Continuando...
Eu ficava sentado na areia encorajando os mergulhadores, mesmo sabendo que eles nem imaginavam que tinha um cara mergulhando, de longe, com eles. Na realidade não era só eu. Outros anônimos se espalhavam pelo calçadão e pela areia também. Éramos garotos um pouco medrosos. E eu fazia parte do grupo dos quase sem coragem. Todavia isso não me fazia um cara covarde. Confesso que o que me afastava do trampolim era minha pouca habilidade no nado, além da visão que tinha dos mergulhadores. Pareciam, era só olhar, um pontinho flutuando no espaço. Isso já dava para tirar da cabeça, qualquer dúvida em relação ao medo que sentia. Quando alguém pulava, eu ficava olhando todo o trajeto até o contato final com a água. Aquele curto espaço de tempo parecia uma eternidade. Eu não conseguia me ver fazendo aquilo de jeito nenhum. Ainda mais quando chegava a informação de que alguém tinha se afogado. Aí nem os pés eu molhava na água.
Perdido em pensamentos saudosistas, fiquei completamente desligado do movimento que me circundava. De repente o celular vibrou. Foi como um choque. Me tremi todo. Confesso que não gosto de telefone, mas ando com ele. Mas que alternativa temos? O som é irritante e o vibrado é enervante. Peguei-o meio contrariado e fui atender ao chamado. Demorei um pouco e desligaram. Suspirei aliviado. Nem quis ver quem tinha ligado. Eu sabia que de casa não era, pois eu sei que enquanto eu não atender, não desligam. Já ia colocá-lo no bolso e chegou uma mensagem. Não foi uma, nem duas, nem três, foram pra lá de dez. Eu não queria olhar, porém a curiosidade chegou na minha frente. Tudo bem, o que fazer? Fui abrindo uma por uma e nada de coisa interessante. Imagina o tempo que perdi abrindo essas mensagens. E depois para apagá-las. Conclui que roubaram o meu sossego e as minhas lembranças. Não tive mais condições nenhuma de tentar ativar a memória novamente. Porém, no meu esforço hercúleo, alguma coisa apareceu: o lugar onde o trampolim se erguia majestoso, agora era um buraco negro faminto, que engolia até a minha saudade. A vontade de afogar o aparelho foi muita. Mas ele não era o culpado. Olhei para ele, desliguei-o e empurrei-o no bolso. Estiquei o olhar até o semáforo e vi que estava a meu favor. Acelerei os passos, atravessei a rua e peguei o caminho de casa.