Enquanto esperavam
pelo sorteio os cinco foram para o galpão onde já estava sendo iniciada
oficialmente a festa, ou o pré - festejo, como eles gostavam de dizer. Este galpão estava localizado num terreno bem
tratado, que ficava por trás da praça, e lá foram eles se juntar a multidão que
já rodeava as barracas de comes e bebes e de jogos. O povo já tomava conta de
todo o espaço. Quem visse Mundinho não ia reconhecê-lo. Há muito tempo ele não
se sentia tão à vontade. Estava tão descontraído que ele mesmo tomou a
iniciativa e comprou cervejas e salgados para os amigos. Só Maria Isabel não
aceitou a cerveja, preferiu tomar um licor de cerejas.
Observando à
distância, dava para sentir que a alegria estava de mãos dadas com a ansiedade.
Mesmo a maioria participando de brincadeiras, a descontração não era muita. Com
certeza o ambiente só iria ficar isento de tensão, depois do sorteio. Assim
mesmo o fantasma da curiosidade não deixaria o galpão. E o horário do sorteio
se aproximava. Algumas pessoas, que pareciam fazer parte da organização do
evento, começavam a se dirigir para o palco. Os olhares quase não se
desgrudavam da direção dessas pessoas. Só se revezavam com o relógio. Eram
momentos finais nervosos. O som já começava a ser testado. Dois membros da
comissão já se colocavam sentados em volta de uma mesa. Um pegou o microfone e
anunciou que precisamente em cinco minutos o sorteio seria realizado. Após o
anúncio dois rapazes trouxeram duas urnas cheias de envelopes. O conteúdo de
cada urna foi derrubado em recipientes separados. Pareciam duas piscinas de
plástico. Uma das mulheres e a outra dos homens.
Um dos membros da
comissão chamou ao palco o Sr. Tonico e Dona Dolores. Eram os dois mais idosos
da cidade. Pessoas de famílias tradicionais e respeitadas. Cada um se postou em
frente a uma piscina de plástico. Dona Dolores foi a primeira a tirar um
envelope. Pegou e entregou ao Sr. Manoel Durão, um dos membros da comissão, que
antes de abrir o envelope, olhou de ponta a ponta do galpão, imprimindo um ar
de suspense.
- O nome da noiva é
Abelhinha Solitária. Número 322. – Isso falando numa vagarosidade tal, que
parecia que dizia letra por letra, deixando o público com os nervos a flor da
pele. E aproveitando para olhar nas caras, principalmente que estivesse mais
próxima, e observando se alguém iria se delatar. Para o pessoal que lotava o galpão parecia
que o Sr. Manoel estava olhando um por um. Ai os olhares se cruzavam, mas ninguém
deixava escapar quem poderia ser a sorteada.
O Sr. Tonico se
abaixou e tirou também um envelope. O Sr. Manoel já estava próximo dele e
pegou-o da sua mão. Abriu-o. Fez o mesmo procedimento anterior, um silêncio
proposital, antes de anunciar o noivo. Ninguém despregava os olhos dele. Rasgou
lentamente um lado e não satisfeito, o outro também. Finalmente retirou o papel
onde estava escrito o candidato a noivo e anunciou o ganhador.
- O nome do noivo é
Dono da Esperança. Número 12.
Como aconteceu com o sorteio na noiva, se
repetiu com o do noivo. Era um silêncio tumular. Um buscava o olhar do outro
para ver ser alguém se delatava. Mas nada. Eram somente olhares nervosos e ao
mesmo tempo curiosos.
O Sr. Manoel avisou
para os sorteados que se apresentassem no dia seguinte, cinco minutos antes do
início do casamento, que seria às dezessete horas, à comissão, com o
comprovante da inscrição. O noivo entraria pela direita do palco e a noiva pela
esquerda. Nisso Mundinho questionou o amigo.
- João, me diz uma
coisa: como vai ser mantido sigilo sobre a identidade dos noivos se cinco
minutos antes eles têm que se apresentar? Você me disse que a gente só vai
saber na hora que começar o casamento, é ou não é?
- E vai ser isso mesmo! Acontece que quando
faltar cinco minutos, a luz do galpão é apagada. Você vai ver o breu que vai
ficar. Somente uma penumbra é mantida nas entradas onde os noivos vão entrar.
Lá dentro, depois de identificados, eles vão ficar cobertos. Apenas a comissão
fica sabendo quem são os sorteados. Depois eles sobem para o palco e quando a
cortina é aberta, já com todo o elenco a postos, é que a luz é acesa. Aí sim é
que vamos conhecer os noivos.
- João, mas quando os
sorteados se dirigirem para o local determinado, as pessoas não podem
identificá-los?
- Tem uma norma que eles
vão anunciar daqui a pouco. É o seguinte: todos terão que se afastar um do
outro e ficarem em
silêncio. A partir do momento que a luz é apagada, ninguém
pode falar mais nada. Os eleitos poderão se movimentar tranquilamente pelo meio
da galera. Você vai ver só: ninguém consegue enxergar um palmo na frente do
nariz!
Continua semana que vem...