesmo que eu vou deixar alguém fazer isso?
-
Mas...
-
Mas não tem nem mais nem menos. Se eu quisesse, já tinha jogado logo, quando
aqui cheguei. Mas assim não ia ter graça nenhuma. Eu quero é mata-los com as
minhas próprias mãos. Entendeu, Nazary?
-
Agora está tudo claro. Mas tem o garoto que está aí dentro, não é? O que eu
soube é que não podemos mata-lo.
Kalled mirou-o por alguns segundos, deixou escorregar um sorriso maldoso
e respondeu:
-
Nazary, Nazary eu só espalhei isso, para que ninguém se adiantasse a mim. E
além do mais o garoto que deu as informações, não está aí dentro.
-
Não?
-
É claro que não. Os que estão aí dentro, são dois e são só seus amigos, então podem
ser eliminados.
Antes que Nazary falasse mais alguma coisa, ele colocou um dedo em cima
dos lábios e pediu silêncio. Em seguida encostou a sua boca na orelha dele e
disse baixinho:
-
Vamos deixar passar um tempinho e depois falamos em tom alto, que já vamos
embora. Eu aviso quando for o momento.
Depois se chegou para Balal e fez a mesma coisa: falou baixinho no seu
ouvido, a mesma coisa que tinha falado para o outro. Em seguida puxou os dois
pelo braço e se afastou da entrada do porão. Em seguida apontou os pontos que
os dois iriam ficar. Balal foi o primeiro a se encaminhar para o lugar
indicado, ficando assim do lado direito da entrada. Nazary foi para à esquerda
e como o amigo ficou afastado quase dois metros da entrada do porão. E o chefe ficou
no centro.
.......Continua Semana que vem!