Continuando...
Os dois já estavam ali sentados a mais de meia hora, em silêncio. Mohammed não desgrudava os seus olhos da névoa. Estava atento para qualquer alteração no movimento do gás. Mas para sua surpresa ele continuava no mesmo lugar. Não se expandiu nem um milímetro sequer. – Que força era aquela que estava segurando o gás venenoso? – pensou, franzindo a testa. Em seguida lembrou-se do amigo Rachid: - Onde será que se meteu Rachid? – Pensou e levantou-se, quase num pulo, assustando o sargento que, finalmente, acordou do mutismo:
- O que houve Mohammed? Você me assustou!
- Desculpe sargento. Acabei de me lembrar de Rachid. Ele foi fazer um reconhecimento nesse túnel aqui - apontando -, mas não voltou mais.
- Será que fugiu?
- Não. Não acredito que ele tenha feito isso. Aconteceu alguma coisa com ele. Estou preocupado. Será que o gás o pegou?
- Talvez sim, talvez não. Mas acredito mais que tenha fugido. O gás... Para ir por esse túnel, tinha que ter envolvido todos esses outros túneis. E pelo o que estou vendo, ele não passou dali. – Apontava para onde o gás estava parado.
- Mas sargento, o meu amigo não é desse tipo de gente, que foge e deixa o amigo no sufoco, para salvar a sua pele.
- É. Pode ser. Então só tem um jeito.
- Que jeito?
- Vamos à procura dele.
- O senhor vai também?
- Mas é claro. Se ele é seu amigo, então é meu amigo também. Amigo de um amigo, amigo é.
- Verdade, sargento? O senhor é meu amigo?
- Claro! Mohammed, você salvou a minha vida!
- Mas o senhor também salvou a minha! Como já falei para o senhor, e vou repetir: serei grato para o resto da vida. Não estou nem me preocupando mais em ser seu prisioneiro.
- E quem disse que você é meu prisioneiro?
- O senhor... o senhor me prendeu.
- Isso foi antes. Já esqueci o que passou. O que passou, está enterrado. Agora, vamos procurar Rachid. Temos que sair o mais rápido possível daqui. Vamos?
Téo perguntou e já foi se levantando rapidamente, como se nada tivesse acontecido com ele. A sua vitalidade tinha voltado plenamente. Abraçou Mohammed e empurrou-o gentilmente em direção ao túnel que ele tinha apontado, sem, entretanto, soltar o seu ombro.
Mohammed queria acelerar um pouco os passos, mas era contido pelo sargento, que ditava a caminhada em passos curtos. O menino achou estranho, aqueles passos lentos. Ficou preocupado com o fato e questionou:
- Ué sargento. O senhor não está se sentindo bem?
- Estou bem. Está achando estranho por que não estou deixando você caminhar mais rápido?
- É. Tá esquisito.
- Mohammed, temos que ter cautela. Além do gás, de repente entrou por outro local, existe também a possibilidade dos bandidos terem entrado no túnel. Isso aqui deve ser obra deles. Se bem que acho muita sofisticação para ter a assinatura de qualquer país. Esses tubos tão grandes, com aço de primeira... Desculpe, isto não é aço. Não sei que material é esse. (fez uma pausa) Como é que a colocação de tantos tubos não chamou a atenção de ninguém? Isso passa por baixo de várias casas. Me parece que é desconhecido de todo mundo. Será quem fez isso?
- O senhor acha que os Afegãos não são inteligentes suficientes para construir uma rota de fuga – é o que me parece – dessas?
- Eu não acho que eles sejam incompetentes. E menos inteligentes. Acho que não têm tecnologia suficiente para tal construção. Não só eles, mas país nenhum tem.
- Aí o senhor tem razão. Ainda mais que eles se fecharam para quase todo mundo. Até comida falta. Tudo racionado. É... Mas, se tivesse tudo normal, mesmo assim não teriam capacidade para tal obra de engenharia?
- Não se trata disso. Você continua achando que estou desmerecendo o povo afegão. Vou repetir mais uma vez: pelo que vejo aqui, país nenhum tem tecnologia para construir isso. Vamos Mohammed. Não vou segurar mais o seu ombro, não. Nem falar mais sobre isso. Vamos andando devagar.
Realmente o menino se calou e aceitou a sugestão de Téo para andarem vagarosamente. Com cautela foram caminhando até chegarem num outro cruzamento. Era mais um ponto parecido com os dois primeiros. Um local largo com mais três túneis.
Os dois pararam e ficaram sem saber qual o caminho tomar. Téo coçou a cabeça, a indecisão estava clara nos seus gestos, depois de alguns segundos pensativo falou:
- Mohammed. Sei que você já observou aonde chegamos.
O menino balançou cabeça confirmando, preferindo não comentar nada, e esperou que o sargento continuasse a falar.
- É. Parece que estamos numa encruzilhada sem saída. Viu que não tem nenhuma saída, só túneis e mais túneis. Isso aqui está parecendo mais uma prisão subterrânea. Acho que só tem aquela entrada, onde é também uma saída. Só que não encontramos até agora nenhuma cela. Isso é uma tremenda incógnita. E...
- É, sargento. – cortando a fala de Téo - Estamos num mato sem cachorro. O que é que a gente faz agora?
- Você me interrompeu. E não sabe também o que fazer, não é?
- Talvez. Posso dar uma opinião?
- Se for para resolver a questão, é bem-vinda.
- Sargento, sabemos que não podemos ficar parados aqui sem fazer nada. O senhor lá atrás falou para irmos em frente, certo?
- Sim. E o quê que você está pensando?
- Penso que devemos mudar de direção. Agora vamos entrar nesse caminho da direita. Se não der certo, a gente volta e pega o túnel da esquerda. E que se não der certo de novo, vamos em frente.
- E depois?
- Depois? Depois eu não sei. Mas vamos tentar.
- Rachid parecia uma estátua. Com quase todos os movimentos travados, apenas conseguia mexer os olhos, um par de olhos assustados, que varria o que podia visualizar. Com eles tão arregalados, parecia que estavam prestes a saltarem das órbitas. Naquele momento, o que se via neles, eram interrogações e mais interrogações que a sua alma gritava:
- O que é isso, Alá? Que lugar é esse? Alá, me salva!
.....Continua Semana que vem!