Ela esticou o braço com determinação e colocou a mão em cima da rosa, mas
demorou um pouquinho a se decidir em girar a rosa. Acabou fazendo o
procedimento dito pela voz: primeiro para a esquerda e depois girar tudo para a
direita e esperar o barulhinho. E tudo deu certo: a porta começou a se abrir
lentamente. Só que alguma coisa fez com que interrompesse o que tinha feito. Girou
a rosa no sentido contrário, fazendo com que a porta parasse e voltasse até se
fechar. Entretanto, antes que isso acontecesse, ela saiu numa correria só até
sair da gruta. Do lado de fora parou para respirar. Estava ofegante e
visivelmente nervosa. Mais uma vez a voz se fez ouvir:
-
Oh Helô! O que ouve minha filha? Parecia que você estava coberta de coragem! De
repente recuou! Mas está tudo bem. Vamos deixar para outro dia as
investigações. Agora volte para o pomar, pegue umas frutas e vá brincar com
suas amigas. Depois voltamos a conversar. Segredo, Helô, segredo!
Ela saiu rapidamente e foi ao encontro das amigas, que nem perceberam a
sua chegada. Eram as três mais próximas, Sílvia, Bela e Alícia, que brincavam
num balanço improvisado numa goiabeira. Helô, achando que pudessem fazer alguma
pergunta, foi oferecendo algumas frutas que tinha pegado pelo caminho. Em
seguida pediu para se balançar um pouco. Foram ficando por ali até às quinze horas, quando
a irmã Gertrudes veio chamá-las para a aula de canto.
Quase quinze dias haviam-se passado desde a visita de Helô à gruta. Nesse
período não houve qualquer fato relevante. Nem mesmo o padre Arcanjo e o
misterioso senhor, o senador, tinham dado as caras. Quando isso acontecia, a
madre entrava logo em contado com o senador, pois normalmente a despensa
começava a esvaziar. Não era a primeira vez que isso acontecia, mas não era
comum. Normalmente os dois eram pontuais. Coincidência ou não, chegavam sempre
juntos.
Numa manhã ensolarada, o senador e o padre ainda não tinham chegado, um
pouco antes do início das aulas, Helô ouviu novamente a voz. Dessa vez teve a
sensação, além de ouvir bem mais claro, de que alguém havia tocado nela.
Parecia que uma pessoa de carne e osso falava na sua orelha. Nesse momento
estava do lado de duas colegas. Deu um jeito, atrasando o seu passo, e afastou-se
delas. Entrou rapidamente no jardim para que ninguém a visse falar sozinha. Mas
mesmo assim, caso alguém percebesse, ela seguraria qualquer flor e fingiria que
estava falando com ela. E assim fez. Pegou uma rosa e ficou acariciando-a
enquanto a voz não voltava a se comunicar, porém isso não demorou muito. Não
levou nem um minuto sequer para fazer-se ouvir novamente e desta vez bem mais clara.
- Helô, já está passando da hora de você voltar à gruta. E hoje é um bom
dia. Não vai haver aula de canto. Isso porque um bispo virá fazer uma vistoria
no convento. Há muito tempo a igreja não mandava ninguém, mas hoje, com
certeza, vem alguém. E depois que for feita a vistoria nos alojamentos vocês
estarão liberadas. Não deixe de ir logo logo para o pomar. Depois eu volto a me
comunicar com você. Fique com Deus minha menina.
-
Será que eu não vou correr de novo?
-
Não, Helô, hoje você não vai sentir medo. Não esqueça! Mas se isso for
acontecer, eu não deixarei. Tenha fé, minha menina! Tudo vai correr bem!
Helô saiu dali rapidamente para não entrar atrasada na sala de aula. Estava
visivelmente preocupada. Por estar desatenta na aula de religião, acabou sendo
chamada à atenção pela irmã Maria do Socorro, mas conseguiu justificar-se sem
levantar suspeitas e conseguiu, com muito esforço, não dar motivo para outra
repreensão até o final da aula.
....................Continua semana que vem!